Aconteceu na fase mais difícil em que já passamos.
Na época, parece que todas as merdas possíveis decidiram cair sobre nós, da pior forma que puderam, ao mesmo tempo. Eu estava no último semestre da faculdade e estagiando na Warner, portanto, ocupada como nunca antes. Ao longo desses mesmos meses, rolou toda a situação da gravidez da Ari, o parto prematuro e Harry precisando de muito apoio emocional. E como se fosse pouco para lidar, foi quando todo o afastamento com a Dinah estava acontecendo.
Lauren e eu também já não estávamos nos entendendo muito bem e as brigas eram constantes, mas a situação se tornou quase insustentável mesmo quando Chris, o irmão dela, morreu em um acidente de carro e ela se recusou a ir ao enterro. Que os dois se odiavam, todo mundo sabia. Eu mesma nunca gostei dele, apesar de jamais termos trocado sequer uma palavra durante às vezes que fui a casa de Clara. Ele exalava uma energia ruim e parecia sempre estar me olhando esquisito, o que fez a antipatia nascer logo primeiro contato. Sinceramente, pensei que Lauren daria o braço a torcer e iria ao funeral ao menos para não contrariar Clara, que ficou extremamente abalada com a perda e creio que até hoje não se recuperou. Só que ela não o fez, e esse foi o início do caos.
Além da Keana, ninguém de sua família aceitou bem essa decisão, nem mesmo os mais próximos, como a Ashley ou o Zayn. Apareceram tios e parentes distantes até do inferno para julga-la, sem contar os irmãos mais velhos, que faziam questão de não dar sossego. Ai, para completar a sequência de desgraças, Clara teve um princípio de infarto, e, de maneira totalmente sem lógica, arrumaram um jeito de a culpar por isso, sendo que nem por perto ela estava.
Essas lembranças me doem, pois sei que não estive lá para ela do jeito que deveria. Além de estar cruzando minha própria fase complicada, se tornou muito difícil lidar com Lauren. Minha namorada sempre foi muito movida a essas suas vontades aleatórias, porém, nesse período, essas vontades se tornaram irresponsáveis, perigosas e podiam ter terminado muito mal. Seu comportamento negligente apenas agravou nossas discussões, que a essa altura beiravam o insuportável.
Ela se fechou em sua própria bolha e não conversava comigo, não permitia que eu me aproximasse para ajuda-la. E eu também demorei a perceber que suas atitudes eram uma forma de se distrair do sofrimento. Por sempre ter sido tão forte, quase inabalável emocionalmente, custei a me dar conta de que Lauren desabaria por dentro como qualquer pessoa normal faria passando pela mesma situação.
Chegou um ponto onde eu simplesmente não sabia mais o que fazer. O nosso relacionamento se desgastava cada vez mais, eu tinha um milhão de coisas na cabeça, mais um milhão para fazer e nenhuma ideia de como agir. Tudo o que eu sabia era que a amava e que nunca desistiria dela enquanto ainda tivesse forças para lutar.
Vê-la sorrindo nessas fotos de maneira tão forçada, tão falsa, me faz voltar a essa fase ruim que passamos, porque me lembra que ela sorria da mesma forma, embora alguém que não a conheça profudamente jamais pudesse notar. As fotos são como as outras; apenas ela, em momentos aparentemente felizes com seus amigos. Acontece que, por mais que alguém te peça para esquecer algo, você não pode simplesmente se impedir de lembrar. E exatamente isso acontece comigo agora. Vendo o álbum, começo a associar tudo o que ela já me contou sobre essa época e me sinto mal porque sei que ela estava sofrendo enquanto se fazia de feliz.
E por mais que a gente se entenda, se conheça, converse por olhar e saiba o que os pequenos gestos e expressões da outra significam, algumas coisas precisam ser ditas em voz alta. Estranhamente, a noite mais tensa que já tivemos foi justamente a que deu início ao fim da crise no nosso relacionamento. Foi quando eu me dei conta pela primeira vez que não a entendia tanto assim, pelo menos, não como achava que entendia:
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Tongue Tied
Romance''Os homens perdem a saúde para juntar dinheiro, depois perdem o dinheiro para recuperar a saúde. E por pensarem ansiosamente no futuro esquecem do presente de forma que acabam por não viver nem no presente nem no futuro. E vivem como se nunca fo...