Ano de 2006
3 MESES DEPOISFelipe
As coisas não estão dando muito certo pra mim, estou no hospital pela terceira vez em duas semanas. O motivo? Meu coração falhando.Felizmente ainda não tive um infarto ou uma parada cardíaca, mas foi por pouco. O cansaço só veio aumentando nos últimos dias e eu tive que parar de trabalhar, fico tonto com muita frequência, náuseas viraram rotina e a dificuldade pra respirar também, meu coração acelera e desacelera com muita facilidade. E agora tenho uma suposição: minha quimioterapia não está dando certo. Isso tudo era o que eu mais temia.
De acordo com a maior parte das crenças, todos nós temos um objetivo aqui na Terra, algo que devemos fazer pra melhorar o mundo ou a vida de alguém. O que eu, aos 22 anos de idade, fiz que foi útil para algo ou alguém? Eu sei que vou morrer. Já estou ciente de tudo. Talvez na vida passada eu fui uma péssima pessoa e agora estou sendo punido. Qual a probabilidade de alguém ter câncer aos 22 anos? Qual a probabilidade de alguém ter câncer no coração aos 22 anos? Qual a probabilidade de alguém ter câncer no coração aos 22 anos e não conseguir resistir?
Hoje pela manhã tive todos os sintomas que citei anteriormente, Elizabeth estava na faculdade e eu sozinho em casa. Com muita dificuldade, consegui ligar pra ambulância e quando eles chegaram eu já estava quase desacordado. Quando cheguei ao hospital, injetaram alguns remédios e eu estou aqui nesse quarto com cheiro de esparadrapo e sangue. Olhando o teto branco, escutando o som do relógio de parede que está quase me fazendo dormir e esperando. Esperando pela Elizabeth, pois pedi para ligarem pra ela quando cheguei aqui, ela deve estar desesperada, por isso pedi pra avisarem que estou estável e consciente. E esperando pelo médico que logo vai aparecer com as atualizações do meu caso. Três meses atrás eu estava bem, não estava curado, mas estava bem. E em menos de quatro meses tudo desandou e saiu dos trilhos.A maioria das pessoas gostaria de comparecer ao próprio enterro, não em carne e osso, mas sim como um fantasma, alma penada ou espírito. Só pra ver a reação dos outros, quem vai sofrer e quem vai sorrir. Mas eu não gostaria de estar lá, porque eu sei quem vai sofrer: minha mãe, Elizabeth, Natália e Alicia. Só. E é por esse motivo que eu não gostaria de comparecer ao meu enterro, porque saber que apenas quatro pessoas sentirão minha falta quando eu partir é doloroso, talvez mais doloroso que a própria morte. O meu objetivo não é fazer as pessoas sofrerem com a minha morte, mas é saber que fiz a diferença na vida de alguém, que fui importante.
Morrer sabendo que não realizei nem um terço dos meus sonhos, que não fiz quase ninguém feliz e que não vivi intensamente é terrível. O problema não é morrer, eu ficaria satisfeito em morrer daqui a 30 anos, com uma família, um diploma pendurado em um quadro da sala e um passaporte cheio de carimbos.
A única coisa que está dando certo pra mim é o meu relacionamento com a Liz. E falando nela...
- Oi, meu dengo. Está bem? Fiquei tão preocupada... – ela sentou-se na cama em que eu estava deitado e me deu um beijo na testa.
- É, estou bem.
- O que tem de tão interessante nesse teto? – ela olhou pro alto e começou a observar. – Você sempre fica olhando pra ele com uma cara de bobo. – dessa vez ela olhou pra mim e sorriu.
- Esse teto me faz pensar nas coisas.
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360 HORAS
RomanceElizabeth e Felipe tinham tudo para dar certo, até que uma doença fatal e minuciosa os ataca quando eles menos esperam. Os dois terão que sobreviver a isso juntos... ou não!