Houve um silêncio imperial antes de Robert principiar a sua explicação, mas assim que a iniciou foi de uma ponta á outra, sem paragens, sem eufemismos, apenas dizendo a verdade pura e racional de alguém que hoje, já não tem os sentimentos de que fala. Ao princípio Aurora não entendeu o porquê de Robert começar a sua declaração por falar dos tempos em que ela trabalhava nos campos daquela propriedade, mas assim que ele se foi explicando, contando todos os pormenores da sua antiga estima por ela, tudo lhe ficou claro. Estava agora ciente da notícia que levara o seu marido a colapsar. E que noticia era! Aurora soltava exclamações de surpresa e de pânico sem nunca conseguir construir uma frase, o que deixou Robert prosseguir até ao final sem ser interrompido. Após terminar, Robert fez questão de enaltecer o quanto isso eram histórias do passado e que em nada deviam interferir no presente.
- Aurora...na altura, não lhe posso mentir...tinha para consigo sentimentos e afeições dignas. Mas isso não importa! Já nada disso importa, hoje não teço mais tais aspirações e sou feliz com a felicidade do meu primo. Nem sempre foi assim, nem sempre consegui anular a inveja, mas hoje, hoje sei com toda a certeza que não tenho arrependimento algum em não ter confessado esses sentimentos na altura. Se o tivesse feito, e se o meu primo soubesse de tal coisa, de certeza que não se iria sentir no direito de se aproximar de si. E isso é que não podia ser...acredito firmemente ter feito quase sempre a escolha correta, espero que um dia ele me consiga perdoar e a Aurora também...
Aurora ainda estava em choque petrificada naquela confissão. Tentando se desenlaçar daquele transe, começou a andar de um lado para o outro compulsivamente, como se andar a ajudasse a pensar e raciocinar. Até que parou e encarou Robert de frente, olhando-o diretamente nos olhos.
- Certamente não consegue entender a minha lástima em saber que o que causou a síncope do meu próprio esposo teve como motivo eu mesma!!... Mas á parte disso, acho que devo ser sincera consigo. Julgo que já esta perfeitamente ciente disto, mas devo dizê-lo por respeito, por decência... Robert, os meus sentimentos por si nunca foram do mesmo tom que aqueles que teve para comigo. Em parte alguma lhe podia haver correspondido, pois nada senti ou sinto além de respeito, amizade, admiração. Empregando todo o meu egoísmo, digo-lhe, ainda bem que não se confessou na altura, e que por dois anos nada disse a Elliot. Se isso poderia impedi-lo de um dia se aproximar de mim, por respeito a si, então ainda bem que não o fez.
- Bem o sei Aurora...por muito tempo, principalmente a quando das missões militares, achei que houvera sido cobarde em não me confessar por mandado dos meus pais. Mas depois, depois de tudo acalmar, percebi que até nisso houve um propósito maior, talvez aquilo a que se chama destino seja mesmo verdade. – Robert olhava Aurora buscando nas suas palavras um sentido de perdão e de indulgência.
- Não lhe sei dizer se o é ou não...sei, porém, reconhecer as suas boas intenções na sua mentira, ou omissão. Quando começou o seu discurso e entendi do que se tratava, não minto que fiquei com raiva, revoltada, completamente transtornada, não só por mim, por Elliot principalmente...mas se formos racionais, sei que dentro dos possíveis tomou as escolhas que achou mais corretas...
- Por Deus Aurora! Não sabe o quanto me alegra saber que pelo menos o seu perdão ainda é possível! – Robert estava realmente agradecido por pelo menos ela ser capaz de lhe aquietar a consciência. – Mas Elliot....não sei, não sei se ele alguma vez me perdoará realmente, ainda por cima da maneira como descobriu!
- Pois, falta saber dessa questão, já sei do conteúdo, mas não sei como é que ele o veio a saber. Estou certa de que não foi nenhuma confissão sua no calor do momento...
- Não Aurora... – Robert virou de novo para a secretaria pegando a maldita carta e estendeu-a a Aurora. – Esta carta foi escrita, e enviada para mim, pela minha Mãe, o seu conteúdo, como deve imaginar, vai de encontro a este assunto. Enquanto William e eu estávamos no andar de baixo, Elliot veio até cá cima e acabou provavelmente por se deixar levar pela sua curiosidade em saber coisas da minha mãe, sua tia, já que ela não compareceu á vossa moradia depois do casamento, e obviamente que esse não comparecimento se prende com este assunto. Pobre Mãe, soubera ela o que esta carta iria causar...
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Um campo de Lírios Brancos
Historical FictionO tempo é a era vitoriana, mais precisamente 1857, em Inglaterra. Elliot é um jovem herdeiro de uma família fidalga, recomendado pelos seus bons modos, pelas suas virtudes, pelas suas crenças humanitárias, e sua indulgência. No entanto, padece de...