Feliz aniversário, Jasmim!

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Acordar com vinte três anos foi exatamente como acordar com vinte dois. Comum. Quando o despertador tocou pela manhã, Thor bateu com suas patinhas no meu rosto, exigindo silêncio. Suspirei mal humorada, querendo dormir um pouco mais. A noite tinha sido cansativa. Fiquei revisando os últimos detalhes do meu trabalho de conclusão de curso, até quase cair cochilando em cima do computador. Na segunda-feira eu teria que apresentá-lo e, apesar de empolgada, estava temerosa. – Bom dia para você também, camarada – bocejei, empurrando Thor para o lado para me levantar da cama. Apanhei o vestido que eu havia escolhido na noite anterior e, ainda bocejando, fui para o banho. Chase e eu tínhamos combinado de tomar café da manhã juntos no SweetFlavors. Se eu não estivesse pronta quando ele chegasse ele daria um show de drama. Meu cabelo, como sempre, deu trabalho para pentear, mas minha pele parecia especialmente bonita. Nem precisei passar base, usei apenas meu hidratante com cheirinho de lavanda. Revirei meu estojo de maquiagens e com pesar notei que meu batom favorito, de tom matte, estava no fim, assim como meu rímel. Acabei decidindo passar um batom nude e os últimos resquícios da minha máscara de cílios. – Feliz Aniversário para mim – murmurei ansiosa, encarando meu reflexo no espelho. Thor escolheu esse momento para entrar no banheiro e se esfregar nos meus calcanhares. Sorri. Só existiam dois motivos para ele ficar carinhoso, fome e comida. E, tendo em vista o horário, só podia ser fome. – Vem – disse para ele, pegando-o no colo. – Vou te servir um pouco de leite antes de sair. Alguns minutos depois, bebericando minha xícara de café, voltei para o quarto e me conectei a internet, sorrindo ao receber mensagens das minhas amigas pelo WhatsApp.Julyan: Feliz aniversário, Jas!Mer: Como vai minha aniversariante favorita? Respondi as mensagens das meninas com muitos emoticons de coração, dizendo que as amava e, quando estava prestes a voltar para cozinha, meu celular tocou. Eoin. – Feliz Aniversário! – gritou animado. Seu leve sotaque se fez notar e eu sorri gostando da agradável sensação de familiaridade que ele me trazia. – Como está se sentindo? – Mais velha – brinquei, admirando a barra do meu vestido. Era vintage, com detalhes de renda e estampa floral. Bonito e um pouco extravagante. Até cogitei escolher um conjunto básico, mas era meu aniversário e eu merecia. – Você sabe o que dizem, com a idade vem... – Os cabelos brancos? – interrompi rindo. – A sabedoria – Eoin continuou, sem se abalar comigo ou com minha ironia. – Vou passar para Susan, antes que ela arranque o telefone das minhas mãos – riu. – Parabéns – ela disse e cantou uma versão desafinada de "Parabéns para Você", fazendo-me rir. Falamos por alguns minutos e acertamos os detalhes da minha "comemoração de aniversário", ou pelo menos foi como entendi que ela chamou. Deitei na cama com cuidado para não amassar meu vestido e revivi mentalmente os acontecimentos do dia anterior. Já era a quinta vez que eu fazia isso, desde que tinha chegado em casa. – Pai, o volume da TV tá baixo... – a voz de Ellie foi como um balde de água sendo jogado sobre nós. Saltei para longe do contato com Mabuchi envergonhada. – O que vocês tão fazendo? – seus olhos ficaram curiosos. – Pai, por que você tava agarrando o bumbum da Jas? Eu havia achado constrangedor conhecer os pais de Gregory, mas isso... Isso tinha sido pelo menos uma dezena de vezes pior. Cuidadosamente escolhi minhas palavras para responder a ela, mas, antes que pudesse falar qualquer coisa, Mabuchi assumiu a situação. – Eu vou ajustar o volume para você – ele tinha murmurado para a filha. E, apesar da voz calma, parecia desconfortável. – Mas preciso conversar com a Jasmim. Pode esperar um pouco por mim na sala? Ellie lançou mais um olhar para nós dois e desconfiada balançou a cabeça. – OK. – Deus misericordioso – eu exclamei, assim que ela saiu. – Isso foi tão... – Inapropriado – concluiu ele, passando as mãos pelos cabelos. Não era bem a palavra que eu iria usar, mas servia. Logo depois ele saiu pela porta da cozinha, indo atrás de Ellie. A conversa dos dois durou pelo menos uns dez minutos e, quando voltou, parecia mais calmo, mas ainda desconfortável. Limpei a garganta, dando um sorriso amarelo. – Conversa difícil? – Para dizer o mínimo – disse, sentando na cadeira ao meu lado. Mordi o lábio esperando ele continuar. Como ele não o fez, suspirei. – Na segunda feira eu vou precisar tirar o dia de folga – informei. – É minha apresentação de TCC. Ele ignorou. – Jasmim, eu não quis dizer que isso – sua mão acenou entre nós e ele suspirou. – Nós... Não quis dizer que foi inapropriado, só que Ellie ver foi inadequado. – Tudo bem – dei de ombros. – Eu entendo, mas não quero pensar nisso agora. Seus olhos seguraram os meus por uma batida intensa demais e eu desviei. – Posso usar seu telefone para chamar um táxi? A bateria do meu celular acabou e eu quero ir para a casa. – Fique a vontade – disse contidamente, lembrando-me do velho Mabuchi. *** Demorou cinco minutos até que um Chase, muito perfumado, aparecesse no meu apartamento e pelo menos mais uns dez até que ele fizesse Mary – seu carro – funcionar. – Nossa, eu preciso fazer xixi, tomei muita água antes de sair de casa – Chase resmungou, assim que chegamos ao restaurante, fazendo-me torcer o rosto em uma careta. – Informação demais – retorqui, mas balancei a cabeça rindo, quando ele saltou pelo corredor, logo após termos escolhido nossa mesa. No que ele sumiu do meu campo de visão, meu celular tocou e eu pensei em quantas pessoas haviam me ligado ou mandado mensagem desde que tinha acordado. – Já encontrou algum cabelo branco? – meu pai perguntou, assim que atendi. – Eu quase achei que tinham esquecido – dramatizei brincando. Meu pai riu. – Como se isso fosse possível. Lembra-se daquela vez em que espalhou bilhetes pela casa, dizendo que queria uma festa surpresa? Aposto que se esquecêssemos do seu aniversário você daria um jeito de nos fazer lembrar. – Eu tinha nove anos – me defendi, mas a verdade é que de fato provavelmente ligaria, avisando os dois. Meu pai me deu os parabéns e me desejou todos aqueles clichês essenciais em aniversários, como muita saúde, que eu realizasse todos os meus sonhos, e que eu comemorasse muitos e muitos outros aniversários, e assim fez minha mãe, quando falou comigo, poucos segundos depois. No que terminei de falar, Chase chegou. Chase pediu waffles com cobertura de chocolate e café, eu quis uma fatia de torta de banana e café. – Então – ele disse maliciosamente, tão logo a garçonete anotou nossos pedidos se afastou. – Como foi a viagem? Cuidadosamente alisei a toalha da mesa e dei de ombros, fazendo-o bufar. – Legal. Chase me encarou, erguendo a sobrancelha e sorrindo. – Jas, nós dois sabemos que eu vou ficar perguntando até que me conte tudo. Ênfase no tudo – acrescentou. – Então porque não facilitamos tudo e você me conta sem que eu precise usar com você o meu poder de persuasão? Meus ombros tremeram quando ri. Poder de persuasão? Bom Deus, de onde ele tinha tirado aquilo? – Foi boa – corrigi. – Pareceu irreal em muitos momentos. Quero dizer, até alguns dias atrás eu odiava o Mabuchi e tinha vontade de empurrá-lo pela janela e agora... – E agora você quer tirar a roupa dele toda vez que o vê – Chase riu, tentando esconder o sorriso quando lancei para ele o meu melhor olhar raivoso. – Você é inacreditável! – Obrigado! – seu sorriso ficou maior e ele não se preocupou em esconder dessa vez. – Não foi um elogio. – Eu sei. Obrigado mesmo assim. – Ontem a filha dele viu a gente se beijando e tudo ficou meio estranho outra vez – desatei a falar. – Acho que foi o fim de... Seja lá o que isso tenha sido. Chase me deu um olhar cético e balançou a cabeça me fitando. – Talvez seja só impressão. Cruzei os braços ficando na defensiva. – Talvez seja melhor assim – falei. – Ah, pelo amor de Deus, você tem 22 anos, precisa parar de fugir do que sente. – 23 – corrigi baixinho. – Sabe, – ele suspirou me encarando – às vezes você é tão decidida e às vezes simplesmente foge. Principalmente se isso envolver Mabuchi. Tentei e tentei arrumar um bom argumento para o que ele havia dito, mas não arranjei nenhum. – Ele é meu chefe. – Isso não impediu você em Chicago. – Não impediu, mas está impedindo dessa vez. Não é como se eu pudesse aparecer amanhã na empresa e simplesmente puxá-lo pelo colarinho da camisa e fingir que ele não é meu chefe. – Tem razão – concordou solene. – Afinal de contas amanhã é domingo. – Eu vou embora depois da formatura, Chase. Não posso me apegar a ele se logo vou estar em outro país. – Então não se apegue, apenas aproveite. Balancei a cabeça e pela minha linguagem corporal ficou claro que o assunto estava encerrado. – Mas e sobre você? Como estão as coisas com Edward? – Se você soubesse a quantidade de vezes em que preciso assistir aos amigos dele apresentando garotas para ele. Ou a quantidade de vezes que sou apresentado como um amigo – Chase balançou a cabeça. Tateei pela mesa e segurei sua mão. Eu mal conhecia Edward, exceto pelos poucos detalhes compartilhados, mas saber que ele magoava Chase já tornava sua popularidade baixa comigo. – Eu sei que o ama e eu entendo o quanto é difícil se aceitar, mas se ele não tenta... – Ele não vale minha saúde mental – Chase completou com um sorriso triste. – Mas quer saber? Realmente não quero falar disso. – Tudo bem – concordei. – Comprei isso para você – Chase disse, tirando do bolso do seu jeans uma caixinha preta. – Hum , Chase, eu te amo e tal, mas não o bastante para casar com você. Desculpe. Ele rolou os olhos. – Você me acha irresistível, pare de negar. Balancei a cabeça rindo. – Descobriu meu segredo – murmurei e então abri a caixinha. Meu sorriso aumentou ao fitar uma gargantilha dourada com um pequeno pingente em formato de gato. – Eu sou bom em tatuagens – disse, quando eu não falei nada. – Não em presentes, se você não gostou eu posso trocar e... – Eu amei – joguei meus braços ao seu redor e beijei seu rosto. – É lindo.

Era Pra Ser VocêOnde histórias criam vida. Descubra agora