✦Trinta e Três✦

2.3K 292 1.8K
                                    

FELINA

2 horas e 47 minutos restantes.

Meu corpo está implorando por ajuda.

Estou fraca, debilitada e ferida. Obviamente não venho comendo direito nas últimas semanas, já que quase não recebo alimento na cela. Meu rosto está fundo e alguns ossos das minhas costelas estão visíveis, meu corpo está fraco, sem energia e não sei dizer quando quilos emagreci.

Mas, suponho que tenham sido muitos.

A cela é fria, o chão e as paredes são gelados. Quanto mais emagreço, mais difícil fica para conseguir dormir, já que sinto mais frio que o normal pela falta de gordura no meu corpo.

Por um momento, penso em Adora. Na verdade, se eu disser que penso nela só por alguns momentos eu estaria mentindo. Não importa para onde eu olhe, todas as paredes desta cela parecem refletir o rosto dela na minha mente, toda vez que eu escuto alguma voz no corredor tenho esperança de que alguma seja dela.

Sinto falta de tudo, das brincadeiras, das risadas, de quando ela me obrigava a comer toda hora, de ver ela malhando no chão da sala, do sexo, das brigas. Sinto falta dos detalhes do seu rosto, de como ela fecha os olhos quando ri, do seu cabelo loiro com sidecut, do jeito estabanado e de como ela fica vermelha quando eu a elogio.

E, principalmente, sinto falta do seu abraço, do jeito que ela me olhava com seus olhos azuis cheia da malícia de quem parecia me querer para toda a vida.

Todo dia eu penso no mundo lá fora, em como meus amigos e minha família estão agora com toda essa merda acontecendo.

Me pergunto se Adora um dia virá para me buscar.

É um pensamento idiota, eu sei disso, mas tudo que eu posso fazer aqui dentro desse lugar é pensar, e sonhar com um jeito milagroso de sair daqui um dia.

Olho para meu pai deitado no outro lado da cela, encolhido e virado para a parede. Se eu estou mal, ele está cem vezes pior do que eu. Está ferido, desnutrido e cego. Lhe tiraram tudo que podiam e eu tenho medo do que pode acontecer com ele nessa situação precária.

Tenho medo de perdê-lo outra vez, tenho medo de vê-lo morrer.

Sei que na situação em que ele está ele não vai resistir muito tempo, não vai sobreviver. E isso me assusta, muito. Ele já sobreviveu assim por 4 anos e eu sei o quão forte ele é, mas mesmo os mais fortes uma hora desistem de lutar, todo mundo perde as forças em algum momento.

E não seria diferente com ele.

Essa é a maior tortura que eu passo, todo dia. Não é a fome, nem a sede, nem a fraqueza, nem os ferimentos que eu tenho. O que me tortura e me assombra é olhar para o meu pai todo dia e pensar se aquele é o dia em que a vida vai tirá-lo de mim mais uma vez. Todo dia eu tenho medo dele morrer, tenho medo de assistir isso e, pior, de não poder fazer nada para evitar.

Não estou amarrada, mas me sinto como se estivesse.

Os corredores estão mais vazios hoje, não vi muitos guardas e nem mesmo Sombria passou por aqui para encher o meu saco.

Posso estar fraca e mal me aguentando em pé, mas na primeira oportunidade que eu tiver eu acabo com ela, nem que isso me custe o resto da força que tenho.

Meu pai se mexe contra o chão sujo, tateando-o e subindo as mãos para a parede ao seu redor. Não consigo nem imaginar o quão impotente ele se sente. Meu pai que sempre foi um homem da vida, ativo e que vivia na correria, agora sem poder enxergar. Eu não consigo nem chegar perto de sentir o quão doloroso isso deve ser para ele, não poder mais enxergar as pessoas, as cores e o mundo ao seu redor.

Hands All Over | CatradoraOnde histórias criam vida. Descubra agora