🔸️🔶️Capítulo 14 - Aposta🔶️🔸️

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Estou esperando, guardando meu tempo precioso
Perdendo a luz, sinto falta de como éramos
Antes de descobrirmos nossa verdade tarde demais

Hold Me While You Wait - Lewis Capaldi

Hold Me While You Wait - Lewis Capaldi

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Por algum tempo apenas caminhamos.
O ritmo é lento, e, às vezes, noto o olhar de Mário se voltando para o céu. Está escuro e opaco, mas ainda assim ele não deixa de olhá-lo.
Não deve passar das 9:30 da noite, e a boa iluminação das ruas compensa a ausência da luz da lua, encoberta pela fumaça da noite.
Quando observo as mãos de Mário no bolso da calça jeans, sinto vontade de tocá-las. Grito de vergonha e indignação por dentro, mas ainda assim tenho vontade de entrelaçar meus dedos aos dele, que estão a poucos centímetros das minhas mãos — usadas inutilmente para abraçar meu próprio corpo. Sinto vontade de ter novamente a sensação de confiança que tive da última vez que estávamos de mãos dadas.

— O que acha?

Volto-me para Mário de imediato, saindo de meus devaneios. Ele está apontando para alguma coisa atrás dele, mas não me lembro de ter ouvido ele mencionar algo de antemão.
Balanço a cabeça.

— Perdão, estava distraída. O que disse?

Mário sorri.

— O que acha de comprarmos churros? São mergulhados no chocolate quente. É o melhor do mundo.

Olho para a direção em que Mário aponta, e enxergo uma espécie de barraca do outro lado da rua.
Na realidade, não estou com fome, mas Mário parece empolgado, então cedo. Ele está sendo muito prestativo ao me fazer companhia.

— Parece ótimo — digo, sorrindo.

Assim que a dona da barraca coloca a xícara de chocolate quente em uma de minhas mãos, percebo que tomei a decisão certa.
Mário paga por toda a comida, ignorando meus resmungos por não estar com minha bolsa no momento e minhas promessas de passar para ele a metade do que pagou.

— Considere como um presente adiantado de Natal. — Ele diz, incorrigível em seu cavalheirismo.

Bufo, e caminhamos por um tempo. Procuramos por bancos, mas não encontramos nem um sequer. Mário murmura que o chocolate irá esfriar se não encontrarmos logo um lugar para sentar, então, sem raciocinar direito, aponto para a escada de um dos prédios que nos rodeiam. Mário olha para mim como se eu fosse louca.

— Sua roupa... — ele diz, apontando para o vestido vermelho.

— Não me importo de sujar um pouco o vestido no concreto — as palavras saltam de minha boca, assim como o coração do peito. Preciso me ater a minha respiração para sentir que ainda estou bem quando a onda de nostalgia atinge meu corpo em cheio, se infiltrando por todos os poros. É tão súbita e tão forte que dói.
Não estou mais aqui, mas sim no primeiro encontro oficial que tive com Mário. Posso vê-lo sorrir constrangido ao admitir que a única coisa que podia me oferecer eram hambúrgueres, que sequer tinha dinheiro para pagar uma mesa em um restaurante barato. Ele falou brevemente sobre a falta de dinheiro de sua família, pedindo desculpas, tentando justificar o que não precisava de uma justificativa. E eu sorri, apontei para uma escada exatamente como essa, a quilômetros do lugar em que estamos agora, e disse que nada disso importava. Não era compaixão o que tinha em meu peito ao ouvir a história de Mário, mas o mais puro sentimento de carinho. Nos conhecemos em uma boate muito parecida com a que estávamos nessa mesma noite, tanto eu quanto ele nos sentindo deslocados. Conversamos por muito tempo, mais do que poderíamos naquela noite, e ele me chamou para jantar no dia seguinte. Durante o "jantar", foi incrível perceber que ele valorizava tanto minha presença que, mesmo dada sua situação, não hesitou em me chamar para sair, vestir sua melhor roupa e passar seu melhor perfume — e foi o melhor sanduíche que comi na vida.
Pelo olhar de Mário, sei que ele também está muito longe daqui nesse momento.
Sou a primeira a me encaminhar até a escada, me sentindo tonta. Mário se senta ao meu lado, colocando o pequeno cesto de churros entre nós dois. Pego um deles, mergulho no chocolate quente em minha xícara e simplesmente acabo por me derreter. É umas das melhores coisas que já provei na vida.
Qualquer pessoa sensata ficaria assustada com a quantidade seguida de churros com chocolate que ingeri nos próximos minutos, mas é quase impossível parar. A sensação do chocolate quente em minha boca é tão boa que meus pensamentos nostálgicos são temporariamente afastados.
Apenas quando muito tempo já se passou desde que a avalanche de lembranças abalou tanto a mim quanto a Mário e parecemos estar mais estabilizados é que ele volta a falar, mas tamanha é minha surpresa quando percebo que a intenção dele, aparentemente, é fazer com que uma nova onda desse mesmo sentimento venha à tona.

Lágrimas De Vidro - LIVRO 2 - Duologia Em Busca Da FelicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora