Chapter XXX

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      Ouvia – constante, as palavras sendo lançadas ao ar; os assuntos que não compreendia; os contextos que não era permitido opinar; tinha de, apenas, estar presente e ser prestativo – escorado à bancada com um pano claro com marcas à mão - atento - e o olhar carregado de cansaço e palidez no rosto, e sua cabeça jogada para trás, encarando o teto. Suga, porém, precisava daquilo. Observava, afrente, as cadeiras desorganizadas – bufou, discretamente – os alimentos intermináveis sobre os pratos, guardanapos ao chão; irritava-se com cada detalhe, mas não podia demostrar, mesmo sendo tratado mal por alguns, novamente, precisava daquilo. Esse é o mal do mundo – acreditava -, permitir-se sofrer para agrado de outros por pedaços de papel no final de certo período.

      Continuava durante as horas, forjando um sorriso e simpatia até que se desfizesse completamente; existia um fator que, ao final de todos os dias, o deixava em paz consigo, confortável. Não era, de modo algum, voltar para o hospital e sustentar a fantasia que criava – aquilo tornou-se impossível. Todavia – dobrava seu uniforme ao fundo, deixando-o no seu armário e vestia-se comumente para ir embora –, tinha a oportunidade de se sentir ele mesmo, agir como quisesse sem repreensão por quaisquer tipos de violência. Sofrera com vários. Passava por todos, à bancada, acenando e assentindo aliviado de poder retira-se daquele local. Seu conhecido – Jungkook – e sua companhia, ainda estavam assentados divertindo-se, aparentemente. Passou por perto e tocou a mesa, apenas. Não fazia questão de uma despedida, até porque não o agradava –, entretanto não gostava de uma falta de afeto, seja ela da intensidade que for. Jungkook surpreendeu-se, no momento, e o seguiu com o olhar, voltando para o caminho pelo que vieram; poderia gritar – não... – não tinha coragem e se tornar o centro da atenção. Sorrira simples, ele era assim mesmo.

      Caminhava lentamente, em direção oposta à sua casa, naquele final de tarde e começo de noite, as mãos dentro dos bolsos da escura calça e a cabeça pendida o chão, mas a linha de pensamento afastada, deliberadamente longe. As folhas dançavam e seguiam seus passos, varrendo o chão e, subitamente; sumiram; trazendo o chão de granito frio que se lembrava com clareza - uma cena; à mente; transluzindo o momento que deixava o posto de saúde, o momento que deixava um capítulo de sua vida para trás. Pisava macio a caminho da porta principal e fitava as horas acima dela; era bem cedo, uma hora perfeita para deitar-se, contudo, fora dito para retirar-se e queria fazer isso o quanto antes. Com seus pertences e os livros às mãos, o peso era notável, alguns que trouxera de sua casa – os seus favoritos e os dela -, a roupa má posicionada ao corpo e os lábios secos, pois sentia sede, porém a pressa o engolia e queria partir.

      Percebia um médico, acompanhado, aproximando-se, defronte, vindo de fora e diminuindo a velocidade do pisar quando seu olhar o encontrou – droga – matutou. Sentiu a necessidade de parar, mesmo não querendo. - Espero que fique bem - disse com um tom baixo. O silêncio se instalou em seguida porque não o conhecia de fato. O médico ouvia, diferente do seu, apenas, boatos de seu estado, todos os médicos, na verdade. Então, era o garoto que todos sabiam sobre, mas sabiam insuficiente; ou nada. E continuava encarando-o sem reação, até encontrar forças e assentir com latência. Era o suficiente. Todos pareciam cansados – e assim estavam -, com poucas horas dormidas e um, excessivo, esforço requerido. O médico, por isso, tocou-o o ombro e sorriu fraco, recebendo, em resposta, outro sorriso fraco; e seguiu seu caminho. Bufou aliviado. A porta parecia distante e seguia um eterno caminho até ela; se tropeçasse e caísse, literalmente, permaneceria no chão.

      Respirou fundo, sentindo a brisa do vasto dia em seu rosto, e, com os olhos fechados, focou no seu próximo passo: casa. Abria-os devagar, ia se acostumando com a luz, com as sensações. Não muito longe, um táxi dava partida, mas não fora isso que chamava sua atenção. Reconhecia a silhueta e as roupas da pessoa que se encontrava na calçada, fitando o carro sumindo ao longe: Jimin. Isso o alegrou de um modo estranho. Ainda mais, quando ele o viu, sorrira com os olhos sendo forçados pela bochecha. Suga engolira em seco. Algo mudava dentro de si à partir daquele momento, talvez, um pouco antes daquilo. Em súbito, pode-se escutar uma buzina alta de um carro e, em consequência, assustando-se, esvaiu-se daquele momento - que não poderia dizer – ainda - se era bom ou ruim; algumas ações do passado são, somente, ditas por acontecimentos futuros. Estava, mais uma vez, andando naquela calçada com as mãos no bolso.

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