Quadragésima Sétima Anotação

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Dentre os raros momentos em que nos encontrávamos antigamente, após nos mudarmos para a casa onde dividimos juntos a vida hoje, eu fui "apanhada" por uma criança. Me lembrando bem agora, teria sido uma situação um tanto quanto divertida, mas somente se não tivesse sido tão aterrorizador para ela, afinal, de repente a sua pequena mão se agarrou no decorrer do comprimento da minha saia plissada e lá ficou, como se a sua vida dependesse disso. E dependia para ela.

Ela, uma pequena garotinha de cabelos encaracolados em tons amendoados, infelizmente havia me confundido com a sua mãe, e recusava-se a ter se enganado, com medo de voltar a ficar sozinha novamente.

Quando C finalmente a avistou ao meu lado, me impedindo de me movimentar ao seu lado enquanto estava agarrada a mim como um filhote de gato, ele teve como primeira ação se agachar a sua frente, e quando passou a falar, imediatamente – como se alguém tivesse acionado um tipo de botão em seu corpo – ela passou a chorar. Mesmo que poucas palavras tivessem sido trocadas, mas eu acredito que foram duras o suficiente para fazê-la entender que não éramos os seus pais, e no fundo, eu acreditava que ela já soubesse disso.

Me peguei sorrindo para ele quando se levantou exasperado. Naquele instante, as pessoas olhavam para nós por causa da altura do choro estridente da menina, e foi quando eu a achei parecida comigo.

Sem entender exatamente o porquê, passei uma das mãos sobre o meu cabelo sentindo a presilha que segurava algumas mechas no topo de minhas cabeça, e me lembro de tirá-la de lá, sem saber ao certo o que eu iria fazer com ela, mas perguntei a menina se ela gostava, se era bonita, e cessando um pouco do seu choramingar carregado, ela parou para encarar o objeto em minhas mãos, concordando comigo ainda com os olhos cheios d'água, encarando a presilha decorada com pequenas pedrinhas que brilhavam para ela, atraindo a sua atenção.

Subitamente, e sem encostar por muito tempo em seu cabelo, eu prendi a presilha com rapidez e sorri quando vi que havia ficado uma gracinha nela.

Está linda. Eu elogiei alegremente. Fica bem melhor em você do que em mim, então que tal eu te levar a algum lugar para encontrar a sua mãe e você ficar com a minha presilha como presente por ter sido uma boa garota?

Ela passou uma das mãos sobre a cabeça, encontrando o objeto em seus cabelos, e fungando o nariz, ela assentiu com rapidez, segurando a minha mão quando eu a estendi para ela, e não demorou muito para que a levássemos à administração do local onde estávamos, e minutos mais tarde, quando anunciaram no alto falante o seu nome, a sua mãe apareceu com os olhos marejados e vermelhos a levando embora. Surpreendentemente, ainda me lembro do abraço que recebi como agradecimento, e o motivo do engano. As nossas saias eram realmente parecidas, assim como o comprimento dos nossos cabelos e coloração.

Você sempre foi boa com essas coisas. Comentou C ao sairmos poucos minutos depois.

Com "Coisas", você se refere a crianças? Ele riu.

Por aí.

Me pergunto o porquê, apesar de achar que você já me ensinou algo parecido antes. Houve uma pequena pausa. Eu não aprendi isso com você? "Crianças sempre adoram recompensas". Ele abriu a porta do carro, impressionado.

É mesmo...?

Entrei no carro.

Será que foi com outra pessoa? Ele segurou a porta antes de fechá-la ao meu lado, se colocando no meu campo de visão. O seu olhar sempre me roubava a atenção.

Talvez você somente tenha jeito com crianças. Me peguei sorrindo ao entrelaçar as minhas mãos.

Será?

Bem, vamos ver se um dia terá certeza. Em sequência às suas palavras, a porta foi fechada, e de uma maneira boba, um sorriso ainda continuava em meus lábios.

Srta. A

VERDADE ROUBADAOnde histórias criam vida. Descubra agora