Três anos e alguns meses depois...
-Mila. – Harry me chamou com um sorriso divertido nos lábios logo após eu terminar o que se tornou um monólogo sobre um documentário que assisti na noite passada. – Eu adoraria ouvir mais sobre o derretimento das geleiras no polo norte, mas tenho certeza que você não me chamou aqui para isso. – Assoprou seu café, levando a xícara a boca em seguida.
-Desculpa, esqueci que você não tem muito tempo. – Pedi envergonhada. – É que temos nos visto tão pouco ultimamente, estava com saudades de jogar conversa fora.
-Não precisa se desculpar, meu amor. – Segurou minha mão sobre a mesa. – Quem tem que se desculpar sou eu. – Conferiu as horas em seu relógio de pulso. – Não quis te apressar, ainda tenho um bom tempo antes de ter que voltar para o escritório.
Minha expressão caiu com sua última frase. Eu simplesmente não consigo me conformar.
Me concentrei em mexer meu café por alguns instantes, meio sem saber o que falar. A cafeteria estava lotada. Devido ao frio intenso que fazia em Nova York, todos procuravam se aquecer com uma boa xícara de bebida quente.
-Sabe, você não precisa ficar triste toda vez que eu falo a palavra escritório. – Harry sorria, mas seu sorriso não chegava aos olhos. – Eu estou bem, é sério. Eu fiz essa escolha, e honestamente, não me arrependo.
-Mas não é justo! – Rebati chateada.
Meu amigo apenas me olhou com carinho e deu de ombros. Não adiantaria argumentar, de qualquer maneira.
-Bom, eu realmente não te chamei aqui para falar sobre o derretimento das geleiras no polo norte. – Decidi mudar de assunto. – Queria a sua opinião a respeito de uma situação.
-Estou ouvindo.
-Eu tive uma reunião com o Simon esta semana. – Comecei a brincar com os dedos.
-E?
-E ai que ele me fez uma proposta. Uma proposta irrecusável, do tipo que qualquer um morreria de alegria ao receber em um início de carreira.
-Uau. – Bebeu mais um gole de seu café. – Eu te daria os parabéns agora, mas você não me parece exatamente alguém morrendo de alegria. O que foi?
Quando eu estava prestes a começar a contar, seu celular tocou.
-Só um minutinho, Mila.
Enquanto ele atendia a chamada, me encostei na cadeira e passei a observar as pessoas que andavam pela calçada através do vidro. Às vezes me pego fazendo isso; seguindo um desconhecido qualquer com o olhar e divagando sobre coisas bestas. Por exemplo: o bebezinho no colo da mãe do outro lado da rua, será que ele um dia vai mudar o mundo? E a mãe dele, será que é feliz? O moço careca que acaba de passar apressado, será que já encontrou o amor? E a mulher loira que anda cabisbaixa, o que a deixou triste?
Existe uma coleção infinita de histórias nas multidões. São pessoas únicas, com histórias únicas. Todos correm, e para mim é divertido imaginar pelo que.
-Ei. – O mais velho chamou minha atenção de volta. Quando vi seu olhar de lamentação, já imaginava o que viria a seguir. – Sinto muito, mas tenho que ir.
-O que aconteceu?
-Parece que houve um erro em um contrato importante, meu tio me pediu para voltar imediatamente. – Passou a mão nos cabelos. – Mila, me desculpa mesmo. Quando eu chegar em casa te ligo e você acaba de me contar o que está acontecendo, pode ser?
-Claro, sem problemas. – Sorri para tentar esconder a frustração. – E a Alycia, está melhor?
-Está sim, bem melhor. – Respondeu com alegria. – Ela se recuperou bem da última crise e o papai tem tratado dela com o dobro de atenção.
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Tongue Tied
Romance''Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem o dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro esquecem do presente de forma que acabam por não viver nem no presente nem no futuro. E vivem como se nunca fo...