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Quando eu o vi pela primeira vez, eu sabia que ele iria ser meu amigo. Estava há seis meses naquela escola onde ninguém falava inglês e eu não me esforçava tanto para falar espanhol. Logo meu pai iria me levar para longe dali.
Polônia, Indonesia, Brasil, República Tcheca e por último... Venezuela. Era o preço que tinha de pagar por ser filha de um diplomata.
O ano era 1991. Pearl Jam laçava seu CD icônico: Ten e Queen já lançava seu segundo Greatest Hits. E absolutamente NINGUÉM ali sabia disso.
Então, em uma manhã quente, eu o vi entrando na escola com a blusa do Queen. Ele tinha o cabelo grande e era muito, muito, muito branco. Eu nem sabia lidar com aquilo. Quando descobri que ele iria estudar na mesma sala que eu, percebi que a minha meta de vida seria fazer amizade com ele. E, ao que parecia, o Espanhol dele era tão péssimo como o meu.
Aproveitei o intervalo para me aproximar oferecendo a ele um pedaço do meu sanduíche de pasta de amendoim com geleia de morango. Ele estava na quadra sentado e com fones de ouvido e um toca-fitas.
— Hey...
Por alguns segundos ele me ignorou até perceber que estava mesmo falando com ele. Ele tirou os fones do ouvido e soltou:
— Lo siento, no hablo español. — Ele parecia ter ensaiado muito aquilo já que foi quase automático.
— Nem eu. — Falei em inglês. E vi no seu rosto a expressão de surpresa. — Prazer, Morgana Parker. Pode me chamar de Morg.
— Wow, que bom poder ouvir alguém falando à minha língua! — Ele aceitou minha mão com um sorriso enorme. — Isaac Hanson. Mas pode me chamar de Ike.
— Eu adoro eles. — Falei apontando para sua camiseta.
— Really? Qual sua música preferida?
— Hum... — Pensei — Posso me sentar?
— Claro! — Ele tirou seu rádio e deu espaço para que eu sentasse.
— Acho que Rádio Ga Ga ou Who Wants to Live Forever. E você?
— Love of My Life. — Ele sorriu. — Eu estou ouvindo The Beatles, quer me acompanhar?
Eu achava Beatles superestimado, mas queria um amigo. Então dividimos o fone pela primeira vez.
∞
— Mãe, essa aqui é a Morgana, minha amiga da escola.
— Oh, ela quem é a americana? Que linda! — Diana me abraçou e eu já gostei de cara daquela mulher com sorriso simpático e cabelos loiros. Ike tinha os olhos dela.
— Obrigada, dona Diana.
— Espero que queira ficar para o almoço. A Jess finalmente conseguiu dormir.
— Jess é minha irmãzinha pequena. — Ele sussurrou para mim. Balancei a cabeça.
— Se vocês quiserem, podem ir pra sala, eu prepararei sanduíches já que o almoço vai demorar um pouco a sair.
Fomos pra sala e Ike pegou um mini teclado.
— Você sabe tocar? — Perguntei supresa.
— Sim!
Antes que pudesse falar mais alguma coisa, duas crianças apareceram correndo pela sala:
— Me devolve isso Zac! — o maiorzinho gritava com o menor.
— Não! — o menor gritou.
— Mãe! O Zac não quer devolver o meu homem aranha!
Ike saiu do meu lado e se abaixou para falar com o menorzinho:
— Zac, e a conversa que tivemos sobre não pegar as coisas dos outros sem pedir?
— Mas eu queria brincar. — Zac choramingou enquanto o outro cruzou os braços.
— Eu disse que não era pra pegar!
— Calma, Taylor. — Ike continuou. — Zac, entregue o boneco para ele e pegue um dos seus.
— O que está acontecendo aqui? — Diana apareceu na sala.
— Nada, mãe. — Ike falou enquanto olhava pra o menor que, à contragosto, entregou o boneco para o irmão. — Eles já se resolveram.
— Obrigada, meu filho. — Ela beijou a cabeça de Ike.
— Então, você toca o quê?
— Eu tava aprendendo a tocar Rádio Ga Ga pra você cantar.
— Você sabe que eu sou horrível cantando.
— É porque você não viu o Taylor.
Rimos baixinho para que seu irmão que estava ali próximo não ouvisse.
— Ok, você precisa me dizer o que vai fazer no dia da terra na escola. — Perguntei para ele que ficou pensativo.
— Minha mãe tava querendo que eu e os meninos se apresentassem cantando.
— Vocês cantam juntos?
— Papai sempre ensina uma ou outra música e ficamos brincando. Ele gosta disso. E você? O que vai fazer?
— Eu queria imitar a Madonna, mas minha mãe me proibiu. Eu ainda não sei.
— Quer a gente te ajude?
— E como pretende me ajudar?
— Não sei, vamos pensar em algo, Morg.
Eu ouvi Ike tocando e cantando algumas músicas. Ele tinha uma voz muito boa, melhor que a minha. Foi quando ouvimos um barulho vindo da cozinha. Era um homem alto entrando pela porta.
— Opa, temos visitas. — Ele sorriu olhando para mim logo depois de falar com os filhos.
— Oi, sou a Morgana. — Falei timidamente.
— E eu o Walker. Seja bem-vinda à nossa casa, mocinha.
Enquanto via os meninos brincarem — para logo depois brigarem — senti um pouco de inveja de Ike e sua família. Eles eram tão amorosos um com o outro e era uma família enorme, pelo menos para mim que não tinha irmãos.
Enquanto Taylor me enchia de perguntas e mexia no meu cabelo, pude ouvir uma música sair de uma vitrola.
— Gosta de Queen, Srta. Morgana? — Era Walker sorrindo e sentado em sua poltrona. Antes que pudesse responder, Ike riu.
— Se gosta? Essa aqui é obcecada.
E eu adorei perceber que ele me conhecia tão bem.
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MORGANA (CONCLUÍDA)
RomanceSerá que um amor duraria uma vida? Morgana tivera a infância muito atordoada. Como seu pai era um diplomata, viveu boa parte da vida se mudando de país e tendo que fazer novas amizades sem ao menos saber a língua. Ao se mudar para Venezuela, Morgan...