Trigésima Oitava Anotação

73 38 1
                                    

Em meio ao silêncio que preenchia o cômodo escuro, foi quando os seus braços surgiram por detrás das minhas costas. Eles seguiram o caminho por cima de meus ombros até se encontrarem em frente ao meu pescoço. Algo que fez com que uma de minhas mãos os tocassem mesmo que ainda não estivessem fazendo pressão alguma sobre a região. Apenas o simples toque de sua pele contra a minha, já estava fazendo com que aos poucos eu perdesse o ar, mas apesar disso, pela primeira vez, eu não senti medo algum, logo o som de sua voz despertou-me de minha dormência...

"Você não tem medo de morrer...?", perguntou ele, instigado.

Mesmo que eu não pudesse ver o seu rosto, aparentemente ele parecia se divertir com esse tipo de pergunta. Não era a primeira vez que eu a escutava. Na verdade, eu sei perfeitamente que isso passou a ser a sua nova diversão, o seu novo passatempo macabro.

Quando ele inspirou fundo, por um instante cheguei a pensar que eu também havia feito o mesmo, e foi quando pude senti-lo apertar o meu pescoço cada vez mais. Havia uma lentidão familiar em seus movimentos, como se estivesse apreciando cada segundo. Os meus últimos segundos...

Para ser sincera, poucas vezes no decorrer de minha vida me peguei pensando sobre a morte, e nestas poucas vezes, sempre usei metáforas para conseguir entender algo tão complexo envolto em tantos tabus e, que é ao mesmo tempo, tão simples e libertador em certos pontos de vistas e culturas. No final, apesar de ser engraçado me lembrar desta forma, sempre achei que a minha vida não pertencesse somente a mim.

Subitamente senti a cabeceira do sofá pender-se levemente para trás conforme ele começava a exercer mais pressão.

Por algum motivo, posso dizer que não sinto medo da morte, mas tenho medo de desaparecer.

Pelo ritmo de sua respiração, eu podia sentir que ainda continuava estável, calmo, assim como eu...

Eu tenho medo de que as minhas palavras sejam esquecidas, e de que a minha essência pouco cultivada também seja perdida...

"O medo da morte". Acho que é hipocrisia levar isso ao pé da letra, afinal, não temos medo da morte em si, mas sim de...

"Tem medo de não sintam a sua falta...?"

Sim...

"Não. Você está errada, meu amor..."

Agora, eu já não conseguia mais me mover.

"Você tem medo de que eu sinta a sua falta... Afinal, somente eu tenho esse direito, não é...?"

Certa vez eu ouvi que algumas pessoas consideram a morte uma nova forma de liberdade de tudo aquilo que as arrastam para os piores lugares e pesadelos em vida, mas quando eu abri os meus olhos lentamente e não encontrei ninguém além de mim mesma arfando sobre o sofá, eu finalmente entendi que ainda continuo sendo prisioneira de tudo aquilo que tanto me arrastou.

Srta. A

VERDADE ROUBADAOnde histórias criam vida. Descubra agora