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“Você não vai vir jantar?” Gyuri perguntou, assim que abriu a porta do quarto de seus filhos, onde Sooyoung estava sozinha, deitada de barriga para baixo, abraçada em seu travesseiro, em sua cama. Já não chorava mais, mas agora estava com uma horrível dor de cabeça. “Está tudo bem, minha filha?” Ela perguntou, adentrando no quarto.
“Eu só estou com dor de cabeça.” A garota respondeu, e enterrou o rosto no travesseiro, para que sua mãe não notasse seus olhos inchados e vermelhos, de tanto que ela havia chorado por causa de Kahei.
“Eu pedi pizza, vem comer.” Gyuri insistiu, mas a jovem realmente não estava com nenhuma fome e nem mesmo uma pizza seria capaz de mudar isso.
Gyuri abaixou a cabeça, sentindo a terrível dor da culpa lhe corroendo. Foi assim a semana inteira. Ainda estava bastante entristecida consigo mesma por ter perdido a razão e agredido sua filha mais velha de forma violenta.
“Sooyoung, eu queria te pedir perdão.” Aquelas palavras fizeram a garota se surpreender, e olhar repentinamente para a mãe. “Eu não devia ter te agredido daquela maneira. Por favor, me perdoe.”
“Tá tudo bem...” Sooyoung balbuciou, ainda completamente em choque por aquele pedido, que ela jamais imaginou ouvir da boca de Gyuri.
“Não, não está tudo bem.” A mulher a cortou. “Eu sei que cometi muitos erros na minha vida, e boa parte desses erros foram com você e a Hyejoo, mas agora, depois de uma longa conversa com o Donghae, eu decidi que quero ser uma cristã e uma mãe melhor.”
Sooyoung ficou em silêncio por algum tempo, acreditando nas palavras de sua mãe, mas ainda havia algo.
“Se você quer ser uma mãe melhor, deveria começar contando a verdade para mim e Hyejoo.” A garota disse séria, porém, num tom calmo, e Gyuri arqueou uma sobrancelha.
“Do que está falando?” A mulher a questionou.
“Sobre o seu casamento com o reverendo Kim.” Ela respondeu direta, o que deixou Gyuri um pouco desconcertada e se perguntando como Sooyoung havia ficado sabendo daquilo. “O pessoal lá do coral da igreja sabia, mas eu, sua filha, não.”
“Eu tive medo que você e, principalmente Hyejoo, fossem rejeitar essa união. Você sabe, sua irmã ainda não aceitou muito bem a minha separação de Yangnam.” Gyuri se explicou.
“E você acha que esconder isso até quando der é a melhor solução?” Sooyoung perguntou com certa ironia, mas Gyuri apenas abaixou a cabeça. “Bom, metade do trabalho você já evitou, eu descobri pelos outros, mas não deixe o mesmo acontecer com Hyejoo.”
“Você tem toda a razão, Sooyoung. Eu vou falar com a sua irmã.” Gyuri garantiu. “Agora vem jantar?”
Sooyoung abriu um pequeno sorriso e decidiu por seguir a mãe, indo até a cozinha, onde Hyejoo e Chae Won já estavam sentadas frente a frente, esperando pelas outras duas, enquanto conversavam animadamente sobre Free Fire e uns tais de samurais demoníacos, o que, obviamente, chamou a atenção de Gyuri.
“Que coisa é essa que vocês estão falando?” A mulher perguntou, com os olhos arregalados. “Eu não quero ouvir esse nome na minha casa!”
“É sobre o jog...” Chae Won começou.
“É sobre um filme.” Hyejoo cortou a amiga e olhou para a mãe. “Um filme que eu estava alertando a Chae Won a não assistir, justamente por causa desse negócio dem... digo, do ‘D’ lá.” Hyejoo inventou, e sua mentira foi suficiente para enganar Gyuri.
Sooyoung sabia que Free Fire não era um filme e sim um jogo, mas decidiu se manter calada e deixar a irmã sair livre naquela.
Quando Gyuri virou as costas para pegar pratos e talheres, Hyejoo olhou para Chae Won, e sibilou para ela não falar sobre jogos na presença de sua mãe.
Sooyoung abaixou a cabeça e riu baixinho, sentando-se ao lado da caçula.
Sooyoung admitia que era uma mentirosa, mas Hyejoo era bem pior que ela. Mas a verdade é que se o diabo era o pai da mentira, tanto ela quanto sua irmã eram suas filhas.
Os primeiros minutos do jantar foram dominados pelo silêncio, até que Gyuri puxou o delicado assunto.
“Eu tenho algumas coisas pra dizer pra vocês.” Ela começou, e então tirou do bolso de sua calça os celulares de suas filhas que haviam sido confiscados há algum tempo. “Eu vou acabar com esse castigo hoje.”
Hyejoo sorriu animada, pegando de volta seu aparelho, já Sooyoung  apenas conseguia imaginar quantas mensagens não lidas de Kahei haveriam ali, e isso a deixou triste.
“Valeu, mãe.” A mais nova agradeceu e Gyuri abriu um pequeno sorriso, suspirando e pensando em como deveria dar a notícia de seu casamento com Donghae para ela.
“Bom, eu tenho um outro recado. Uma novidade, pra ser mais sincera.” A mulher continuou. “Eu vou me casar com o Donghae.” Ela abriu o jogo.
Hyejoo ficou em silêncio, e após alguns segundos, voltou a comer.
“Você não vai dizer nada?” Gyuri perguntou para a caçula, que deu os ombros.
“E desde quando a minha opinião tem alguma importância nessa casa?” A garota respondeu ácida.
“Eu só quero que você entenda que eu tenho o direito de recomeçar minha vida, assim como o seu pai está fazendo na Espanha...” A mulher começou a argumentar.
“Claro, todo mundo tem o direito de recomeçar.” A garota ironizou, olhando apenas para o seu prato. “Todo mundo.” Frisou antes de olhar para a mãe e sair da mesa.
“Parabéns pelo casamento, dona Gyuri.” Chae Won comentou abrindo um sorriso de canto.
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Sooyoung entrou no quarto, onde Hyejoo estava deitada em sua cama, mexendo em seu celular.
“Falta de educação nem se despedir da sua amiga.” Sooyoung falou, jogando-se em sua cama e tirando o celular do bolso.
“Não torra a minha paciência, não, sua falsa, traidora.” Hyejoo respondeu irritada. “Você já sabia dessa porcaria desse casamento, não é? Por isso ficou com aquela cara de paisagem quando a mãe falou a novidade.”
“Eu descobri por terceiros, o que é muito pior, acredite.” A garota retrucou.
“Ah tá.” A caçula ironizou. “Eu quero que você se foda.”
Sooyoung respirou fundo, tentando manter a calma. Brigar com Hyejoo naquele momento seria tempo mais do que perdido.
Ela pegou o celular, e viu suas mensagens. Além das várias conversas com Kahei, ela também tinha sido posta em um grupo chamada “Banda Sem Nome” por Jin Sol.
A jovem suspirou ao entrar nas mensagens de Kahei e seu coração doeu de vontade de chamar a garota, mas ela precisava ser forte. Ela iria se manter firme, pois se a chinesa quisesse, ela teria que correr atrás de si.
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Os dias que se passaram não fizeram Hyejoo aceitar a ideia do casamento de sua mãe, pelo contrário, ela se distanciou ainda mais de Gyuri e passava todo o tempo jogando em seu celular.
Já Sooyoung continuava a ensaiar com a guitarra, e no grupo da “banda sem nome”, Jin Sol havia pedido sugestões de músicas para o próximo ensaio às outras garotas. Pelas respostas ficava muito fácil de notar que cada uma delas pendia para um estilo diferente de Rock’N’Roll.
Haseul havia sugerido algumas músicas de Rockabilly, estilo muito popular dos anos 50 e 60, dos primórdios do gênero. Jungeun sugeriu algumas músicas de Punk Rock, já Yerim mandou o áudio de uma colaboração entre Slash, Alice Cooper e Nicole Scherzinger chamada “Baby Can't Drive”, a qual Sooyoung ainda não conhecia, mas que tinha guitarras potentes e deveriaser difícil para um caralho de tocar.
“Garota exibida.” Murmurou para si mesma, guardando seu celular e arrumando suas coisas para ir ao ensaio da banda da igreja.
Antes de poder se soltar com sua banda de rock, precisava passar pelo castigo semanal religioso.
Havia usado uma pequena parte do tempo para ensaiar as músicas que Jiwoo havia lhe passado, e bom, perto das músicas de rock que as meninas tocavam, aquilo era mamão com açúcar.
Saiu de casa e seguiu para a igreja, mas foi surpreendida ao ouvir uma buzina, e quando ela se virou para xingar o engraçadinho que havia feito aquilo, engoliu as próprias palavras.
Não era um engraçadinho, mas sim uma engraçadinha conhecida sua: Kahei.
“Ei, vamos conversar?” Ela perguntou e abriu um pequeno sorriso.
“Agora eu tenho ensaio da igreja. Outra hora, Kahei, outra hora.” Sooyoung respondeu seca.
“Eu sei, por isso mesmo que eu vim. Eu te dou uma carona e a gente conversa no caminho.” A chinesa sugeriu.
“Se aqueles santinhos da igreja me veem com você, eu vou ter mais problemas com a minha mãe.” Sooyoung respondeu.
“Eu te deixo uma quadra antes.” Ela respondeu rapidamente. “Por favor, a gente precisa conversar.”
Sooyoung suspirou e revirou os olhos.
“A questão é que eu não tô afim de conversar com você, não entendeu ainda?” A coreana perguntou de forma bastante rude.
“Mas nós somos amigas, e você não pode fugir dessa conversa pra sempre.” Kahei insistiu. “Por favor. Eu até troquei meu horário de serviço pra gente poder conversar.”
Sooyoung cruzou os braços e mordeu o lábio inferior, mas decidiu entrar no carro de Kahei, para assim acabar com aquela insistência chata.
“Me desculpa.” Kahei começou. “Eu nunca quis chatear você, muito menos te magoar.”
“Olha, se você quer sair com a Haseul, tudo bem. Eu fiquei chateada sim, mas já passou, afinal, eu não posso exigir nada de você, não é mesmo?” Sooyoung respondeu completamente irônica.
“Eu sei que eu fui insensível com você te dizendo isso, mas eu não queria deixar que nossa amizade acabar, porque eu gosto tanto de você.” A garota disse, sincera. “Muito mesmo.”
Sooyoung desviou o olhar, e não respondeu nada. Estava com raiva de Kahei, mas ao mesmo tempo, se sentia mal por vê-la naquela situação.
“Você me perdoa?” A chinesa perguntou, após algum tempo de silêncio incômodo.
“Pode me deixar aqui, Kahei.” Ela respondeu, deixando a outra desanimada e fazendo-a suspirar.
“Sooyoung, eu nem estou conseguindo dormir direito.” Kahei desabafou. “Eu só quis que a gente parasse de fazer aquelas coisas pra sua mãe não te bater outra vez.”
Aquelas palavras fizeram Sooyoung olhar para a outra, que parecia bastante chateada.
“Sei que não foi a melhor maneira de resolver isso, mas eu não sabia como te dizer isso e nem queria me afastar totalmente, porque eu gosto de você.” Kahei confessou, e Sooyoung fechou os olhos e colocou as mãos sobre o rosto.
Estava se sentindo péssima e com raiva de si mesma por deixar sua amiga se sentindo culpada pela surra que havia levado de sua mãe.
“Por favor, para esse carro, eu desço aqui mesmo.” Ela pediu, visivelmente abalada e se segurando para não chorar e tornar tudo pior e mais pesado do que já estava. “Eu estou com meu celular de novo, depois eu te mando uma mensagem, tá bom?”
Kahei assentiu e parou o carro na calçada. Sooyoung se despediu rapidamente e desceu do veículos, andando com passos rápidos em direção a maldita igreja.
Sabia que não devia ter falado a verdade para a amiga, pois agora havia a perdido.
“Vida desgraçada!” Falou com ódio e cega pelas lágrimas que encharcavam seus olhos, embaçando sua visão.
No auge de sua emoção e andando sem nem olhar para os lados, ela acabou atravessando sem nem olhar para o semáforo, que estava verde para os carros.
Ela só ouviu um som de pneus cantando por conta de uma freada brusca e buzina, o que a fez paralisar e ver um carro vindo em sua direção.
Nem teve tempo de pensar em nada, só viu a morte diante de seus olhos.







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