Se beber não se apaixone

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  Eu não deveria estar fazendo isso. Este pensamento martelava forte na minha cabeça, perdendo apenas para a felicidade que eu sentia por poder ficar ao menos um pouco perto dela. Continuei fingindo estar digitando algo no notebook enquanto observava discretamente a interação das duas:

-Não, Lauren, deixa que eu faço! – Dinah se adiantou, pegando a tigela com a massa antes que a morena pudesse. – E agora?

-Derrama devagar até metade de cada forma. – Instruiu.

-Por que tem três? – A loira perguntou confusa.

-A Normani não pode comer açúcar. Vou fazer um pedaço light pra ela. – Explicou, tentando alcançar um pote na pratilheira de cima.

-Ela tem é diabetes?

-Ah não! Ela perdeu parte do figado em uma briga de faca com o ex-marido uns anos atrás. – Arregalei os olhos.

-Que horror! – Exclamou a maior com uma careta. – Vou querer saber melhor dessa história depois. – A morena concordou, quebrando alguns ovos na batedeira com muita habilidade pra alguém que só podia usar um braço.

Dez dias atrás, deixei o banheiro daquele hospital convencida a superar Lauren de forma madura, já que lágrimas nunca resolveram meus problemas. Confesso que a princípio não deu muito certo; passei cinco dias trancada no apartamento comendo torresmo e bebendo cachaça enquanto chorava ouvindo os sucessos de Billy Joel e xingava as fãs da Selena Gomez no Twitter. Foram dias difíceis, Dinah teve dificuldades em lidar comigo, mesmo que eu ache que ela exagerou. Ela podia ter sido um pouco mais compreensiva, eu estava sofrendo e sem controle das minhas ações, tudo que eu fazia era motivo pra reclamação:

''Camila, espero que isso que você está fumando não seja a samambaia do Harry, porque ele vai te matar! ''

'' Camila, você não pode vender sua mãe na Deep Web, isso é anti ético!''

'' Camila, você não pode ficar quatro dias sem tomar banho, os urubus estão se batendo contra a janela e eu não vou pagar pra consertar essa merda de novo''.

''Camila, tira essa prostituta do nosso banheiro! Ela vai ter que nadar na gelatina em outro lugar.''

Seis dias e um problema nos rins em potencial depois, Dinah conseguiu me convencer (lê-se obrigar) a tomar um banho e largar minha batida de vodca com laranja e rivotril. Quando a consciência voltou, me senti muito envergonhada. Perguntei o que estava fazendo no aterro sanitário e ela me contou que aquilo era o meu quarto. Conversamos muito nesse dia; minha amiga não quis opinar sobre minha decisão em relação ao caso do triangulo amoroso, ela simplesmente se sentou e me ouviu; só então pude perceber o quanto estava precisando desabafar. Gostaria muito de me esquecer dessa semana desastrosa, o que não é possível, já que a câmera que temos instalada na sala documentou tudo e Dinah colocou a fita da gravação em um seguro. Essas cenas com certeza não vão para o nosso reality!

Percebi que precisava manter a mente ocupada. É aquilo que dizem: cabeça vazia é oficina do diabo. Nunca pensei que diria isso, mas sinto falta de trabalhar. Um mês atrás vivia pedindo para as férias chegarem logo, agora, tudo que mais quero é arrumar um chefe para me explorar e maltratar oito horas por dia. Me acostumei com essa vida de estudante pobre e assalariada, não aguento ficar sem fazer nada. Na falta da primeira opção, resolvi me distrair com a minha coisa favorita no mundo depois de peitos e a trilogia do Senhor dos Anéis: maratona de séries! Não deu certo. Meu cérebro traiçoeiro sempre dava um jeito de associar Lauren a todo e qualquer episodio, fazendo assim eu desistir da televisão e preferir ficar em posição fetal imaginando como seria nosso casamento.

Tongue TiedOnde histórias criam vida. Descubra agora