0|18

800 72 15
                                    

Era como constatar um fato: eu não era para relacionamentos. Eu havia perdido absolutamente todos ao longo daqueles 37 anos.

Eu superava. Eu sempre superava.

Mas acontece é que doía mais do que eu gostaria de admitir. E não tive coragem de mandar nada para o Ike enquanto ele estivesse em NYC ou diria que estava apaixonada e tudo ia piorar. Só me restava uma coisa: seguir a vida. Voltar ao trabalho e esquecer aquele sentimento ruim.

Tentaria fazer aquilo sem me afastar de Ike. Eu precisava ser forte. Eu havia passado tanto tempo me lamentando por não tê-lo perto de mim e agora teria que aceita-lo da forma que ele era. Eu não sentia isso quando ele estava com a esposa, não poderia sentir agora.

Os dias no trabalho foram intensos e cansativos. Mas  era bom, eu ocupava minha cabeça com algo e quando chegava em casa, eu somente dormia. Agora eu conseguia dormir. Na verdade difícil mesmo era acordar.

Ike, claro, voltou a me ligar e mandar mensagens. A gente conversava tranquilamente, ele mal falava de Arabella e eu fingia que ela não existia.

Em uma dessas nossas conversas aleatórias, perguntei:

— Ike, você achou mesmo que gostava de mim?

— Achei. Achei mesmo. Não sei bem como aconteceu mas... Morgs, você sempre foi linda. Você é linda hoje. Era óbvio que eu iria me apaixonar. Ou achar, sei lá...

— Quando você viu que não era apaixonado?

Ele ficou em silêncio alguns segundos.

— Eu não sei... só não senti mais isso dentro de mim. E Arabella... bom, ela me mostrou que eu podia tá só com medo da solidão.

Sorri tristemente.

— Porque está perguntando isso?

— Na verdade eu não sei. — Mentira. — É que eu não imaginei que pudesse sentir algo assim.

— Morgs, eu sei que somos amigos e eu faria isso de qualquer forma mas... eu reuni toda a família para fazer um aniversário pra você. Mesmo você a milhares de quilômetros. Claro que eu estava confuso, mas fiz mesmo assim.

Ele tinha razão.

— Meu aniversário está chegando e eu não quero menos do que aquela festa, ok?

Ele riu alto do outro lado.

— Claro, Morgs. É só você chegar em Tulsa. Já fiz esse convite várias vezes.

— Você faz todo dia.

— Faço. Venha me ver em Tulsa, por favor.

Ri novamente.

— Eu já disse: vai rolar.

— Eu deveria parar de ir a NYC até você decidir vir aqui.

— Você sabe que é injusto.

— Eu sei que é.

Ficamos em silêncio novamente.

— Eu fiquei pensando, Morgs. Acho que eu agi errado com você.

— Como assim?

— Eu achei que seria uma boa ideia chegar de uma vez e pedir pra você provar a minha namorada que éramos apenas amigos.

Namorada. Ela era agora a sua namorada.

— Foi constrangedor, Ike. E eu confesso que se fosse qualquer outra pessoa, eu jamais teria aceitado. Somos amigos, não tenho que ficar provando nada.

— Eu sei. E eu peço desculpas. Mas você causou boa impressão. Ela gosta de você.

— Ela é uma boa pessoa. — Eu não havia mentido. Ela era, ou parecia ser. Mas eu não poderia dizer que gostava dela.

— Mas Morgs.

— Hum...

— É tão absurdo assim ter ciúme de nós dois?

Pensei um pouco.

— Como assim?

— Eu vou te visitar em NYC, a gente troca carta e SMS o dia todo, eu te ligo a noite. Eu gravo fita dizendo que te amo e eu realmente te amo. É claro que qualquer namorada teria ciúmes.

— Você não disse que éramos apenas amigos? Ela deveria acreditar em você.

— É difícil ser segura quando você é maravilhosa.

Meu rosto ficou vermelho. Com certeza ele havia ficado vermelho.

— Não importa. Você tem palavra e também caráter. Você jamais a trairia por mais maravilhosa que a pessoa fosse.

— Sim, isso é verdade.

Ficamos em silêncio novamente e ele cortou:

— Eu queria te ver agora.

— Seria bom dividirmos um sanduíche de pasta de amendoim com geleia.

— Seria. — Ele riu. — Já está tarde, eu preciso desligar.

— Tudo bem, Ike. Eu preciso ir dormir também. Boa noite.

— Te amo, ok? Jamais esqueça disso.

— Eu também te amo, Sr. Hanson.

Quando desliguei, senti tudo dentro de mim. E foi isso que aconteceu. Eu deitei na cama querendo dormir, mas ouvi a voz de Ike em meu ouvido.

— Eu te amo...

Senti suas mãos em minhas pernas, subindo pelo meu corpo, passando pelo meu cabelo, respirando em meu ouvido.

— O que está fazendo?

— Te fazendo minha.

— Mas eu já sou sua, Ike. Sempre fui.

Então eu apaguei.

MORGANA (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora