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“You are my sunshine, my only sunshine. You make me happy when skies are grey. You´ll never know, dear, how much I love you. Please don´t take my sunshine away.” Sooyoung cantava e tocava na guitarra, essa que era uma das músicas mais conhecidas de Johnny Cash.
“Puta que pariu, Sooyoung, para com isso, porra!” Hyejoo gritou, ao abrir a porta do quarto com uma violência que até assustou a sua irmã mais velha. “Eu não consigo assistir televisão com essa sua cantoria.”
“Eu tô fazendo um trabalho pra escola, dá licença.” Sooyoung respondeu, e dessa vez não era mentira, ela iria mesmo apresentar essa música como parte de um trabalho de inglês.
Era a união do útil ao agradável com fortes pitadas de necessidade. Útil porque a música fazia parte das que seriam tocadas na festa dos avós de Haseul, agradável porque era de um de seus cantores favoritos e a necessidade vinha desse trabalho escolar, que ajudaria a melhorar sua nota na disciplina, mas Sooyoung tinha consciência de que não valeria muita coisa, já que o resto de suas notas estavam mais fundas que um poço de petróleo.
“O que está acontecendo aqui, hein?” Gyuri perguntou, aparecendo na porta do quarto.
“Eu tô tentando fazer meu trabalho de escola aqui, mas a Hyejoo, pra variar, tá dando azia e querendo atrapalhar.” Sooyoung explicou. “Se eu ficar retida, a culpa vai ser dela.”
Hyejoo riu debochada ao ouvir aquilo.
“Eu não tenho culpa se você é burra.” Provocou, cruzando os braços.
“Chega, Hyejoo!” Gyuri ordenou para a garota. “Deixa a Sooyoung em paz.” Completou, para total desgosto da mais nova e um sorrisinho provocador na outra. “Ao invés de ficar enchendo a paciência alheia, venha me ajudar a arrumar as caixas pra fazermos a mudança.”
A garota bufou e fez uma expressão como se tivesse sofrido uma ofensa grave por parte de sua mãe, que ignorou aquela birra e seguiu para o quarto.
Sooyoung, provocativa, piscou para a irmã e fez um “tchauzinho” com a mão esquerda.
“Anda, Hyejoo!” Gyuri gritou do quarto, e a mais jovem fechou a porta do quarto com violência, e revoltada, seguiu para o quarto de sua mãe.
“Engraçado, agora você nem disfarça mais o fato de ter uma filha preferida.” Hyejoo disse provocativa e com um sorriso amargo no rosto.
Gyuri, que estava tirando suas roupas do armário e as colocando em caixas de papelão, parou e encarou a garota ao ouvir aquilo.
“O quê?” Perguntou incrédula, mas não porque não tinha entendido, e sim por não estar acreditando no que acabara de ouvir.
“Antes eu achava que você odiava a mim e Sooyoung na mesma intensidade, mas agora eu vejo essa raiva é maior por mim.” A garota explicou, bastante séria, demonstrando acreditar piamente no que estava falando.
“Não diga besteiras, eu não odeio você nem a sua irmã. É até um pecado você dizer uma coisa dessas.” Gyuri respondeu, apesar de se sentir um pouco culpada pela sua filha se achar odiada.
Sabia que sua agressividade poderia deixar aquela impressão e estava sim, tentando mudar, mas o estresse de toda a situação com Yangnam e a pensão não depositada e a ansiedade pelo casamento, cada vez mais próximo, estavam deixando seus nervos à flor da pele.
Isso sem contar todas as suas obrigações por fora, como organização de uma mudança de casa, que sempre ocasiona grande cansaço físico e mental, e os perrengues do trabalho e das filhas.
Hyejoo manteve o silêncio, mas sabia que estava certa. Por mais que Gyuri negasse, ela sabia que a mãe a odiava. Odiava a garota por odiar Yangnam, e por ele estar longe, Hyejoo era o que tinha de mais próximo dele pra Gyuri poder descontar suas emoções violentas.
“Se você tiver um filho com o reverendo Kim, você vai gostar mais dele do que de mim, não é?” A garota perguntou de forma abrupta, deixando Gyuri desconcertada.
“Eu não pretendo ter mais filhos.” A mulher respondeu seca.
Gyuri era jovem ainda, não tinha nem chegado aos 40, mas não pretendia começar a cuidar de uma criança do zero outra vez, era algo muito trabalhoso e que exigia muito da mulher. Mesmo tendo Donghae ao seu lado, ainda assim, sabia que o trabalho pesado e a responsabilidade maior recairiam sobre ela, a mãe, claro.
E apesar de acreditar que essa criança poderia se tornar um filho diferente das que ela já tinha, pela figura paterna de Donghae ser muito melhor que a de Yangnam, não tinha certeza se aguentaria outro filho lhe dando tanto trabalho quanto Sooyoung e Hyejoo.
“Mas e se você tiver?” A mais jovem insistiu, fazendo a mãe perder totalmente sua paciência e explodir.
“Hyejoo, cala a boca e me ajude com essas roupas, inferno!” Gyuri ordenou, mais firme e impaciente, virando-se para encarar a filha e lhe apontando o indicador da mão direita. “Será possível que você não pode fazer nada sem ficar reclamando e me atormentando? Você gosta de me ver irritada e perdendo a cabeça? Acredite, se eu não gostasse de você, como você está dizendo, eu já teria feito uma besteira bem grande!”
A garota até deu uma murchada, abaixou a cabeça e crispou os lábios, se contendo pra não xingar a mãe, que era o que ela realmente queria fazer naquela hora.
Gyuri podia negar o quanto fosse, Hyejoo sabia que se, caso sua mãe engravidasse de Donghae, esse filho seria muito mais amado e bem tratado do que ela.
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Em seu quarto, Sooyoung deu um tempo da guitarra e começou a falar com Kahei pelo celular, mostrando pra chinesa que ela tinha feito uma playlist de músicas que ela gostaria de compartilhar com Jiwoo.
Recebeu uma montanha de risadas como resposta. Típico.
“Você é muito sapatão mesmo, e tá totalmente pussy whipped por essa garota.” Kahei brincou. “Mas adorei a playlist. As músicas são lindas, e na real, se ela for esperta, vai sacar logo que você tá afim.”
Sooyoung deu um risinho ao ouvir aquele áudio. Não conseguia imaginar como Jiwoo reagiria caso suspeitasse que a rockeira estava começando a nutrir sentimentos românticos por ela.
Sentia um misto de euforia e medo.
Quando beijou Jiwoo pela primeira vez, Sooyoung se lembrava muito bem de toda a aflição que lhe dominou, tamanho era o medo que estava sentindo com a possibilidade de ter sua verdadeira sexualidade exposta. Ela tinha consciência de que não havia nada de errado em ser lésbica, que isso não tinha nada a ver com doença, má educação, desvio de caráter e muito menos com demônios, mas, era provável que ninguém ao seu redor pensaria da mesma maneira.
Apesar desse medo e de todas as consequências que poderia vir a enfrentar caso a verdade viesse à tona, algo dentro de si dizia para ela seguir em frente e tentar se aproximar de forma romântica de Jiwoo, ela só não sabia se esse “algo” era confiável ou se seu instinto de sobrevivência havia entrado em modo suicida.
Outra incógnita que também preenchia essa equação maluca, era que Sooyoung não tinha, de fato, experiência em “chegar” numa menina. A única pessoa que ela tinha ficado era Kahei, que era experiente e desinibida e, por isso, “chegou” nela primeiro.
“Pode até ser, mas a verdade é que eu faço playlist pra tudo, tinha feito uma até pra você.” Confessou, e era fato. Sooyoung era apaixonada por música, e tinha uma série de playlists em seu celular que serviam como uma espécie de trilha sonora pra sua vida. Até pra dormir ela tinha as músicas certas.
Kahei foi a garota que mudou a sua vida e durante um bom tempo ela nutriu uma verdadeira paixonite pela chinesa, portanto, natural que ela recebesse uma playlist de “presente”.
“Sério?” A garota se surpreendeu. “Sooyoung, você é tão fofa, eu juro que tenho vontade de te guardar num potinho e te proteger de tudo de ruim que existe nesse mundo.”
Sooyoung soltou um risinho com aquelas palavras.
“Manda pra eu ouvir.” Kahei pediu, curiosa após aquela confissão surpreendente.
“Já apaguei.” Sooyoung respondeu. “Quando você me trocou pela Haseul, eu fiquei muito puta da vida, e na hora da raiva acabei apagando.” Aquilo era uma mentira deslavada. A playlist ainda existia, mas na hora bateu uma insegurança e ela optou por inventar essa desculpa.
Era melhor deixar isso pra lá, uma vez que elas já tinham decidido manter uma relação apenas na esfera da amizade, sem mais nada romântico ou sexual entre elas, e a tal lista era recheada de músicas com letras melosas e lembranças de noites mais quentes, marcadas por muitos beijos e amassos no banco do carona do Corvette 77 chumbo.
Kahei respondeu com um emoji de choro e outro do coração partido.
“Enfim, você já falou com a sua mãe sobre a festinha na sexta?” Indagou a menina de cabelos coloridos.
“Ainda não.” Sooyoung respondeu. “Minha mãe anda muito ocupada com os negócios do casamento e da nossa mudança, mas amanhã eu falo.” Garantiu. “Mas, não vou dizer que é uma festa, se não ela pode encrencar, mas sim que vamos ver alguns filmes juntas e eu vou dormir aí na sua casa. Ela sempre deixou a Hyejoo dormir na Chae Won, não é justo negar isso pra mim.”
“Então, depois que você falar com ela, me avisa e eu vou aí te buscar.” A mais velha pediu, deixando Sooyoung surpresa.
“Me buscar? Kahei, não precisa. Só me diz algum lugar pra eu te encontrar, que eu vou de metrô mesmo.” Sooyoung disse.
“Nah... eu quero que você venha um pouco mais cedo, porque eu tenho que te mostrar uma coisa antes das outras meninas chegarem.” Ela explicou.
“Que coisa?”
“Surpresa.” Kahei respondeu e depois mandou um emoji piscando. “Agora manda uma música pra Jiwoo, depois printa a reação dela pra eu ver.”
“Pra quê?” Sooyoung perguntou e em seguida enviou um emoji pensativo.
“Eu nunca te falei sobre o meu segundo emprego? Wong Kahei, consultora especialista em assuntos amorosos complicados.” Brincou, fazendo Sooyoung rir.
“Tá bom, eu vou mandar e aí eu faço isso.” A mais jovem respondeu, e então entrou no privado com Jiwoo, que não estava online.
“Tava ouvindo essa música hoje e pensei se você gosta, já que conhece Johnny Cash.” Sooyoung digitou e em seguida enviou “You are my sunshine” para a filha do pastor, com certa ansiedade e esperando pela resposta.
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Jiwoo estava deitada em sua cama, e mesmo sem sono, já estava de pijama e debaixo do grosso edredom. Ainda era cedo, mas ela não estava com ânimo para fazer nada, e então ouviu o toque de mensagem de seu celular, que estava em cima do criado-mudo.
Sentiu até um mal-estar repentino, imaginando que poderia ser uma mensagem de Myungjun, mesmo depois de o garoto já ter falado com ela e lhe dito que havia amado muito aquele encontro, que apesar de curto, foi bastante agradável.
Apesar dessa sensação ruim, ela decidiu dar uma olhada no aparelho e sentiu o coração palpitar ao ver que era uma mensagem de Sooyoung.
Ela engoliu em seco, enquanto seus pensamentos estavam a mil, pensando no que deveria fazer.
Era a primeira prova contra a tentação após a sua decisão de não cair mais em nenhuma armadilha de Satanás.
Aquela foto perfil era tentadora...
Então decidiu que a melhor ação seria ignorar e fingir não ter visto a tal mensagem, e foi isso o que ela fez ao colocar o celular de volta no criado-mudo, sem abrir a mensagem de Sooyoung.
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Sooyoung suspirou frustrada após alguns minutos sem obter qualquer reação da outra jovem.
“E aí?” Kahei perguntou.
“Ela não respondeu ainda.” Sooyoung respondeu. “Talvez ela esteja dormindo.” Sugeriu, apesar de ainda ser relativamente cedo e Jiwoo geralmente estar online naquele horário.
Para se distrair enquanto esperava por aquela resposta, pegou a guitarra e voltou a ensaiar a sua música.

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No dia seguinte, Sooyoung estava tomando café-da-manhã com Gyuri e Hyejoo, ainda sem uma resposta de Jiwoo para a sua mensagem na noite anterior.
“Mãe, posso te pedir uma coisa?” A filha mais velha perguntou, e Gyuri assentiu. “A Kahei me convidou pra ver um filme com ela na sexta, posso?”
“Sooyoung, eu já não expliquei que é pra evitar gastar esse mês? Eu não tenho dinheiro pra você ir no cinema.” Gyuri respondeu séria, mas paciente.
“Mas nós não vamos ao cinema, é pra ver filmes na casa dela, mãe, não vou precisar gastar nem um único won.” A jovem explicou. “E aí, eu também pensei em dormir na casa dela, porque pode ficar tarde pra eu voltar.” Completou, tentando não parecer muito ansiosa, porque apesar de sua família ainda não saber de sua sexualidade, ela se sentia como se todos pensassem que ela tinha segundas intenções.
“Dormir na casa dela?” Gyuri perguntou um tanto surpresa, já que Sooyoung nunca havia dormido fora de casa antes.
“Não tem problema, né? A Hyejoo sempre dormiu na casa da Chae Won e você nunca viu problema nisso.” Sooyoung argumentou, e ao ouvir o nome de sua ex-amiga, Hyejoo fez uma careta de nojo, que no entanto não foi notada por nenhuma das outras mulheres ali.
“Está bem, você pode ir.” Gyuri respondeu e a garota comemorou com um sonoro “yes”. “Mas com algumas condições, a primeira é tirar aquela foto indecente do seu WhatsApp.”
Sooyoung tinha certeza que sua mãe iria implicar com a foto, mas ela tinha gostado da mesma e a colocou, mesmo que fosse para usá-la apenas por algumas horas.
“Tá bom.” Concordou. “E o que mais?”
“Quero que você, e você também, Hyejoo, comecem a arrumar suas roupas e o resto das coisas que vocês têm no quarto em algumas caixas que eu deixei separadas, porque o Donghae vai vir aqui na sexta, e vai aproveitar pra levá-las lá pra casa dele e já dar uma adiantada nisso tudo.”
“Tá, eu faço isso hoje a noite.” Sooyoung respondeu rapidamente.
“Se você fizer, então eu deixo você ir.” Gyuri garantiu, para um grande sorriso nascer em seu rosto.
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Jiwoo prosseguiu não abrindo a mensagem de Sooyoung durante o decorrer do dia, e até evitou pegar muito o celular durante seus momentos livres, para não cair em tentação, já que pra lhe ajudar, naquela tarde iria ter ensaio na igreja e as duas iriam se encontrar.
Na escola, ela tentou evitar o máximo que pôde cruzar tanto com Yeojin e Hyunjin quanto com Myungjun, já que não estava com ânimo o suficiente para encarar as perguntas sobre o encontro das duas primeiras, e nem saberia o que dizer para o rapaz.
Para isso, se refugiou na biblioteca, praticamente escondendo-se na última carteira, atrás de todas as prateleiras do local, e só seria encontrada se a pessoa além de entrar na sala, fosse até o último corredor.
No fundo, sabia que não estava agindo de maneira correta com Myungjun, ainda mais depois dele ser tão gentil com ela, mas, no momento não conseguia pensar em nada diferente para fazer.
Precisava ganhar tempo.
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No pátio da escola, Yeojin e Hyunjin estavam sentadas em uma mesa, lanchando, enquanto a mais velha observava Myungjun a alguns metros de distância, parecendo um tanto aflito, enquanto olhava para vários lados e vez ou outra para a mesa em que ela estava.
Era claro que ele estava procurando por Jiwoo.
“Aquele Kim Myungjun fica olhando pra cá toda hora, já está começando a me incomodar.” Hyunjin reclamou, já que Yeojin estava sentada de frente para ela e de costas para a direção do garoto.
“Isso ele deve tá estranhando esse sumiço da Jiwoo.” Yeojin comentou. “Até eu estou achando, pra falar a verdade. Mandei mensagem pra ela no WhatsApp, mas ela só disse que estava ocupada.”
“Yeojin, às vezes eu fico perplexa em como você é lenta.” Hyunjin disse de forma ríspida, fazendo a outra até se encolher um pouco. “Você não percebeu que ela tá evitando esbarrar naquele garoto? Por qual outro motivo ela sumiria assim?”
Yeojin ficou pensativa por alguns segundos, assimilando as palavras  da sua amiga.
“Falei que não era uma boa ideia ela sair com esse moleque.” Completou com certa amargura e um pouco petulância por pensar que estava com a razão.
“Mas o que você acha que ele pode ter feito de errado?” Yeojin questionou.
“Não faço a menor ideia, mas coisa boa não deve ter sido, senão a Jiwoo não o estaria evitando assim.” Ela respondeu e lançou um olhar nada amigável para Myungjun, que olhava para a mesa, mas ficou tão sem graça, que desviou seus olhos no mesmo instante.
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As horas se passaram e Sooyoung não obteve a resposta que tanto ansiava de Jiwoo, e começou a cogitar a hipótese da filha do pastor estar propositalmente lhe ignorando, já que a garota nunca levou tanto tempo para lhe responder no WhatsApp.
Mas o que levaria a outra menina a fazer isso?
Enfim, de qualquer modo ela ficaria sabendo o motivo desse comportamento, já que encontraria a jovem naquele ensaio da igreja, e foi para lá que seguiu no horário de sempre, mas assim que chegou no local, ficou surpresa ao encontrar as portas fechadas.
Poderia parecer uma coisa besta, mas Jiwoo era sempre a primeira a aparecer nos ensaios, já que era a responsável por abrir as portas da igreja nesses dias.
Mas se Jiwoo não havia chegado, alguns outros membros do grupo já estavam ali, incluindo Hyunjin e Yeojin.
Por educação, Sooyoung cumprimentou a todos de uma certa distância, já que não suportava as garotas, especialmente Hyunjin, e decidiu se sentar no degrau da porta da entrada, mexendo no celular, mas de orelha em pé, tentando ouvir se alguém sabia algo sobre o atraso de Jiwoo.
Enquanto zapeava seu celular desinteressada pela conversa monótona e superficial das duas garotas, Sooyoung se pegou olhando uma foto de Jiwoo no Instagram. Era do dia anterior, com o macacão preto e a sua blusa de lã azul claro, em frente ao espelho de seu guarda-roupa, com um sorriso tímido, mas muito lindo.
Ela ficou olhando meio abobalhada para a foto, antes de dar um coraçãozinho na imagem.
Sooyoung não conseguiu evitar aquele sorriso que nasceu em seus lábios e que fez morder o inferior para tentar disfarçar, enquanto seus olhos estavam fixos no rosto lindo da filha do reverendo, mais especificamente em sua boca.
Queria tanto beijá-la outra vez, mas dessa vez tinha que ser um beijo de verdade.
Quando aconteceu da primeira vez, foi algo de surpresa, impensado e que ocorreu de forma bastante superficial, apenas um leve toque de lábios, mas que foi suficiente para mexer com os sentimentos de Sooyoung, e lhe deixar imaginando como seria um beijo mais intenso, quente, molhado, de língua com Jiwoo.
Seus lábios eram carnudos e macios e a rockeira estava certa de que deveria ser uma sensação maravilhosa. Crispou os próprios lábios e sorriu para si mesma, depois suspirou apaixonada, como qualquer menina boba que fantasia em beijar seu crush.
Sooyoung estava tão distraída, que nem se deu conta de que Hyunjin havia lhe visto fazendo essas expressões abobadas, e com deboche olhou para Yeojin, levantou a mão direita, apontou o indicador na altura de cabeça e começou a girá-lo.
Era o famoso sinal “cuckoo” que era pejorativamemte usado para chamar alguém de maluco.
“Essa garota não bate muito bem da cabeça, não.” Hyunnjin sussurrou e Yeojin apenas assentiu e soltou um risinho maldoso, ao olhar rapidamente para Sooyoung, que continuava distraída com seu celular e completamente alheia aos comentários e olhares julgadores das duas garotas.
Mas aquele assunto logo morreria, porque para a surpresa de todos, Heejin chegou para o ensaio junto de Wonpil.
O casal chegou de mãos dadas e com largos sorrisos, prontos para contar a novidade que já havia ficado clara: eles haviam reatado o seu noivado.
“A Jiwoo não chegou ainda?” Heejin perguntou surpresa.
“Ela disse que se atrasou porque precisou terminar um trabalho pra entregar hoje, mas já está chegando.” Hyunjin respondeu.
“Mas, agora a conta a novidade pra gente.” Yeojin mudou de assunto. Ela amava falar sobre namoros. “Você e o Wonpil reataram finalmente.” Falou tão animada que dava até pulinhos.
“Eu estou tão feliz por vocês, rezei muito pra que isso acontecesse.” Hyunjin comentou também sorrindo.
“Nós resolvemos nos encontrar para conversar, e conversamos bastante, de forma franca, e por fim, conseguimos nos entender e chegar a conclusão de que a gente tava sentindo muito a falta um do outro,  que ainda nos amamos muito e por isso, não havia sentido em continuarmos separados.” A jovem explicou e as duas meninas ouviram com largos sorrisos.
“Ai que lindo.” Yeojin falou com muita afobação. “Que Deus me abençoe e um dia eu possa encontrar um namorado que me ame como o Wonpil ama você.”
Heejin soltou um risinho, achando aquela reação fofa.
“Você também vai encontrar alguém, no momento certo a pessoa especial sempre aparece.” Heejin garantiu para a amiga, segurando em seu ombro.
“É, mas tenho te achado muito saidinha ultimamente, Yeojin, só fala de namorar, só quer saber de garotos, seu pai tá sabendo disso?” Hyunjin falou, em tom reprovador, fazendo a menor mudar sua expressão e seu sorriso desaparecer.
“Hyunjin, o que é isso?” Heejin interviu em defesa da mais jovem. “Isso não é jeito de você falar com a Yeojin, até porque ela não está fazendo nada de errado.”
Hyunjin olhou para Heejin completamente abismada com sua reação.
“Eu só estou zelando pelo bem das minhas amigas.” Hyunjin respondeu cruzando os braços. “Eu não quero que vocês se percam nas armadilhas do mundo e terminem no inferno.”
“Bom, e imagino que você seja a menina incorruptível, escolhida por Deus para proteger todos a sua volta?” Heejin ironizou, fazendo Hyunjin murchar e perder a sua postura confiante. “Se Jesus fosse nascer hoje, capaz de Deus escolher você pra ser a mãe de Seu filho, de tão perfeita que você é.” Concluiu em um tom brincalhão, rindo. Yeojin riu também da piada, mas a garota mais alta ficou desconcertada de início, porém depois fechou ainda mais a cara, demonstrando-se bastante ofendida.
“Olha eu poderia relevar a tentativa de piada comigo, mas essa blasfêmia é difícil de tolerar.” Hyunjin respondeu e saiu de perto das garotas, se isolando há poucos metros.
“Hyunjin, também não precisa ficar assim, era só uma brincadeira.” Heejin falou, tentando jogar panos quentes na situação.
“Pois eu não achei a mínima graça.” Hyunjin respondeu e pegou o celular, passando a ignorar as amigas, que se entreolharam meio culpadas, mas antes que pudessem se desculpar, Jiwoo finalmente chegou, apressada, porque já estava atrasada.
A filha do pastor cumprimentou a todos de forma geral e rápida, evitando olhar diretamente para Sooyoung, que se levantou no mesmo instante que a viu chegar.
Jiwoo abriu a porta da igreja e todos entraram, já arrumando seus instrumentos e tomando suas posições, para começar o ensaio o quanto antes.
E no decorrer da atividade, ficou claro que Jiwoo não estava em seus melhores dias, errando notas e esquecendo as letras de músicas que ela conhecia e tocava há anos. Seu nervosismo e sua postura estavam visíveis para qualquer um, e como não poderia ser diferente, levantando suspeitas entre suas amigas.
Justo depois de seu primeiro encontro com um garoto Jiwoo começou a se comportar de maneira tão estranha e diferente do seu habitual? Estava claro que havia algo de errado acontecendo.
Quanto mais errava, mais nervosa Jiwoo ficava, sabendo que estava deixando claro a inquietação mental que estava vivendo.
Mas não eram só as amigas de Jiwoo quem estavam estranhando aquele comportamento da filha do pastor, Sooyoung também estava notando a diferença abissal no comportamento da garota, afinal, desde que começou a fazer parte daquela chatice de igreja, Jiwoo sempre havia feito de tudo para lhe deixar confortável e fazê-la se sentir entre amigos, mesmo que nenhum dos outros membros fizesse o mesmo, mas naquela tarde, a jovem pianista estava agindo como se Sooyoung não estivesse ali, evitando até mesmo olhar em sua direção e dando para a mais velha a certeza de que sua mensagem na noite anterior estava sendo propositalmente ignorada.
Mas, por quê?
Até sentiu um frio na barriga só de imaginar que pudesse ter feito algo que tivesse magoado a outra sem nem perceber, já que não conseguia pensar em nada para merecer aquele tratamento.
Com esse medo e insegurança, ficou sem nem saber como se aproximar para tentar falar com Jiwoo e, eventualmente, se desculpar por algo que tivesse feito de errado.

Enquanto isso, Jiwoo se preparava mentalmente para a conversa que teria com Sooyoung depois do ensaio.
Tinha em mente que não haveria como ela se afastar totalmente de alguém que em poucos dias estaria morando em sua casa, e pior, dormindo em seu quarto, portanto, precisaria de certa forma fazer com que Sooyoung deixasse de ser um instrumento de Satanás para lhe tentar, e o único jeito para isso acontecer, era aproximando a garota de Deus.
Jiwoo não era boba, ela sabia bem que Sooyoung, e Hyejoo também, não se importavam nem um pouco com os ensinamentos da igreja, e que só frequentavam a comunidade por imposição da mãe. Nenhuma das garotas demonstrava qualquer interesse em conhecer a Palavra ou participar das atividades sobre estudos bíblicos, quem dirá desejo genuíno de se converterem e se batizarem na religião, e provavelmente não absorviam nada dos sermões de Donghae durante os cultos, mas Jiwoo estava disposta a fazer essa situação mudar.
Pelo menos com Sooyoung, que era o seu problema naquele momento.
Jiwoo jamais iria impor qualquer tipo de cura para Sooyoung, para não ofender a menina e também porque ela não acreditava que a homossexualidade fosse uma doença, mas também não havia como saber se Sooyoung era daquele jeito mesmo ou se estava agindo por influências malignas, e se o segundo caso fosse o dela, após o contato com o amor de Deus talvez ela pudesse mudar seu comportamento e ter um estilo de vida mais aceitável, o que seria melhor para todo mundo, até mesmo para a própria Sooyoung, já que evitaria problemas futuros com Gyuri, que como qualquer mãe cristã normal, iria detestar a ideia de ter uma filha desviada nesses termos.
Não achava que Sooyoung era uma pessoa ruim, pelo contrário, ela havia se mostrado ser uma pessoa do bem, e que merecia uma chance de ter uma vida mais correta e sem tantos problemas, se o diabo a estava usando para atormentar a filha do pastor, a culpa era de Jiwoo mesmo, que havia deixado algum desvio seu transparecer, porque diferente do Senhor, o coisa-ruim não é onisciente e não conhece nosso interior e nem sabe os nossos pensamentos, ele apenas toma conhecimento do que fazemos e dizemos, por isso todo o cuidado é pouco, e a vigia deve ser constante, para evitarmos dar munição para o inimigo e acabar numa situação como a que Jiwoo se encontrava naquele momento.
Jiwoo não estava agindo daquela forma por preconceito, se Sooyoung fosse um garoto que estivesse lhe causando as mesmas sensações e lhe fazendo pecar tão gravemente, ela iria ter a mesma atitude, se bem que, era óbvio que se Sooyoung não fosse mulher, elas nunca teriam tanta proximidade, pois era óbvio que Donghae e Gyuri nunca imaginariam esse tipo de coisa acontecendo entre suas filhas. Ninguém imaginaria.
Todo mundo sabe que pessoas homossexuais existem, mas ninguém quer imaginar que seu filho seja uma dessas pessoas, ou que esteja envolvido em situações que estejam ligadas a elas.

Quando aquele ensaio, que pareceu durar uma eternidade, finalmente terminou, Jiwoo fechou seus olhos e pediu a Deus forças para fazer o que deveria sem titubear.
Ela olhou rapidamente para Sooyoung, que guardava seus matérias e a guitarra na capa, e então se levantou do piano, caminhando em sua direção.

Ao notar a aproximação da outra, Sooyoung se recompôs e abriu um pequeno sorriso, com certo alívio, por acreditar que o comportamento estranho e distante da outra não passava de uma neura sua, porém, essa ideia não demorou para cair por terra, já que a filha do pastor manteve a expressão bastante séria e claramente evitava olhar diretamente para ela.
“Nós podemos conversar?” Jiwoo perguntou, sem nem ao menos cumprimentar a outra.
“Claro, aconteceu alguma coisa?” Sooyoung questionou, sentindo-se bastante insegura. “Eu fiz algo de errado?” Completou, não se contendo, pois a postura de Jiwoo parecia lhe dizer isso.
“Não, nada aconteceu não, eu só queria te passar um aviso, bom, dois avisos pra ser mais exata.” Jiwoo respondeu, ainda seria e bastante formal. “ Bom, o primeiro aviso é que a partir dessa semana você vai passar a tocar com a gente nos cultos.”
Sooyoung ficou surpresa ao ouvir aquilo. Bom, a ideia dela entrar no grupo era justamente essa, só que ela estava enrolando o máximo possível pra adiar esse acontecimento.
“Já?” Perguntou, tentando parecer despojada, coçando a cabeça e abrindo um sorriso nervoso.
“Sim, não faz sentido você participar somente dos ensaios, nós precisamos de um guitarrista no culto, essa função é fundamental em qualquer grupo musical.” A garota explicou. “Essas semanas foram um período de adaptação, e pelo que eu vejo, você já se adaptou muito bem, conheceu a maioria das músicas que tocamos e se harmonizou com o resto do grupo.”
“Está certo, é o justo.” Sooyoung concordou, a contragosto, obviamente, e estranhando muito a forma como Jiwoo havia lhe dado aquela notícia.
A religiosa era sempre bastante cuidadosa com as palavras, e não é que ela estivesse sendo grosseira, mas era difícil não perceber que ela não havia perguntado se Sooyoung estava pronta pra isso, ela simplesmente havia lhe imposto aquela novidade.
Podia parecer uma atitude kamikaze trazer para mais perto alguém que estava lhe tentando da maneira como Sooyoung fazia com Jiwoo, mas, era a única forma de fazer com que a garota realmente passasse a trilhar o caminho do Senhor, e na casa de Deus, o diabo não entrava, por isso Jiwoo se sentia um pouco mais segura ali dentro.
“Bom, e o segundo aviso é que pra continuar como parte da banda, você vai precisar fazer algumas atividades a mais aqui na igreja, participar de um grupo de estudos, se converter e se batizar.” Jiwoo completou.
Sooyoung engoliu em seco, e apesar de isso também ser uma coisa clara, ela não queria fazer parte daquilo não. Era um direito seu e não era nenhum crime não acreditar em Deus.
“Espero que isso não seja um problema pra você, porque é necessário que uma pessoa que toca na banda da igreja precisa ser parte da comunidade como um todo.” Jiwoo explicou e Sooyoung apenas assentiu. “Então, até mais.”
A jovem se despediu rapidamente e logo saiu dali, cabisbaixa e sem dar tempo para Sooyoung dizer nada, onde ficou aguardando todos irem embora para poder fechar a igreja e ir pra casa, finalmente ter um pouco de paz após um dia tão cheio.








































































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