Chapter XX

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      Seus olhos fitavam o teto, a detalhada falta de detalhe; a lâmpada no centro e o desenho da centelha de luz em diagonal – tem estado assim há alguns minutos; observando, pensando. Não conseguia dormir, havia um incómodo – talvez por ser um lugar que não tinha costume de estar; por enquanto. Mesmo assim era bom, sentia o frescor, o cheiro delicado e profundo da noite. Podia sentir outro cheiro, superficial, perto de si – perto o bastante – em seu ombro direito. Conseguia ver, mesmo que pouco, Jungkook, deitado ao seu lado, cobrindo, parcialmente seu corpo. O cabelo dele tinha uma essência bela, uma cor pesada, porém, leve ao toque; sua mão descasava sobre o peito de Taehyung, a pele arrepiada pela brisa que percorria o local; suas pernas unidas às deles. Mágico.

      Não pode deixar de notar suas roupas jogadas ao chão - que continuavam nus. Em outra situação, ficaria completamente, tímido; levantaria em súbito e sairia correndo, catando suas coisas. Mesmo sendo sua primeira vez, entretanto, não agora. Sentia-se orgulhoso, de certo modo, que soltava um sorriso ladino, não tímido – proposital. Matutava como vieram parar aqui – será que foi uma boa ideia? – Perguntava-se. Tudo fora muito bom, se negasse, estaria mentindo. Olhava para o lado, Jungkook dormia calmamente; anexo a si; fora, sim, uma boa ideia.

       Mesmo assim, gostaria de ir embora. Infelizmente, para alguns, acreditava que um relacionamento devia coexistir com saudade-ausência. Amamos aquilo que não temos, por isso, ainda o tendo – tendo Jungkook -, precisavam de saudade, de sentir a falta – não se terem por um momento. Estava escuro lá fora, apenas devido à noite, entretanto, não era tarde, nem cedo. Poderia ir; a cidade não dormia. Cuidadosamente, então, se pondo de pé, foi tirando Jungkook, levemente, de cima de si. Fazia um movimento e parava, evitando que o acordasse. Agora, de pé, vestia sua calça, devagar, fazendo o mínimo de barulho com o tecido. Pelo menos, acreditava não estar fazendo som algum. Momentaneamente, fitou o sofá, aquela pessoa sobre ele, seu corpo uniforme, a corpulência intensa ao contato, a respiração pacífica. Gostaria que se visse como eu te vejo – ponderou. Vestiu a blusa e ajoelhou-se, se pôs ao lado dele e beijou-o próximo à testa; um beijo leve, com significado.

       Cogitou, por um instante, cobri-lo; e assim iria. Não poderia esquenta-lo como fazia à instantes. Também, não queria vê-lo doente. Não mais que já estava. Calçaria os tênis quando estivesse prestes a sair, por primazia apenas. Pôs-se de pé, em uma breve, voluntária, respiração; colocou-se à frente com cuidado. Primeiro, a parte da frente do pé e, em seguida, a de trás. Sucessivamente, sem pressa. O chão rangia – quase inaudível -, como madeira em um dia frio, em uma casa antiga esquecida pelo tempo. Afastava-se de Jungkook, fitando-o por cima dos ombros conferindo se ainda dormia. De fato, Taehyung não fazia som algum que incomodasse o sono dele – ou, pelo menos, assim acreditava.

       Imóvel, defronte à porta, lembrou-se da última vez que estivera ali, da última vez que passou por aquela porta; o arrepiar em sua espinha enquanto enfrentava a tensão de algo; algo triste. Engoliu em seco e deitou sua mão à maçaneta, fria como a noite – diria; se pudesse. Julgou gira-la, porém hesitou um momento, conferiu Jungkook por cima dos ombros outra vez. Inerte, ele estava. Um alívio correu por seu peito; era como se fizesse algo proibido, e como tudo proibido, a adrenalina de extrapola-lo é indescritível. Tornou a gira-la, lentamente, por completo. Parou e inspirou. Empurrou-a, contudo, não muito. Pressentia um ar em seu pescoço. Taehyung não se movia, sequer Jungkook.

       Ele havia acordado, permanecia lá e Taehyung sentia-o; poderia ser qualquer um, mas não, a fragrância era inconfundível. Parado, esperando que não ousasse abrir mais a porta, pousou sua mão à maçaneta, acima da de Taehyung e fechou-a. Virando-se, andou até a parede onde o interruptor jazia – perto -; ligando as luzes, Taehyung, à porta, notava-o ainda melhor; nu; dos pés aos fios negros do cabelo, indo de cima à baixo com os passos que dava. Questionava-se sobre o ocorrido – temia que Jungkook não iria tocar no assunto e, decerto, não iria. Não agora. A ideia de ir embora, não o convencia. Não mais.

       Via Jungkook vestir-se do canto do sofá com o cotovelo ao braçal e as mãos ao queixo, acima das roupas que, antes, foram oferecidas à Jimin. Não parecia disposto a continuar acordado, ou feliz por ter sido acordado naquele horário. Ao terminar, deitou-se apoiando sua cabeça nas coxas de Taehyung e, em resposta, Taehyung, levou sua mão, oscilando, aos cabelos que tanto o atraia; movimentos suaves, carícias que eram extintas para Jungkook a muito tempo. Fitavam-se, perfeitamente, buscando o mais profundo que poderiam chegar, o reflexo das estrelas, a tonalidade escura que trazia conforto; Jungkook piscava pausadamente e, como uma pena tocando o solo em uma descida lenta e sutil, o sono caia sobre ele.

       Não por muito tempo, para ser exato. A incessante companhia tocava, gritante para os ouvidos abençoados; Jungkook cerrava a sobrancelha em dúvida, ora, quem poderia ser àquela hora? – Ponderava, entretanto, deduzia uma resposta: Jimin. Ergueu-se olhando direção à porta, observando-a, esperando que o barulho cessasse. Taehyung, confuso, encarava-o e, simultaneamente, o que seus olhos buscavam. Nada cessou; marchou até a porta e a abriu rapidamente, com pressa, como a situação requeria.

       - Por favor! – Era Jimin, devastado, abraçando-se, com uma agonia no rosto e os olhos avermelhados, em choque, mirando o nada. – Meu pai.... Meu pai... – repetia em sua calça suja na parte do joelho. Jungkook não sabia o que fazer, fora chocante para ele também. Taehyung levanta-se e caminhava curiosamente à entrada; não pode conter a surpresa de ver seu amigo, um leve sorriso ao rosto se fez e, célere, se desfez. Vê-lo o arrasou; Jimin apresentava-se companheiro e bem; sempre – arriscaria -, mas o via, de certa forma, melancólico, triste, destruído, perdido, com medo. Já vira algo assim. Jungkook.... De modo repentino, como um blackout, Jimin perde as forças e a consciência por um momento. Desmaiando, tombava-se para frente. Todos os olhos arregalaram-se, Taehyung em especial, ele não continha um contexto; nada, tudo era inesperado. Com reflexos rápidos, Jungkook o segurava, brigando contra seu peso e a atração que o puxava, impiedosamente, para baixo. O trouxe para dentro, deitou-o no sofá com dificuldade; ajoelhando-se próximo; Taehyung fechava a porta fitando os dois; não querendo perder nenhum detalhe do que ocorria.

       - Jimin... – dizia enquanto Taehyung se apoiava na parede, não confiando em suas próprias pernas, afetado pela situação – Jimin...

       - Eu... – Tentava proferir as palavras em um som, quase, inaudível; Jungkook aproximava-se para ouvi-lo melhor – Eu... – repetia - perdi o meu pai.

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