Capítulo Dezessete

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— Escuta essa: "Em Arret todos falam a mesma língua e entendem a mesma escrita, com exceção de Arturos", — Roberta franziu as sobrancelhas e passou os olhos pelo parágrafo que lia, procurando a parte que queria recitar — "Se comunicam psiquicamente", "ver reinos elementais", blá blá blá... Achei! — pigarreou, e sentou-se ereta na cama, continuando com sua fala — "Isso também se aplica a recém-chegados vindos da Terra, que, ao chegarem em Arret, passam a ouvir e a ler toda fala e escrita como se fosse sua língua primária."! É por isso que todo mundo fala português aqui! Todo mundo se entende, é tipo uma Torre de Babel, sei lá.

— Isso é bem útil na verdade. — comentei, enquanto terminava de pentear meus cabelos, encarando Roberta pelo espelho da suíte — Assim eles não tem que aprender uma língua nova sempre que alguém chega da Terra.

Roberta estava jogada na minha cama, lendo e relendo o tal livro de regras que pegara com Theophilus, e de vez em quando citava alguma das regras ou parágrafos pra mim, para que eu também me mantivesse informada sobre esse lugar estranho que se tornou nosso lar temporário.

Quando ela voltou a prestar atenção no livro, encarei meu rosto cansado no espelho, perguntando a mim mesma quando terminaríamos a tal missão (que nem havíamos começado) e voltaríamos pra casa.

Já fazia mais de uma semana que estávamos em Arret, e eu já me arrependia amargamente por todas as vezes que reclamei da vida simples e comum que tinha na Terra, porque, se eu ainda estivesse lá, meu corpo não estaria dolorido como se tivesse sido atropelada por um trem desgovernado. Ficar sentado o dia inteiro numa escola comum pode até ser ruim, mas se exercitar numa escola de soldados é pior. Eu já perdi a conta de quantos roxos ou hematomas eu tinha nos braços e pernas de tanto cair e levar pancada nos treinos com Rodrick, que, aproposito, tinha se tornado um verdadeiro ditador quando o assunto era meu treinamento.

Se eu me atrasasse, tinha que correr vinte voltas pelo prédio como punição, se me adiantasse, tinha que dar vinte voltas pelo prédio como aquecimento. Ele dizia que isso ajudaria no meu condicionamento físico, mas eu sabia que ele só queria rir da minha desgraça.

A vontade de socar aquela cara sarcástica era grande, mas o medo de apanhar quando ele revidasse era maior.

Olhei para Roberta novamente, mas ela continuava lendo o livro de capa avermelhada.

— Você não devia ter devolvido esse livro semana passada? — perguntei.

— Eu devolvi, — respondeu ela, sem tirar os olhos das páginas — mas aí eu peguei de novo depois.

— Ah. — ri, enquanto guardava o pente dentro de uma das gavetas da cômoda, deparando-me com várias roupas novas que Fresia devia ter guardado ali quando eu não estava.

Imaginei que era Dona Alda quem providenciava essas roupas, porque todos os estudantes hospedados no Dormitório usavam peças iguais: camisas simples e sem estampa de tonalidades claras, calças jeans ou shorts e tênis branco. Também haviam algumas saias e vestidos em tons pastéis, que não pretendia usar nem tão cedo.

— Já é 13:15h, vamos almoçar? — perguntou Roberta, guardando seu livro na bolsa tira colo, que parecia ser uma peça padrão entre as bruxas da Academia.

— Pode ser, eu vou ligar pra pedir que tragam alguma coisa. — falei, já indo pegar o discreto telefone na parede, que conectava os quartos com a recepção da pensão.

— Eu quis dizer lá embaixo. — minha amiga revirou os olhos, irritada — No refeitório, igual todo mundo.

Suspirei pesadamente e enganchei o telefone de volta no suporte.

A Escolhida da LuzOnde histórias criam vida. Descubra agora