Passei praticamente uma semana na casa de Tessa. Como prometido, na segunda-feira, fomos até a escola para discutir minha reprovação. Tess esperou no carro enquanto eu entrei sozinha. Um dia antes, ela revirara minhas roupas atrás de algo mais "formal" ou "arrumado", por isso, agora, eu vestia uma calça jeans azul clara não rasgada, mas com a barra dobrada na altura dos tornozelos (que eu nem lembrava que tinha), uma camiseta vermelha básica (que eu não usava há séculos) e o meu tênis all star preto cano alto recém lavado (o que fez parecer magicamente que ele era quase novo).
Além disso, Tessa conseguira fazer minhas olheiras quase desapareceram com melhores noites de sono e maquiagem (após uma quase terceira guerra mundial, uma corrida dentro de seu apartamento e uma negociação, deixara Tess passar um daqueles pós estranhos em mim). Meu cabelo também estava mais controlado hoje, não apenas por eu ter arrumado, mas porque, impressionantemente, ele decidira ficar no lugar.
A escola estava completamente deserta, parecendo completamente errada, como uma máquina quebrada ou algo do tipo. Meus passos ecoavam pelas paredes enquanto eu andava lentamente pelos corredores, deixando todas as lembranças dali me atingirem. Conforme me aproximava da coordenação, ouvia cochichos cada vez mais audíveis, parei em frente a porta de madeira e respirei fundo algumas vezes, tentando me lembrar de todos os pontos que precisava dizer. Finalmente bati e entrei, falando "licença" logo em seguida.
Dei de cara então com toda a parte da coordenação pedagógica ali, o diretor, a orientadora, a coordenadora... Suspeitava que ainda tivessem alguns professores escondidos também, mas preferi não pensar nisso, numa inútil tentativa de não surtar.
- Isabelle! – Foi a orientadora quem quebrou o silêncio. – Estávamos a sua espera, fico muito feliz de vê-la aqui. – Não consegui dizer se ela falava sério, seu tom de voz era sempre empolgado demais, fazendo tudo parecer meio artificial.
- Bom dia. – Ouvi minha própria voz falar. Não parava de batucar os dedos em minha perna, seguindo um mesmo ritmo, me controlava para não ficar encarando a ponta dos meus tênis.
- Bom dia! – A orientadora respondeu com o mesmo tom entusiasmado. – Fique a vontade, sente-se! – Ela apontou para uma das cadeiras envolta da mesa gigante em que eles estavam. – Sua mãe está chegando?
- Ela não vem. – Percebi sua expressão de surpresa antes que ela conseguisse disfarçar, alguns outros presentes desviaram o olhar ou apenas acompanharam a orientadora. – Ela... Ela está viajando a trabalho ainda.
- Oh! Entendo...
- E você está ficando com quem? – Perguntou a coordenadora de repente. – Se me permite perguntar...
- Ninguém. – Respondi com simplicidade. Podia estar passando uns dias na casa de Tessa agora, mas sabia que isso não era o comum. Antes de sairmos, concordáramos de que eu não comentaria sobre o episódio do prédio ou nenhum dos outros durante o ano. Tess insistia em dizer que me abrir com eles era importante para que eles conseguissem entender o meu ano, mas eu acreditava que não era necessário.
- Entendo... E ela viajou muito esse ano, não? – Ela continuou e foi quando eu percebi que eu já estava lutando para não repetir o ano.
- Viajou sim. – Mudava meus braços e minhas mãos de lugar a cada dois segundos, não tinha certeza de onde deixá-los. – Faz parte do emprego dela, - continuei a explicação. – sempre foi assim.
- E com quem você fica?! – A orientadora não conseguiu esconder sua surpresa.
- Sozinha. – Continuei com a mesma simplicidade, não era nada demais.
- E desde de quando é assim? – A coordenadora voltava a comandar a conversa. Ela estava sentada bem de frente para mim, apesar da mesa ser redonda, sentia que não tinha sido sem querer.
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A Anatomia do Cacto
RomanceEm algum cemitério da capital de São Paulo, uma menina despede-se pela última vez de sua melhor amiga, o amor de sua vida. Seu coração está quebrado, vazio. A culpa a consome. Izzy não sabe o que fazer, para onde ir, de repente ela está completament...