Capítulo 2

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**Beth**

Ouço o barulho do meu despertador bem lá no fundo da minha mente, a casa ainda está em silêncio, sinal que todos ainda não acordaram. Sinto o colchão se mexer e de imediato respiro fundo, o cheiro de Nicolas preenche meus sentidos. Oh merda! Fiz de novo.

- Bom dia – Ele fala, beija minha cabeça e se levanta, finjo que ainda estou dormindo, acordar nos braços dele sempre me deixou com uma sensação estranha, com Lucas é simples, apenas me sinto bem, mas Nicolas é diferente, mais intenso. Porque inferno não poderia ser igual? – Não adianta fingir que está dormindo, eu sei que você está acordada.

- Me pegou – Falo esfregando os olhos, encaro o relógio, ainda é 6 da manhã – Bom dia.

- Precisei colocar o despertador um pouco mais cedo para não ser pego aqui – O frio entra por baixo da coberta e de imediato sinto falta do calor do seu corpo – Você pode cochilar mais uns 30 minutos, estou indo para o meu quarto.

- Nicolas – Falo olhando diretamente para ele que já está com a mão na maçaneta da porta, ele respira fundo e me olha de volta.

- Beth!

- Me desculpe – Sinto-me uma fraca, meus pesadelos e meus episódios de sonambulismo.

- Não precisa se desculpar, lembre-se, sempre vamos cuidar um do outro. – Então ele sai do quarto me deixando com meus pensamentos. Se eu voltar a passar com o psicólogo ele irá me passar novamente o tratamento, os remédios não me ajudam apenas a dormir, mas me deixam zonza e desnorteada, me sinto mal com eles. Medicação para esse tipo de doença não é comum, mas nada resolveu, nem terapia, hipnose ou qualquer coisa, com o passar do tempo os episódios foram diminuindo. Quando pequena, ocorriam praticamente todos os dias, atualmente umas duas vezes por semana.

Quando desço as escadas com meu uniforme olho para a mesa da cozinha, somos 6 agora. Os Alves são adoráveis, transformaram sua grande casa em uma casa de acolhimento para órfãos logo depois que seu filho de 5 anos morreu e Marisa descobriu que não poderia mais ter filhos. Eles são um típico casal que se conheceu no colégio, se apaixonou e juntos criaram um amor para todo o sempre, mas a triste perda de seu filho deixou uma marca profunda. Nicolas, Lucas e eu somos os mais velhos na casa, antes de nós havia Marcela, que completou 18 anos a cerca de três anos atrás e teve que deixar a casa, a lei é clara, eles poderiam acolher 6 crianças até completarem 18 anos. Marcela ainda permanece próxima a nós, como uma irmã mais velha. Só de pensar que o meu tempo com os gêmeos está contado me sinto desnorteada, eles são importantes demais para mim.

- Bom dia Beth – Ouço a voz de João, o meu pequeno lindo, com 8 anos, ele mora conosco a aproximadamente 6 meses, sua mãe morreu de câncer e os Alves foram busca-lo em uma noite chuvosa, nunca irei me esquecer quando eles abriram a porta e os trovões ecoavam por toda a casa, estávamos todos sentados na sala assistindo um filme. De imediato ele olhou para Nicolas e Lucas e teve a mesma reação de todos, o espanto por serem iguais, sempre achei engraçado, eu nunca me fiquei confusa com a aparência deles, desde a primeira vez eu soube quem era quem.

- Bom dia pequeno – Falo beijando-o na cabeça e sentando no meu lugar, sempre entre os gêmeos.

- Bom dia, linda! – Lucas fala beijando minha bochecha e colocando uma torrada com geleia no meu prato.

- Bom dia – Retribuo afagando seu rosto. Nicolas está concentrado em sua câmera olhando alguma coisa na lente

- Aula de fotografia hoje Nicolas? – Sra Alves se aproxima dele e entrega sua caneca de café puro de todos os dias.

- Sim – Ele fala voltando-se para ela – Obrigado.

- Quando será o festival? – Ela completa sentando-se junto na mesa, ajuda Lorena, a loirinha de 5 anos que está tentando descascar a maçã com uma faca de manteiga – Coma com a casca, é onde estão as principais vitaminas, é bom pra você – Ela fala retirando a faca das mãos da menina e volta a olhar para Nicolas.

- Daqui alguns meses, ainda tem bastante tempo – Lucas fala preenchendo o silêncio que seu irmão deixou – Ele vai ganhar, eu tenho certeza.

- Não tenha tanta certeza assim – Nicolas fala colocando a câmera sobre a mesa – Eles tem bons candidatos a bolsa.

- Mas tenho certeza que você será o melhor – Sr. Alves fala afagando seu ombro em sinal de incentivo – Se eles não acharem isso, são malucos, você é muito talentoso.

- Pelo menos nisso sim – Nicolas fala com a voz baixa.

- Ei mano. Pare com essa merda.

- Vamos nos atrasar – Nicolas pula da mesa e ignora todos que o olham apreensivos – Beth precisa fazer a inscrição para a turma de teatro no centro comunitário, se demorarmos vamos chegar atrasados na escola – Um barulho de cadeiras sendo arrastadas toma conta da cozinha, ele é o líder da matilha, não há como negar.

Respiro fundo quando me aproximo da cabine de inscrição do curso de teatro, passei meses esperando uma vaga, sempre sonhei em fazer teatro, eu fazia quando criança e sempre amei. Quando tinha 8 anos fui protagonista em uma peça infantil na minha antiga escola, eu fui Dorothy, do mágico de oz, amava as tranças nos meus cabelos castanhos avermelhados. Hesito por um segundo, quando me lembro da minha mãe me aplaudindo na plateia e meu pai enxugando as lágrimas de alegria, eles amavam me ver no palco, meu irmão Gabriel estava entediado, mas feliz por mim, estava na fase de só querer jogar vídeo game no quarto com os amigos, enfrentar uma peça de teatro não era o seu programa preferido.

- Você vai conseguir – Ouço Nicolas próximo de mim, ele puxa meu braço e me faz subir o resto das escadas que faltam – Você vai arrebentar, pare de pensar apenas sinta como você sente falta disso, nada além de atuar e do palco.

- Não sei Nicolas – Olho para o final da escada, Lucas está apoiado na parede nos olhando atentamente, ele sorri abertamente pra mim e acena com a cabeça para que eu ande – Acho que é melhor eu não fazer nada do que eu gostava naquela época, pode desencadear outras coisas.

- Pare com isso – Ele fala me puxando ainda mais rápido – Você não gostava, você gosta. É o que você é, o que você quer fazer. Você quer fazer esse curso a anos, eu não vou deixar você desistir novamente. Pare de tentar mentir pra você mesma, enfrente tudo isso Elizabeth, você precisa encarar essa. – Ele raramente fala meu nome completo, mas Nicolas tem razão, eu preciso enfrentar. Com meu coração acelerado faço a inscrição. Vou voltar para o palco, ah Deus, meu coração pulsa ainda mais forte.

No alto da colina - Série Perfeição Livro 1 Onde histórias criam vida. Descubra agora