Chapter XXVII

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      Os olhos se abriam lentamente sustentando um insignificante peso de um determinado tempo dormido – a luz, o brilho que cintilava da mobília clara; o reflexo incomodava-o um pouco. Coçava os olhos, deixando uma vermelhidão na parte de baixo, mas sem exageros, acostumando-se e atentou para si. Ele. E, então, para o lado: Taehyung. Mantinha os olhos fechados, o cabelo recaído sobre o travesseiro e uma respiração tranquila, ritmada, evidenciando os movimentos da cintura; tocava-o e – poderia inferir, pois sentia algo mais quente que o próprio cobertor – a perna entrelaçada à sua. Era lindo e calmo – sorrira orgulhoso -, todavia, perigoso como o mar, peculiaridades além do que os olhos e o conhecimento do homem podem enxergar. Sorrira orgulhoso porque ele era seu.

      Movia-se devagar, não querendo acordá-lo, cogitando em ir embora. Deveria? Não havia muito tempo desde que chegou. Saíra do conforto e uma brisa que surgira de lugar algum acariciou sua pele; toda a pele. Arrepiou-se; do pescoço e deixou-a percorrer pelos ombros. Suspirou. Precisava de suas roupas e as buscava com o olhar: as peças espalhadas ao redor da cama, no chão. Seu simples short, amassado, ao pé da cama, prestes a cair o lembrava do momento que o tirou. Fitava a porta abrindo-se e, ponderando parvamente, conseguia vê-los, o passado, em um tom fraco de cor, repetindo os atos que fizeram-lhes chegar no agora. Os toques, a sensação do vício por contato, a velocidade que se beijavam; Taehyung sem blusa, havia a tirado na sala de estar, lindo, deita intensamente Jungkook na cama e... Recolhe seu short e o veste. As bochechas coraram, porém, faria novamente. E de novo. Sua blusa, continuou, onde se encontrava? Não a achou pelo chão, acima da escrivaninha, à cama, sua parte estava vazia. Até que, fitando atentamente, sob o travesseiro de Taehyung, um pedaço da blusa e sua cor gritando sobre o tecido. Aproximou-se, pelo lado, e, novamente, via-os com Taehyung sobre si, as pernas envolvendo-o, o calor do toque, beijando sua barriga e, – admite que ficara nervoso neste momento; a relação com seu corpo era, ainda, algo delicado - ao mesmo tempo, tirando sua camisa por completo, chegando no pescoço e... Preferiu deixá-la, não querendo incomodá-lo. Apontou-se para a porta, todavia, hesitou, curvou-se e entregou um simples beijo à testa do outro; entregou um simples pedaço de si. Rira baixo. Estava bobo. Erguera-se e seguiu.

      Mantinha os passos leves sem se dar conta; era costume. Continuaria despido na parte de cima, não se importaria tão quanto outrora, salvo insignificativas marcas pelo corpo que o lembrava o quão significativas eram. Parou e escorava-se ladino à parede, entre o quarto, entre a sala. – Eu poderia preparar algo – Matutava fitando-o acima do ombro, permutando com a cozinha ao fundo, à esquerda. Foi-se. Encarava, na cozinha, agora, as variadas xícaras de porcelana penduradas e suas diversas cores. Copos, de tamanho, não comuns, diria. Abria a pequena porta lisa abaixo e felicitou-se: comida. Biscoitos – nomeava em som -, café, poucos mantimentos, café – novamente -. Não estranhou ao todo. Taehyung apreciava café, então. Decidiu preparar um pouco. Sentia, porém, algo em sua cintura e recobrou a postura – lento, sabia quem era e, assim, podia fazê-lo.

      Encarava-o e – vestia sua blusa, o tamanho era desproporcional, e conseguia notar suas pernas como se não usasse calças. Adorou, estava lindo - desanimou-se de não ter conseguido completar sua pequena surpresa, um pequeno agrado. Terá outra oportunidade e sabia disso. Atentou-se, pois Taehyung, um semblante avermelhado, sinalizava – o mindinho erguido e os dedos em conjunto sobre o polegar, o movimento da esquerda para a direita -: "Oi". Entendera. Finalmente, o entendera. Abriu um sorriso ladino e, como resposta, obrigou-se a repetir o movimento. Queria participar daquela parte dele. De tudo. Levantou a mão direita e encarava-a - perdido, não admitiria, porém – não sabendo como o fez. Taehyung conseguia notar seu esforço e ficara feliz, achava, porque seu sorriso tomara uma forma quadrangular. Acolheu a mão dele para si e, de forma carinhosa, como um professor guiando uma criança à folha sobre as letras, ajudava-o, os dedos macios, mas o toque firme, fez como fora ensinado e, da sua esquerda para a direita, o fez retrucar: "Oi". Ambos sorriram, o momento era deles. Ambos cogitavam o mesmo: aquilo poderia ir além.

      Jungkook piscava ligeiro e escapava daquilo; pequenez momento; e virou-se para continuar o que começou - em partes -. Novamente, entretanto, fora interrompido por Taehyung em reprovação. Cogitava: por que? O fitou e sua mão – a outra, a que não segurava seu braço, chamando-o a atenção – que apontava para o lado; ao canto da pia, abaixo da madeira que sustentava uma decoração que parecia indecifrável para ele -; uma pequena cafeteira da cor avermelhada e detalhes em tom prata e o café já despejado na pequena jarra e o vapor ascendendo ao teto e desaparecendo. Sentiu-se envergonhado, não em demasia, claro. Apenas não notou. Mas quando aquilo fora preparado? Bom, não importava, achara ótimo já que não saberia fazer nada com aquele eletrodoméstico. Literalmente. Nunca manuseara um. Taehyung pegou o pó de café e o guardou com um sorriso no rosto. Apanhou uma xicara e um copo de tamanho questionável e, o café, despejou sobre eles.

      O outro, conquanto, guiava-se para a sala e assentava-se afrente da mesinha, de alguns papéis. Não tinha permissão para lê-las, era fato, contudo, o título destacado de uma folha abaixo de muitas outras, parcialmente coberta, chamou sua fraca atenção. Lia: "...amento para surdez profunda". Pondo-se afrente, o cenho desconfiado, recolheu-o e permitiu o olhar por todo o papel de maneira rápida: o título: "Procedimento: Tratamento para surdez profunda" – Tae? Disse, preocupado, para si. Mais acima: "Hospital Universitário Central de Londres" – Londres? – Assustou-se. Ao meio, um texto explicativo. Pulou essa parte. Ao final: "Estado: em processo" – Processo? Ficara cabisbaixo – ainda pensava no seu próprio lado, somente -. Não existia palavras descritivas os suficientes para Jungkook, o que sentia – abaixo, "Paciente: Taehyung, Kim" e um espaço para a sua assinatura, ainda em branco. Taehyung caminhava em sua direção, os copos à mão, o sorriso ainda lá. Jungkook o encarava ao longe, o contrato à mão, o semblante abatido, de perda, os olhos marejados, todavia, impedia-se de chorar. Levantou-se, alcançá-lo-ia. Ele parava de caminhar na mesma velocidade que o sorriso do outro desaparecia ao ritmo dos passos. O momento, certamente, ainda era deles. Jungkook cogitava, porém: aquilo viria a acabar? Não tinha mais certeza se haveria outra chance para que lhe preparasse o café ele mesmo.

      Qual reação poderia demostrar? Estava com raiva de saber que ele iria partir, talvez, sem avisá-lo. Ou, apoiaria como qualquer, sensato, casal. A sua permanência estática a sua frente parecia ser suficiente; uma explicação seria. Retornaram para o branquíssimo sofá, Taehyung insistia, de certa forma, para que pegasse a xícara e tomasse o café; aceitou mesmo não sendo apaixonado por aquilo. A explicação fora, lado a lado, dada, pelos mesmos motivos de sempre, de maneira demorada. Todavia, tais motivos podiam vir a acabar. Algo bom; resumidamente. Enquanto pensava, Taehyung recolhia os papéis, amontoando-os ligeiramente, batendo-os à mesa para os organizar e guiou-se para o quarto sem pressa. Ouvia, Jungkook, o som de uma gaveta ruindo sobre as ferragens sendo aberta e, logo após, fechada; ao fundo, a tranca. Os documentos preservados à chave. Estranhou toda aquela calmaria do outro – não se importa? – gostaria de perguntar. Ele não significa o tanto quanto imaginava? Ele não era suficiente? Não merecia ser amado na mesma proporção? A resposta de todos esses questionamentos, em sua mente, era positiva, apenas esforçava-se e, às vezes, o resultado era magnífico; parecia ser amado e estar errado. Essa incerteza que o consumia por dentro. Bufou e teve as mãos de Taehyung sobre sua coxa no mesmo momento; virou, em teimosia, o rosto lentamente e o encontrou sorrindo ladino, simpático, humilde e, sinceramente, aquilo o derretia, mas por que?

      Aproximava-se e deixou um beijo doce, leve e tímido. "Não se preocupe, Kookie" – Taehyung cogitava enquanto afagava seus cabelos. Ele não lia mentes, seria impossível, certamente. Porém, conseguia sentir a calmaria que emanava de Taehyung. A sintonia o trazia de volta, mesmo quando entrava em turbulência. Nunca sentira algo igual, é assim que pessoas apaixonadas se sentem?

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