✦Vinte e Um✦

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FELINA

Não aguento mais.

Eu sempre soube que a vida universitária seria difícil mas, caralho.

Fiquei até mais tarde hoje na universidade, tentando terminar um dos trabalhos para semana que vem. Por tabela, acabei perdendo a carona de Adora e tendo que voltar para casa a pé.

Juro que estou tentando estudar e ser a aluna que não fui na escola, mas confesso que às vezes tenho vontade de jogar as coisas pro alto e mandar todo mundo se foder.

Principalmente depois que meu pai se foi, eu larguei mão de tudo. Nunca fazia as tarefas da escola e nada do tipo, mas costumava ir bem nas provas, mesmo sem estudar muito pra isso.

Meus passatempos eram pixar os muros e usar drogas no banheiro da escola. Mas, por incrível que pareça, nunca cheguei a repetir de ano e nem a ser expulsa.

Agradeço ao meu tio por ser diretor da escola.

Ele era mais rígido que meu pai, sempre brigava comigo e tentava por juízo na minha cabeça. Mas sei que ele só queria meu bem e que eu tivesse um bom futuro.

Meu tio passou 3 anos no exército. Era alto e sério, um homem de poucas palavras. Parecia mais um guarda roupa do que uma pessoa.

Na frente dos outros, claro.

Me lembro bem de que quando eu era criança, meu tio era completamente bobo e babão comigo. Quando meu pai não estava, era ele que ficava cuidando de mim. Me contava diversas histórias da sua época de militar, me converteu a amante de filmes de ação e me deu minha primeira arma quando fiz 15 anos, pouco antes do meu pai morrer.

Meu pai ficou um pouco puto, mas acabou aceitando.

Ter um pai que trabalhava numa área tão não convencional exigia que eu soubesse me proteger.

Meu pai e meu tio me criaram pra ser forte e independente, me ensinaram a nunca depender de ninguém e a nunca ter medo.

Mas, quando meu pai morreu, eu acabei perdendo dois coelhos numa cajadada só. Aí eu conheci o medo, e a solidão.

Eu perdi um pai, e meu tio perdeu um irmão, a única família que ele tinha. Ele ficou morando na minha casa por um ano e continuou sendo diretor da minha escola nesse tempo, mas se afundou no alcoolismo, na depressão e sumiu no mundo.

Nunca mais o vi.

A dor da perda foi dobrada.

Por ele e pelo meu pai eu segui meu sonho, entrei na faculdade e estou tentando dar um jeito na minha vida.

Claro, até a filha da puta da sombria aparecer.
Quero que essa mulher apodreça.

Aceno para Charles e passo pela portaria, finalmente subindo as escadas em direção ao apartamento. Normalmente eu subiria de elevador, mas Adora vem tanto com esse papo Fitness de usar as escadas que eu acabei me acostumando.

Passo a chave na fechadura e giro a maçaneta, dando um suspiro de alívio ao entrar em casa. Coloco minha mochila em cima do balcão e penduro as chaves ao lado da porta, já indo em direção ao meu quarto para que eu possa deitar e morrer em paz.

Ao me virar, dou de cara com Adora fazendo flexões no chão da sala.

Ela tem mesmo que fazer isso aqui? Não que eu ache ruim, longe de mim.

Ela para seu exercício quando me vê e se levanta.

— Demorou hoje. - ela passa por mim e vai para a cozinha beber um copo de água.

Hands All Over | CatradoraOnde histórias criam vida. Descubra agora