Saímos da sorveteria e seguimos até o Foro Itálico. Assim que chegamos à enseada, lembrei de Romeo e do pedido de casamento. Uma dor familiar apertou meu peito e suspirei, tentando conter as lágrimas.
- Você está bem? - Cory perguntou preocupado e apenas confirmei com a cabeça. - Então, vai me dizer o que significa "sempre seria ele"?
- Eu sempre soube que me casaria com ele. Estava prometida praticamente desde que nasci. - Despejo as palavras de uma só vez.
Cory ficou em silêncio, absorvendo as palavras. Depois de alguns minutos, falou:
- E como ele é? - Questionou. - Um velho desdentado e tarado?
Ri do seu comentário. Uma risada leve e sincera, como há muito eu não fazia.
- Non. - Pensei em como explicar a situação de forma resumida. - Eu o conheço desde pequena, crescemos juntos. Nossas famílias são amigas e ele sempre cuidou de mim.
- Pelo menos não ele não era um completo estranho.
- Mas ele mudou muito. E ainda estamos tentando nos adaptar um ao outro.
- Isso é normal. - Cory sorriu e me estendeu a mão.
Sem pensar, estiquei meu braço e entrelacei nossos dedos. O toque de Cory era quente, firme e aconchegante. A aspereza dos calos de sua mão contrastava com a maciez da minha. Caminhamos em silêncio durante um bom tempo, apenas observando as ondas se quebrando na areia. Nos sentamos em um banco e encaramos o oceano escurecer à medida que o sol se punha. Nossas mãos ainda entrelaçadas uma na outra.
- Palermo é uma cidade muito bonita. - Cory comentou depois de um tempo.
- Sì, eu realmente senti falta daqui. - Encarei o oceano. - É sua primeira vez na Sicília?
Cory confirmou com a cabeça.
- Meu primo se mudou a pouco tempo. - Comentou. - Resolvi tirar uns dias de férias e vir visitá-lo.
- Tirou férias e resolveu trabalhar longe de casa? - Brinquei, batendo meu ombro no dele.
- Uma boa oportunidade de divulgar minha música. - Ele deu um sorriso torto e uma piscadinha. - Aliás, você não me falou o que achou do show.
Minhas bochechas provavelmente ficaram vermelhas ao me lembrar da abertura do show. A primeira música que ele tocou na noite anterior foi pra mim. Bem, pelo menos eu acho que foi. Encarei seus olhos verdes e acompanhei seu olhar descer até minha boca. Desviei meus olhos dos seus e fitei as ondas quebrando-se na praia.
- Foi muito bom. - Minha voz saiu baixa. - Você canta muito bem. Mas non consigo identificar seu sotaque. De onde você é?
- Canadá. - Ele suspirou e desviou o olhar de mim.
- E você deixou alguma namorada ou algo do tipo por lá?
Cory riu e balançou a cabeça, ao mesmo momento em que seus ombros ficaram tenso. Percebi que entravámos em um território delicado.
- Na verdade, deixei uma ex-namorada. - Soltou de repente.
- Sinto muito.
- Não sinta. - Ele me encarou, olhando no fundo dos meus olhos. - Ela não era quem eu pensei que fosse e não merece que ninguém sinta pena dela.
Ele soltou minha mão e tirou o boné. O coque se desfez e seus cabelos caíram sobre os ombros. Cory passou a mão neles, bagunçando-os e colocou o boné de volta.
O silêncio que pairou sobre nós dessa vez era pesado. Podíamos ouvir as respirações um do outro, mescladas com o som do mar. Não tínhamos coragem de quebrar aquele momento e retomar a conversa. Apoiei minha cabeça em seu ombro e senti seu perfume. Cory tinha um cheiro fresco e leve, que me lembrava dias ensolarados.
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Despedaçados [COMPLETO] - (Série Vespri Siciliani - LIVRO UM)
Literatura FemininaÉ fato que as pessoas mudam ao decorrer da vida. Mudam de aparência, de gostos, de estilos, de modos. Mudam por fora e por dentro. Mas nem sempre as mudanças são boas. Muitas vezes elas despertam o que há de pior dentro de alguém. Helena DiFontana s...