63 | CLARICE.

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Eu nunca gostei muito do termo "arrependimento", pois sempre achei que tudo que acontecia em nossa vida vinha com algum propósito. Porém, no dia de hoje, tudo o que eu mais queria era me enterrar num buraco e só sair de lá quando esquecesse do meu vexame. Sim, eu sou uma puta hipócrita e se arrependimento matasse, eu estaria caída no chão há tempos.

A cena no qual eu me encontrava era deplorável. Era nove da manhã e eu estava com as meninas na padaria esperando os pães quentinhos saírem. Usava um óculos escuros maior que a minha cabeça por conta dos meus olhos doloridos e vermelhos e sim, tinha saído na rua de pijama. Quem tinha presenciado minha cena de ontem, passava por mim e dava risadas. Não julgo, pois eu faria o mesmo. Me sinto uma adolescente descobrindo bebidas alcoólicas.

— Pelo amor de Deus, fala baixo. Minha cabeça tá explodindo. — Eu gemi após ouvir Marilu e Elisa conversando alto e cruzei os braços. Meu pé se batia contra o chão copiosamente pela impaciência de ter que esperar para ir logo pra casa e não ter que sentir esse sol de quarenta graus queimando meu cérebro.

— Me estressa não, hein. Tu que não soube beber e agora tá toda fodida. — A garota dos cabelos dourados diz e eu levanto meu dedo médio para ela. Seu nariz empina numa cara de deboche e eu agradeço à Deus quando a moça do balcão nos entrega a sacola de pão. Maria pede também uma coca e nós inteiramos para pagar antes de ir embora. A padaria era perto de casa então não nos preocupamos de andar muito. Mas, mesmo o caminho sendo curto, tive que aturar alguns olhares por conta do óculos que eu estava usando e algumas risadinhas. Eu definitivamente virei a piada do circo.

Nós chegamos em casa e começamos à tomar nosso café. Opto por beber algo mais leve e fico com meu suco de abacaxi enquanto as meninas comiam pão com mortadela e coca-cola. Mamãe estava de plantão e eu pedia para Deus pra que dona Eloá não descobrisse do meu PT, pois mesmo agora sendo maior de idade, ela ainda não gostava e provavelmente iria alugar os meus ouvidos o dia inteiro.

Eu pego meu celular e, como de costume, respondi as mensagens de todos e visualizei as de Nathan. Algo me chama atenção. Ele me mandou mensagens ontem à noite normalmente, mas não havia me mandado bom dia ou algum áudio desejando que meu dia fosse ótimo. Dizendo que me amava ou coisas do tipo. E, muitas vezes, ele acorda primeiro que eu. Isso me dá uma sensação ruim.

Será que ele desistiu de me esperar? De ter mensagens não respondidas e insistir em nós? Faz tão pouco tempo. Eu aguardo por ele e, até me arrisco a dizer que estava pronta para termos uma conversa. Ele cansou assim tão rápido?

Eu não queria me encher de paranóias. Isso não faz bem. Mas não dá pra evitar de me auto questionar milhões de coisas.

Eu não quero perde-lo.

— Clarice? — Sou trazida de volta à realidade por Marilu. Eu a olho e tiro meus óculos escuros. Meus olhos ainda doem.

— Sim? Desculpa, estava meio distraída. — Respondo ainda sentindo aquelas borboletas reinarem em meu estômago.

— Vamos pra praia hoje — Ela dá uma mordida em seu pão. — O sol tá rachando e quero pegar uma corzinha. Na verdade, todas nós precisamos.

— Eu também. Saudade de um camarão fritinho da Geiza. — Elisa comenta e Marilu concorda, batendo em sua mão.

— Por mim tudo bem. — Digo desanimada. Minhas amigas me olham confusas.

— Você estaria indo se arrumar agora gritando de felicidade. O que aconteceu? — Maria me questiona preocupada. Sinto o mesmo sentimento no olha de Elisa.

— Não, eu só... — Suspiro e relaxo meus ombros. — O Nathan ainda não me enviou nenhuma mensagem hoje.

— Mas não era isso que você queria? Distância? — Escuto o som da tampa da coca sendo desenroscada e Maria colocando mais do refrigerante em seu copo.

— Não! Quer dizer, sim. Eu não sei. Eu queria um tempo pra pensar. As coisas não se resolvem fácil assim. — Afundo meu rosto na palma das mãos. — Não quero perde-lo, cara.

As meninas puxam minha mão e colocam as suas sobre a minha. Seus dedos acariciam meu dorso e elas me olham com ternura.

— Não vai perder ninguém, amiga. Relaxa. — A dona dos cabelos dourados tenta me tranquilizar e eu mordo meu lábio.

— Eu amo ele. — Os olhos surpresos das meninas me encaram. — É, eu amo muito ele. Sabia que eu nunca tinha dito o dito que o amava? — Sinto meu olhos marejarem e arderem. — Eu fui embora sem dizer que meu coração era inteiro dele. Acho que isso é o que mais me dói.

As duas garotas na minha frente me olham em silêncio. Elas não me respondem e se levantam da mesa, contornando a mesa até chegarem até mim para me envolver num abraço seguro e aconchegante. Eu engulo meu choro, porém não consigo segurar a lágrima solitária que desceu pela minha bochecha. Eu só espero que tudo fique bem. Sei que vai ficar.

— Vai, chega de chororô. Sua cena de ontem já foi demais pra mim. — A fala de Maria me faz rir. Ela seca a trilha molhada que a lágrima fez em meu rosto com o dedo e me olha. — Vai se arrumar. O dia tá lindo, vamos aproveitar. Nem sabemos se poderemos ver esse céu azulzão de novo. Temos que ser gratos pelas pequenas coisas, amiga.

Mordo o interior da minha bochecha e absorvo suas palavras. Ela tem toda a razão. O choro e o sofrimento eu ignorava, e se não tivesse como, deixava pra depois. Preciso viver o agora e me transbordar de gratidão. Minha vida é repleta de coisas boas e eu precisava celebrar isso enquanto podia.

Eu tenho tudo que preciso e sou extremamente grata à isso. Se for pra ser meu, retornará pra mim ou até mesmo nunca iria embora.

•••

continuação no próximo cap :) ❤️

𝐁𝐑𝐀𝐙𝐈𝐋𝐈𝐀𝐍, 𝗺𝗮𝗹𝗼𝗹𝗲𝘆.  ✓Onde histórias criam vida. Descubra agora