Capítulo 30

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Ano de 2006

Felipe
Chegaram na sala a Doutora Janaína e o Doutor Elias. Nos cumprimentamos e começaram a falar:

- Infelizmente não trazemos boas notícias. – Janaína disse em um tom baixo, mas ainda assim olhava firmemente em meus olhos. – Desde o começo, quando você veio aqui após sofrer um IAM, as chances de sobreviver eram mínimas. E... – ela hesitou. – E a única coisa que a quimioterapia fez foi aumentar seu tempo de vida, ela não te curou e não diminuiu o tumor nem um centímetro sequer.

Elizabeth segurava a minha mão em todo o momento e pude notar que ela tremia. Não queria olhar pra ela pois eu sabia que ela estava chorando e vê-la chorar acabava comigo. No fundo, nós dois sabíamos o que os médicos estavam querendo dizer. Eu vou morrer.

Dessa vez, foi o Doutor Elias quem começou a falar:

- Felipe, o seu tumor é mais forte que a quimioterapia. Por esse motivo, ele cresceu drástica e rapidamente nas últimas semanas. Seu câncer tomou conta do seu esôfago e pulmão esquerdo e é só questão de dias até ele tomar conta de todo o seu corpo. Vai chegar ao ponto em que algum órgão vai falhar e isso não vai demorar muito. É praticamente um milagre seu coração ainda estar batendo.

Elias não demonstrava sentimento nenhum em sua voz, enquanto os olhos de Janaína se enchiam de lágrimas mas ela sempre impedia que elas caíssem.

- Não... Não, mas e se continuar com a quimioterapia? Pode ser que ela pare o câncer por algum tempo como na primeira vez. – Elizabeth falou com a voz trêmula.

- A quimioterapia é inútil agora. Ela não vai fazer a mínima diferença para o câncer nesse momento. – Elias falou duramente.

- Vocês vão fazer o que então? Vão mandar ele pra casa pra morrer? – Elizabeth gritava.

- Nós vamos te dar opções. – Janaína começou a falar olhando pra mim. – Você pode ir pra casa e passar seus últimos dias fazendo o que mais gosta e no conforto do seu lar. Ou você pode ficar aqui no hospital, se você ficar aqui poderá sobreviver por mais tempo do que em casa, mas ainda assim não temos um prognóstico de que vai sobreviver. – ela dizia com a voz mais delicada possível.

Eu estava em negação. Não entrei em desespero, sequer chorei naquele momento. Ou talvez eu já estava ciente de que aquilo iria acontecer.

- Mas ainda tem esperança. Se você receber um transplante cardíaco, as chances de sobreviver saltam pra 60%. Com um coração novo, nós podemos conter e dissecar a massa que está no seu esôfago e pulmão. – Elias falou.

Elizabeth olhou pra mim com o rosto vermelho de tanto chorar, ela soluçava em meio as lágrimas e me perguntou:

- Nós vamos embora? Ou você quer ficar?

Eu não sabia. Estava em um impasse terrível.

- Doutora, o que você faria em meu lugar? – perguntei.

- Sinto muito, mas eu não posso te induzir a escolha nenhuma, sou apenas a sua médica.

- Por favor, me responda. O que você faria em meu lugar?

Ela hesitou por alguns segundos.

- Eu... eu iria pra casa.

- Se eu for pra casa agora, quanto tempo de vida eu tenho? – perguntei.

- Seu caso não é dos melhores, Felipe. Se formos contar a partir da próxima meia noite você teria duas semanas, quinze dias talvez. – Elias respondeu.

Engoli em seco. Quinze dias de vida é tudo que tenho. 360 horas até eu morrer. É tão duro saber que os 22 anos que vivi foi tão pouco e as 360 horas que me restam são menores ainda.

Foi nesse momento que eu desabei, chorei tudo que eu tinha pra chorar. Elizabeth me abraçou e nós dois ficamos chorando por tanto tempo... E nós já tínhamos tão pouco! Janaína e Elias ficaram nos olhando, notamos que eles estavam desconfortáveis com aquela cena.

Janaína saiu da sala e sentou em uma cadeira onde mergulhou o rosto por entre as mãos. Ouvi ela dizendo pro Elias:

- Odeio isso. Sou médica faz tantos anos e ainda não aprendi a lidar com essas coisas. É horrível saber que ele veio até nós para o salvarmos e fomos incapazes de fazer isso. Que tipo de médicos nós somos?

Isso só me fez chorar mais ainda.

‘360 horas’ ecoava pela minha cabeça repetidas vezes.

360 HORASOnde histórias criam vida. Descubra agora