A janela do quarto de Gustavo se escancara com uma rajada repentina de vento, fazendo com que ele pule da cama, assustado. Tinha começado a cochilar enquanto assistia a um filme no quarto.
Um mal pressentimento imediato termina de despertá-lo e o deixa alerta, fazendo-o procurar qualquer coisa ao seu redor fora de lugar. Ele não entende o que é esse aperto em seu peito. É diferente de quando apertou a mão de Melinda. É como se ele soubesse que algo ruim aconteceu.
Talvez seja apenas os anos de convivência com Vó Neide, mas agora parece que ele também está acreditando em coisas pequenas e sendo supersticioso. Mas isso não muda o fato de que ele está extremamente incomodado.
Ele resolve fechar a janela e volta a dormir, a tensão deixa seu corpo pesado e dolorido, mas por mais que ele tente, não consegue pregar o olho, e mais cedo do que gostaria, seu telefone toca, fazendo seu coração disparar de antecipação.
Ele olha para a tela e vê o rosto sorridente de Juliana, ligando em um horário completamente inapropriado – mesmo que essa palavra não exista no vocabulário de sua amiga. Gustavo aperta os olhos, imaginando se deveria ou não atender. Pode ser que ela esteja com problemas e seu mal pressentimento tenha alguma coisa a ver com ela... ou pode ser que ela tenha enchido a cara no sábado e agora está fazendo o que bêbados fazem melhor: passar vergonha.
Juliana sempre liga para falar a Gustavo o quanto ela ainda o ama. Algumas vezes ela varia entre a tristeza e a raiva, gritando que ele não sabe o que perdeu.
Ele apenas escutava e mandava a amiga ir dormir, que no dia seguinte eles conversariam a respeito. No final, a conversa do dia seguinte nunca acontecia, e Juliana ficava alguns dias sem falar com ele, até mandar um meme idiota para puxar assunto. E assim eles conservavam a amizade, baseada em mentiras e conversas nunca terminadas.
─ Alô ─ ele responde seco, para que ela perceba que hoje ele não está a fim de suas lamentações.
─ Gustaaaaaaaaaaaaaaavoooooooooooo ─ a voz de Juliana sai arrastada do outro lado da linha, e ele tem certeza de que está lidando com outra bebedeira dela.
─ O que foi, Juliana? Você acha que isso são horas para me ligar? ─ ele não quer tratar mal a amiga – ele sabe que já fez coisas horríveis com ela – mas não pode deixar que isso continue. Ela se prende a alguém que não a quer.
─ Xiiiii, tá putinho porque tava dormindo, é? ─ ela dá uma risada tão alta que Gustavo tem que tirar o celular do ouvido por um momento ─ fala sério. Você mora em Sampa! Qual é o problema de sair de vez em quando? Tenho certeza que deve ter um mooooonte de gente querendo sair com você num sábado à noite...
Aí está, o começo de todos os discursos bêbados dela.
─ Juliana, não é porque eu moro em São Paulo que eu preciso sair todos os sábados. Você sabe que eu tenho que estudar para o meu mestrado ─ ele tenta manter a paciência, Juliana é importante para ele, apesar de não significar a mesma coisa que para ela ─ e para sua informação, ninguém daqui se refere à cidade como Sampa.
─ Ai como você é chato, seu certinho. Eu estou com saudades de você. Quando volta para me ver? ─ a voz dela está arrastada de manha forçada. Ele nunca poderia falar que Juliana é uma pessoa manhosa – a não ser que esteja travada de bebida.
E ele nunca volta para vê-la. Ela só está convenientemente perto de Luiza para que a veja também. Mas Gustavo decide que essa não é a situação ideal para compartilhar isso com ela.
─ Na sexta à noite estou de volta. Podemos nos ver quando eu for buscar Luiza.
─ Vocês vão para a Fazenda? ─ a voz de Juliana fica um pouco murcha ao entender que Gustavo vai para Novo Hamburgo, mas não para ficar na cidade em si – onde ela teria acesso e ele.
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A Chance do Tempo
ChickLit"Melinda não é feliz. Apesar de ter uma família amorosa, trabalhar com algo que parece fazer a diferença para alguém - mesmo que não para ela - e ter ótimas amigas, falta algo. Mas ela deixa de pensar nisso quando o seu mundo vira de ponta cabeça ap...