Márcio
Eu precisei sair dali antes que me ajoelhasse pedindo seu perdão. Ver as lágrimas que ela derramava por minha causa me feriu muito. Eu me sentia um covarde. Um mostro que destruía quem mais amava. Então eu corri. Corri até que minhas pernas não aguentaram mais e cederam deixando meu corpo ir ao chão. Eu queria respirar, mas não conseguia. Meus pulmões queimavam a procura de ar.
Não sei quanto tempo se passou, só senti as gotas tocando minha pele fria. Era o céu sentindo minha dor. Ele também chorava comigo. Mais uma vez eu me vi perdido. Perdido de mim mesmo. Eu não tinha mais para onde voltar. Nada mais seria meu lar. Meu refúgio. Meu consolo. Meu viver. Sem ela eu era só uma casca vazia. Nada mais fazia sentido. Nada mais tinha cor. Não tinha nada mais capaz de me ferir. Eu estava morto.
Meu celular vibrava incessante em meu bolso. Não me importava saber quem era, porque eu sabia que não era ela. Nunca mais seria.Fechei os olhos tentando buscar sua imagem para mim. Inspirei a procura de seu cheiro. Procurei o silêncio para encontrar sua voz doce. Eram essas lembranças vivas em mim que me fariam continuar até que ela estive a salva do perigo. Por ela eu morreria e mataria se preciso fosse.
Depois de horas vagando sem rumo e sem mais lágrimas eu fui para a casa do meu pai. Precisava me mostrar inteiro para que não desconfiassem. Quando cheguei todos estavam a minha espera. Vesti minha capa da indiferença e me mantive firme.
Rafael: Eu já ia sair a sua procura. - seu tom era preocupado - Alex me contou uma coisa, mas eu não posso acreditar, Márcio.
Márcio: O que é tão difícil assim de acreditar? - minha voz saiu rouca
Alex: Que você foi um otário por agir daquele jeito com a Pérola. - ele veio para cima de mim e Gabriela o segurou - Ela ficou destruída você sabia? Nem quando perdeu os pais de uma só vez eu vi tanto sofrimento em seus olhos.
Márcio: Se candidata ao posto e consola sua amiguinha. - aquilo queimou ao sair. Só de pensar que alguém podia tocá-la era invadido pela ira.
Alex: Você é muito escroto! - cuspiu as palavras e pude sentir seu asco por mim em cada uma delas.
Gabriela: Alex calma!
Rafael: O que realmente aconteceu, Márcio? Esse não é você. Eu sei que não é.
Márcio: O que você sabe de mim?- vi a mágoa nos olhos do meu pai - Não venha bancar o pai amoroso agora. Eu já passei do tempo de acreditar em Papai Noel.
Rafael: Passa pro quarto agora! - ele perdeu o controle. - Espero que você saiba o que está fazendo, Márcio, porque esse caminho que está tomando pode não ter volta. - Passei por eles indo em direção ao quarto com a certeza de que era verdade. Eu poderia ter perdido o meu amor para sempre. - Amanhã você mesmo irá buscar suas coisas na casa dela. Foi homem para agir assim, então será homem para isso - escutei o tom alto de sua voz antes de fechar a porta.
O que ele não sabia era que não se tratava de ser homem ou não. Se tratava de ter forças para não fraquejar diante dela. Ser forte para sufocar esse amor dentro de mim
Pérola
Eu perdi meu chão quando vi Márcio me deixando para trás. Ele me prometeu que nunca me deixaria. Sempre estaria comigo. Maria Alice e Alex me trouxeram para casa, porque eu fiquei sem condições de permanecer naquele lugar. Como seria a minha vida agora sem ele? Quem me acolheria e me faria sentir invencível? Como eu iria sorrir novamente se ele não estava mais aqui para sorrir de volta?
Deitada na nossa cama eu sentia seu cheiro. Pude até sentir suas mãos tocarem meu corpo, porque ele estava marcado em mim. Não ia sair, mesmo que eu tentasse, não sairia. Quando se entrega o coração não tem como pegar de volta e o meu era dele assim como tudo de mim.
Abracei meu corpo, mas não conseguia aquecê-lo. Era frio. Era vazio. Sem cor e sem vida. Mais uma vez eu teria que levantar e dessa vez eu não sabia como. Não tinha porquê. Ele não estava mais aqui. Meu amor se foi sem olhar para trás e não me ensinou a viver sem ele.Márcio não roubou meu amor, ele me ensinou a amar.
Rosália: Pepi. - chegou de mansinho - Eu fiz uma sopinha do jeito que você gosta.
Pérola: Estou sem fome, madrinha. - limpei o rosto - Mesmo assim obrigada.
Rosália: Não fica assim, meu amor. - sentou ao meu lado e eu deitei minha cabela em seu colo. - Foi só uma briguinha de namorados. Você vai ver que já ele aparece aqui pedindo desculpa e fica rudo bem.
Pérola: Ele não vem, madrinha. - senti vontade de chorar de novo - Eu não valho a pena. Sou quebrada.
Rosália: Não diz isso! - falou - Eu não vou deixar que você fale isso de si mesma. Não quando o que vejo na minha frente é uma mulher forte, não uma menina medrosa. Aqui na minha frente, Pérola - ela começou a chorar - Eu vejo uma mulher que lutou para se erguer depois de uma tragédia. Aqui, meu amor, diante de mim eu vejo uma mulher que ama com a intensidade que só tem quem se entrega sem medo. Eu não sei o que levou o Márcio a agir assim, mas eu te garanto que ele te ama. E eu não sei isso porque ele me falou. Eu sei porque nos olhos dele isso é claro como água.
Pérola: Tá doendo tanto... - solucei sem poder conter - Eu não sei se consigo.
Rosália: Consegue sim! - deitou me abraçando. - Consegue porque essa Pérola aqui é mais forte do que qualquer sofrimento. essa Pérola aqui é cheia de amor.E essa Pérola vai estar inteira quando o Márcio voltar, porque eu sei que ele vai voltar.