Epílogo

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Anahí arrumava os cabelos dando o último toque final na roupa. Um vestido marsala que delineava perfeitamente suas curvas. Hoje com quarenta anos, já se permitia usar o que quisesse sem evitar julgamentos alheios, era segura de si e confiante o suficiente para saber que mesmo com um saco de batatas, ainda assim, estaria irresistível aos olhos de quem gostaria de estar, seu maior e único amor: Poncho.

A noite estava convidativa, as crianças já estavam completamente arrumadas em seus trajes de gala: o pequeno Javi usava um smoking adequado para sua idade que agora era dez anos. As gêmeas usavam vestidos com detalhes em renda, cada um com a cor da sua personalidade: enquanto o de Helena era rosa, o de Luiza era preto, assim como suas unhas estavam pintadas.

Poncho a esperava do lado de fora do quarto, sentado na ante sala da casa nova deles enquanto Chloe, agora com dezessete anos, vinha puxando o namorado Sebastian pela mão.

Anahí se olhou ainda uma última vez no espelho. Se lhe contassem a dez anos atrás que ela estaria indo receber um Harper Avery, o maior prêmio da medicina nos Estados Unidos inteiro, ela jamais acreditaria, mas hoje olhando para si e vendo por tudo que havia passado, superado e vencido, sabia que não havia ninguém que merecesse isso mais do que ela.

- Pronta? - Poncho perguntou, vendo-a do tipo da escada. O celular dela tocou.

- Só um momento, vou pegar meu celular - assim que tomou o visor na mão viu que era do hospital, e para lhe ligarem aquela hora diante das circunstâncias, certamente era importante - Pronto?

- Doutora Herrera, ainda bem que atendeu - Andrew De Luca, um de seus residentes falava desesperado - Esther Padilha está muito mal, precisando de cirurgia urgente. Eu e a Wilson não sabemos mais o que fazer.

- Karev não está por aí? - Anahí pediu visivelmente preocupada.

- Não, ele está em Willows visitando a família, mesmo que eu o chame levaria umas sete horas para chegar. Não queríamos incomodá-la doutora mas está muito difícil controlar as convulsões.

- Certo - ela tentou raciocinar - De Luca, me dê trinta minutos, vá preparando a sala de cirurgia que em trinta minutos os encontro lá.

- Está bem - ele disse desligando.

- Você enlouqueceu? - Alfonso disse, assim que ela lhe contou sua ideia.

- Você vai com as crianças, eu vou até lá, resolvo tudo e encontro-os na cerimônia. Não irá demorar, é apenas uma desobstrução. Vou levar meu vestido e Wilson me ajuda a colocar.

- Annie, isso é insanidade...será que não tem ninguém que possa fazer isso? - a olhou calçar os tênis.

- Não, não tem, e qual seria o sentido de ir até lá receber um prêmio enquanto minha paciente está morrendo por minha negligência? - arqueou uma sobrancelha, selando os lábios dele - Nos vemos lá em uma hora.

E saiu porta a fora carregando o vestido em uma mão e os sapatos na outra. Deixou as coisas de qualquer jeito no banco de trás, depois daria um jeito de desamassar tudo. Assim que chegou a emergência foi recebida com olhares confusos.

- Doutora Herrera? O que faz aqui? Não devia estar na cerimônia de - Anahí a interrompeu.

- Em que sala está o doutor De Luca? - pediu apressada.

- Sala quatro, mas...

Mal conseguiu terminar de falar, Anahí entrou na sala como um furacão, após fazer a assepsia das mãos e vestir a paramentação. De Luca foi logo alcançando o bisturi. Anahí começou uma incisão e seguiu passo a passo o procedimento, a galeria começou a encher de curiosos, depois que o bochicho de que ela havia abandonado a cerimônia para estar ali haviam se espalhado pelo hospital.

- A mamãe tá demorando né? - Helena balançava os pés na cadeira.

- Shiii, quietos, vai começar - Poncho ralhou.

Anahí realmente achava que seria um procedimento simples de meia hora, mas mal podia prever que a situação se agravaria. Além de uma paciente hipotensa, estava brigando com uma hemorragia intestinal que parecia não ter fim.

- Mas que droga - resmungou, jogando as gases sobre o balde de descarte - Consegue ver algo De Luca?

- Acho que estou quase visualizando.

- Pás por favor! - pediu á instrumentista.


- Estamos aqui reunidos para homenagear e premiar a maior referência em medicina do país no ano que está encerrando. O Harper Avery premia e incentiva profissionais que se destacam pelo amor á profissão, pela dedicação ao trabalho, e pela contribuição através de inovação e pesquisa que trazem aos pacientes e hospitais onde atuam.

- Droga Anahí - Poncho resmungou, olhando o relógio. Os filhos já estavam impacientes pela demora da mãe.

- Não é possível - ela murmurou, extremamente irritada, nada parecia fazer cessar aquela hemorragia e pada ajudar, era tanto sangue que ela sequer estava conseguindo ver de onde originava.

- Aqui - De Luca gritou, como se houvesse descoberto água no deserto do Saara - Encontrei. Cautério por favor!

- Neste ano, pelo trabalho desempenhado no New York Hospital, no setor de pediatria e por seu estudo e aplicabilidade incansáveis, que melhoram significativamente a recuperação de jovens e crianças vítimas de câncer infantil, temos a honra de premiar a Doutora Anahí Puente Herrera.

Palmas e mais palmas foram ouvidas, no entanto ninguém subiu ao palco. O refletor pousou pela plateia a procura dela, no entanto só conseguiu localizar Poncho e as crianças, que não sabia o que fazer. Olhou uma última vez para a porta na esperança de vê-la entrar, mas isso não aconteceu, então subiu ao palco receber o prêmio por ela. Não havia outra alternativa.

- Quero que saibam o quanto a Dra Herrera adoraria estar aqui, mas ela não está porque tirou o vestido de gala, a maquiagem estonteante que havia feito e foi até o hospital que ela ama, salvar a vida de uma pequena paciente que estava em perigo.

- Jacson o que faz aqui? - pediu quando já terminava de suturar a menina, que depois de muita luta, estava estabilizada - Que horas são?

- Não da mais tempo - Dr Avery respondeu ligando a televisão do bloco cirúrgico - Deixa que o De Luca termina aqui - o residente apanhou as pinças e agulha da mão dela, tomando o trabalho para si.

Pela televisão ligada, Anahí e todos na sala assistiam ao discurso de Poncho.

- A Dra Herrera e eu passamos por muitas coisas nos últimos anos, e nada disso foi capaz de fazê-la deixar de amar essa profissão, nem eu, afinal, foi graças a ela que nos conhecemos e que hoje temos uma linda família que é a minha vida e mais do que eu poderia pedir - Anahí sorriu emocionada - A Dra Herrera merece muito esse prêmio, por sua incansável trajetória, por seu trabalho impecável, por seu aprimoramento, seu empenho em levar tecnologia, conhecimento e inovação para melhorar a vida de tantas crianças que necessitam de tratamento médico de qualidade. Não sei se pode me ver, ou me ouvir Annie, minha pequena Annie - sorriu, emocionado, e ela sussurrou um "posso ouvir sim" - Saiba que eu e toda nossa família estamos orgulhosos de você, do seu profissionalismo e sua conquista.

Logo infinitas palmas foram ouvidas e não só do salão da cerimônia, também da galeria do bloco cirúrgico que a essa feita já estava lotada. A imagem dela apareceu na tela do evento, vestida de touca, cabelos presos, avental azul, exatamente como ela amava estar. Ali no seu lugar. Anahí sorriu, acenando para a câmera que Jackson apontava para ela, e com a mão no coração e a gratidão também sussurrou.

- Obrigada meu amor. Eu te amo.

Sob a pele do lobo Onde histórias criam vida. Descubra agora