Capítulo 21

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Ano de 2005

Felipe
Era minha quarta sessão de quimioterapia e pela primeira vez eu iria sozinho. Porque eu estava sozinho. Meus dois únicos amigos se provaram completos imbecis e minha namorada também. Eu não tinha mais ninguém, o que me levava a pensar se realmente valia a pena continuar nessa quimioterapia, eu simplesmente não tinha mais motivos pra viver. Será que esse é o meu fim? Morrer sozinho? Eu realmente estou tentando resgatar na minha memória algo de tão terrível que eu tenha feito pra eu merecer isso. A frase “Você colhe tudo que planta” é tão errada que nem consigo descrever. Conheço pessoas que sempre foram empáticas, solidárias e amorosas que sofreram nessa vida indescritivelmente mais do que pessoas ignorantes, cruéis e sem compaixão. O que me leva a crer que a vida é extremamente injusta. E não importa o quanto digam sobre lei do retorno e “Aqui se faz, aqui se paga”, é tudo uma grande mentira. Enquanto o Diogo, por exemplo, que trata mal todos a sua volta, trai e bate em sua namorada está aí esbanjando saúde e babaquices, eu estou aqui, literalmente quase morrendo e o pior de tudo, sozinho. E o que eu fiz pra merecer isso? Eu simplesmente não sei!

Fui ao hospital e a primeira coisa que vi foi Elizabeth sentada na sala de espera. Ela olhava distraída para o vai e vem de enfermeiros e médicos por todo canto. Acho que eu tinha esquecido o quão linda ela é. Andei em direção a ela e ao me notar, ela abriu um sorriso.

- Você tá doente ou algo assim? – perguntei.

- Não, eu vim aqui por você. Sabia que hoje seria a sua quarta sessão e não queria te deixar aqui sozinho.

Era bem difícil ficar longe dela enquanto ela fazia esse tipo de coisa pra mim. Eu senti uma vontade quase incontrolável de abraça-la, mas me contive.

- E a Alicia? Conversou com ela sobre... aquilo?

- Sim, eu sentei-me e expliquei toda a situação pra ela. E sabe o que é mais impressionante? Eu conheço você pelo dobro de tempo que conheço a Ali, e diferente de você, ela acreditou em mim. Ela acreditou em cada palavra que saiu da minha boca, e como eu queria que você confiasse em mim tanto quanto ela confia.

Foi como um soco no estômago. Ela não tinha o direito de fazer com que eu seja o vilão da história, os flashes de Elizabeth e Matheus se beijando sempre rodavam pela minha mente. Eu estava convicto do que vi. Ninguém me contou, eu vi com meus próprios olhos eu sendo feito de bobo.

- E o Matheus?

- Sumiu desde o dia que ele saiu da nossa casa. – ela deu ênfase no “nossa”. – Nunca mais o vimos em lugar algum, não deu satisfação pra Ali nem por mensagens.

- Agora eu tenho que ir, eles devem estar me esperando. Pode ir embora, se quiser. – disse e andei em direção a sala que eu sempre ia a cada sessão.

Horas depois quando acordei no quarto, pela primeira vez ela não estava sentada em uma cadeira de plástico próximo a minha cama lendo um livro qualquer. E isso me assustou.

Mas, ao sair da sala, ela estava lá. Ainda na sala de espera, sentada e lendo um livro qualquer. Ela não me deixou sozinho. Fui até ela mais uma vez e disse:

- Estou indo embora. Obrigado por ficar.

- A gente sempre faz uns esforcinhos quando se ama alguém.

Ela abriu um sorriso, levantou-se e foi embora.

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