A Chance do Tempo

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— COMO ASSIM A SENHORITA ESTÁ NOIVA E SÓ ME FALA AGORA? SUA DESNATURADA FILHA DE UMA MÃE!! — eu afasto o ouvido do telefone enquanto os gritos de Larissa ficam cada vez mais agudos.

Eu não tive muito tempo para conversar com a minha melhor amiga. Ela foi até o hospital enquanto estive lá, mas não tive oportunidade de contar para ela. E como anéis de noivado não são comuns no Brasil, ela nem notou a joia em meu dedo.

Mas acho que ela está meio puta também porque eu não contei para ela pessoalmente, e já faz algumas semanas que o pedido aconteceu. Eu estive tão ocupada com a mudança para o apartamento de Gustavo e com a adaptação dos meus pais ao novo apartamento deles, que fiquei devendo essa para ela.

E esse foi o único momento que encontrei para falar com ela – enquanto espero que Luíza venha buscar eu e o Gustavo no aeroporto de Porto Alegre.

A notícia do noivado foi um pouco estranha para os meus pais, mas de um modo surreal, eles acabaram aceitando. Minha mãe gosta muito de Gustavo, e nessas semanas em que ele não saiu do lado deles, ela acabou se encantando por seu novo genro. Principalmente quando eu e meus irmãos nos sentamos com meus pais para contar o que aconteceu enquanto eles estavam no hospital.

Nunca vi meu pai tão bravo. E nunca vi minha mãe chorar tanto – talvez a sua cadeira a deixe mais vulnerável. Mas quando Miguel contou tudo o que Gustavo e André fizeram, eles o aceitaram como mais um membro da nossa família.

Eles ficaram – assim como meus irmãos – muito felizes com a morte de Fernando. Queriam agradecer pessoalmente ao Alberto, mas eu disse que agora seria um pouco complicado. O fato de seu irmão ser um policial civil não melhorou a situação dele. Gustavo me disse que ele vai responder por homicídio, mesmo que esteja aguardando o julgamento em liberdade. Ele também me disse que sua alegação será a de legítima defesa de terceiro, e que provavelmente ele virá atrás de mim para que eu testemunhe a seu favor.

Até agora meus irmãos e Gustavo conseguiram manter a polícia longe de mim.

A mudança para o apartamento foi tranquila para os meus pais – e um verdadeiro inferno para os meus irmãos. Eles encontraram todos os empecilhos possíveis para atrasá-la, mas quando consegui colocar a última caixa com meus livros no carro de Gustavo, eles foram comigo para conhecer o lugar que agora eu chamo de lar.

Poucos dias depois nós levamos meus pais até o apartamento que Gustavo tinha encontrado para eles. Meus irmãos decidiram aproveitar toda nossa movimentação e deram um rumo em suas próprias vidas: Miguel vai morar com André em nossa antiga casa, que ele comprou dos meus pais, assumindo a dívida do financiamento e permitindo que nossos pais tivessem dinheiro para pagar o aluguel por bons anos do apartamento.

Rodrigo decidiu alugar um flat no centro da cidade, onde ficaria relativamente próximo a nós e que fosse do agrado das suas muitas amigas especiais.

No final, eu ter batido o pé e resolvido sair de casa fez com que todos andassem com suas vidas.

E agora que minha parte está resolvida, fiz questão que Gustavo resolvesse o seu lado também. Ele me contou um dia que estávamos comendo pizza em casa – é tão estranho falar isso... – que depois que eu fui embora, ele brigou com sua mãe e com a Neide. Eu também não sou a maior das fãs de nenhuma das duas, mas mesmo assim, é a família dele.

E já me falaram que a gente se casa com a família da pessoa também... então não vamos começar da maneira errada.

— Ela está muito brava? — Gustavo pergunta para mim em voz baixa, enquanto eu tampo o microfone do celular, com medo que ela o escute.