Make An Extraodirary Life!

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  Estou acordada já faz algum tempo, porém, me recuso a abrir os olhos ou fazer qualquer movimento brusco. Com certeza iria doer demais e já dói muito. Nunca mais que eu bebo!

-Chan, sei que deve estar bom ai, mas preciso usar o fogão. – Dinah me chamou acariciando meus cabelos. Me mexi minimamente, tentando descobrir onde caralhos estava. Ah não! Abri um pouco os olhos e confirmei minhas suspeitas: estava atravessada na bancada da cozinha, com a cabeça nas trempes do fogão e os pés dentro da pia.

-Porra, vocês me prostituíram depois que apaguei ontem? Por que tudo dói tanto? – Choraminguei.

-Eita, nem passando mal perde essa boca suja, hein? Tão bonitinha, pena que só fala bobagem. – Uma voz desconhecida soou atrás de Dinah. – Aliás, você tá uma porcaria, garota. – Cerrei os olhos para o abusado e fiquei um pouco em duvida: aquele era o The Rock vestindo meu roupão de patos e de peruca loira?

-Quem é você? – Perguntei fazendo força pra me levantar.

-Patrícia. – Respondeu levando uma colher de cereal a boca.

-E o que tá fazendo aqui? Por acaso é um gêmeo univitelino perdido da Dinah?

-Eu moro aqui agora, sua estúpida! – Franzi o cenho. Quê? – Te pedi um ob no banheiro feminino e você me convidou pra morar contigo.

-Eu não fiz isso! – Não fiz, né?

-Ai, Patrícia, não tem como levar o convite dela a sério, ela é lésbica. – Ela explicou como se fizesse todo o sentido do mundo. Me senti ofendida. – Pra você ter ideia, ela vai ter um primeiro encontro oficial hoje e eu já comecei a pagar meu vestido de madrinha pra dar tempo de chegar daqui três meses.

-Ei! Seu comentário foi muito preconceituoso. – Abracei sua cintura com as pernas e subi em seu colo.

-Camila, até que parte de ontem você se lembra? – Perguntou me carregando sabe-se lá pra onde.

-Humm.. – Tentei forçar a memória. – Não sei se isso é uma lembrança ou se estou alucinando, mas a Keana roubou o caminhão do lixo e tentou entrar com ele no rio?

-Ah sim, ela super fez isso! Foi hilário o desespero da sua lolo. – Debochou na última palavra.

-Minha lolo? Que isso? – Percebi ela abrindo alguma porta.

-O apelidinho que você botou na Lauren. – Porra, que vergonha! – Se lembra de não calar a boca sobre a empresa de terceirização que herdou do seu pai?

-Que empresa? Que pai? – Perguntei afobada.

-É o que todo mundo queria saber! – Riu. – Cara, você ficou muito louca.

-Misericórdia. Não me conta mais nada! Só me diz que não fodi as coisas com a Lauren, por favor. – Implorei em um choramingo.

-Relaxa, você não fez nada demais. – Suspirei aliviada. -- Harry, acorda, amorzão. – Dinah se sentou comigo ainda em seu colo na cama do nosso amigo.

-Tô acordado. Ou melhor, não consegui dormir. – Disse com a voz embargada e nesse momento entrei em estado de alerta. Saber que ele andou chorando até me curou da bebedeira.

-O que foi Hazza, o que aconteceu? – Sai dos braços de Dinah e me arrastei até ele preocupada.

-Conta pra ela, Dinah, não quero repetir essa vergonha. – Enterrou o rosto no meu peito e chorava baixinho. Nossa, meu coração se partiu em mil pedacinhos.

-Você não passou vergonha alguma. – Suspirou triste. – Ele se declarou pra Ariana ontem, Mila, e bem, ela não levou muito a sério.

-Não levou a sério? – Riu com amargura. – Ela riu de mim, debochou dos meus sentimentos, acabou comigo! – Ele contava com dor entre os soluços do choro. – Não foi uma escolha. O que posso fazer se nasci assim? Não tenho culpa de ter nascido sensível demais para um homem, ou de não falar grosso, ou de não gostar das coisas que se assume que um homem deveria gostar. Muito antes de entender o significado, eu já era o viadinho, o gay, a bicha.. Eu era só a porra de uma criança! Qual o maldito problema em gostar mais de bonecas do que de carrinhos? Me machucavam e eu nem conseguia entender o porquê. Tudo que eu queria era brincar. – Sua fala era entrecortada e carregava tamanho sofrimento que Dinah e eu chorávamos junto. Seu rosto estava todo vermelho e buscava o ar com muita dificuldade, como se fugisse de um afogamento. – Eu queria tanto ter tido a chance de me descobrir. Mesmo que fosse sofrido, como todo mundo fala que é, queria ter feito isso por mim mesmo. Fizeram a mera ideia de gostar de garotas soar como um pecado na minha cabeça, porque me rotularam, me definiram de um forma tão profunda que nunca nem sequer considerei ser diferente. Engraçado, não é? Porque a regra geralmente funciona no sentido oposto. – Resfolegou forte. – Acontece, que não importa o que eu faça, a primeira coisa sobre mim que todos reparam é isso: gay! Nunca nem me perguntaram nada, até porquê o fato de dar pinta já serve como resposta, né? – Ele enxugava as lágrimas com força. – De alguma maneira, parece que pra todos é impossível um cara gostar de garotas se não for o machão alfa. O ato de se sentir atraído por alguém parece dizer muito pouco se comparado com a força do estereótipo. Olha pra mim! Eu poderia ser casado com uma mulher que aos olhos das pessoas ainda seria só um encubado. Mas a Ariana, cara... – O apertei com todas minhas forças, tentando a todo custo trazer algum conforto. Me doía quase que fisicamente o ver tão machucado. – Eu jamais poderia esperar isso dela. Ela não é obrigada a corresponder nada, até porquê, nunca passei do melhor amigo gay que ela pede conselhos sobre maquiagem e homens, como poderia sequer imaginar? Quando me declarei, não era essa a intenção de qualquer jeito. Mas precisava responder com tanto deboche, como se tudo não passasse de uma brincadeira? Eu mudei por ela! Mudei minhas roupas, meu jeito, meu cabelo, mudei porque pensei que lutar por ela valia a pena, agora me sinto um estúpido! Não adianta, não importa o que eu faça, não faz diferença alguma para o mundo.

Tongue TiedOnde histórias criam vida. Descubra agora