Gustavo ainda está soluçando no colo de Vó Neide, inconsolável pela dor do soldado em seu próprio peito. Ele mistura os sentimentos do soldado com os seus, e ao revisitar as imagens da morte da cigana, ele vê a sua Melinda atirada no chão.
— Meu menino... vê a dor que você carrega? Não podemos permitir que ela se repita... não posso permitir que você morra novamente.
Ele se afasta um pouco, olhando para a idosa, tentando entender o que ela diz.
— Você acha que esse é o meu destino de novo, se eu ficar com Melinda? É disso que tem medo? — até sua voz está fraca, dolorida.
Vó Neide se encosta na cadeira, balançando um pouco o corpo de Gustavo, provavelmente pensando na melhor maneira de falar o que sabe. Ela é uma senhora dura, mas sempre tratou Gustavo como um filho, com carinho, amor.
— Sim. O fim horrível destinado a vocês irá se repetir sempre que vocês ficarem juntos. Já aconteceu antes. Muitas vezes. E não vai ser diferente agora. Temos que cortar esse laço mortal entre vocês dois, para que tenha uma chance de viver.
A dor de se imaginar perdendo Melinda é forte e extremamente vívida, as imagens ainda dançando em sua mente. Ele não pode permitir que ela morra. Não de novo.
Mas também não consegue encontrar forças em si mesmo para ficar longe dela.
— Por que tem que ser assim? Por que não podemos ficar juntos? — ele parece a criança que Vó Neide nunca deixou de enxergar nele.
— Porque o destino já está escrito. E irá se repetir todas as vezes... a não ser que você fique longe dela. Podemos tentar mudar o seu destino, meu menino... não possuo a capacidade de ver sua vida anterior apenas para mostrar o que vai acontecer nessa. Acredito que temos o poder de mudar.
A resposta dela não é satisfatória, e ele se levanta, trôpego, indo até a janela para tomar um ar.
— Você diz mudar o meu destino... mas e o dela? Ela vai continuar morrendo, mesmo se eu ficar longe dela? — só de falar em voz alta algo do tipo o perturba, e novas lágrimas caem do seu rosto.
Não pode existir um mundo sem Melinda. Não seria justo.
Não seria um mundo em que ele quisesse viver.
— Ela já está condenada, meu menino... se não for por sua causa, outra coisa a tirará deste plano. Não existe nada que você possa fazer para mudar isso.
Não. Ele não pode aceitar isso.
— Não posso... não posso ficar longe dela. Eu a amo, Vó! Ela é a mulher da minha vida, não posso... ainda mais sabendo que ela vai morrer...
— Por saber disso que você tem que ficar longe! Você não vai aguentar o que a morte dela fará com você... como não aguentou antes. Em Ostrava, na Florença... em muitos outros lugares. Quando ela se vai, você segue. E isso nunca vai parar, a não ser que se afaste dela agora.
— A senhora está louca. Você viu as mesmas coisas que eu, agora que eu já estou com ela, que já a amo mais do que qualquer coisa nesse mundo, como acha que vou conseguir isso? Vai usar algum dos seus chás especiais para que eu me esqueça dela? Não pode! Nada vai me fazer deixa-la. NADA!
A raiva que sente por tudo o faz esmurrar a parede da pequena casa, causando um pequeno machucado entre as juntas dos dedos – deixando um fraco rastro de sangue – mas ele não se importa.
Ele precisa tirar Melinda de Novo Hamburgo, antes que Vó Neide faça alguma coisa contra ela. Isso o faz pensar em outra coisa...
— Minha mãe... ela sabe disso tudo? Ela está junto nessa história? — ele se vira para a velha, que continua na cadeira, imperturbável.
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A Chance do Tempo
ChickLit"Melinda não é feliz. Apesar de ter uma família amorosa, trabalhar com algo que parece fazer a diferença para alguém - mesmo que não para ela - e ter ótimas amigas, falta algo. Mas ela deixa de pensar nisso quando o seu mundo vira de ponta cabeça ap...