🔹️🔷️Carta 96🔷️🔹️

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2 anos após o fim

Hoje, dois anos após o fim de tudo, eu jantei sozinho em um pequeno restaurante no centro da cidade. Me sentei em uma mesa ao fundo, perto de uma parede de vidro, ao lado de uma mesa onde um casal também jantava com o seu filho.
Pedi bolo de carne. O mesmo prato do nosso primeiro jantar juntos. Eu não tinha dinheiro pra pagar um jantar completo, e nem podia acreditar que você, a mulher mais incrível que já conheci, não se importava com isso.
Nós nos sentamos naquela mesa e comemos aquele bolo de carne horroroso, e você até teve a caridade de dizer que estava bom. O vinho na verdade era suco de uva, e nem de longe as roupas de encontro que estávamos usando correspondiam com aquele ambiente. Mas ainda assim você estava sorrindo, os olhos azuis enrugados no canto de tanto sorrir, e aquilo iluminava o lugar. No momento eu nem notei o quão ridículo aquele jantar foi, o quanto ele não estava ao nível de alguém como você naquela noite. Eu só via você, só sentia você, só queria estar com você. E não conseguia acreditar que aquilo era recíproco.
Nosso primeiro beijo foi só algumas semanas depois, mas foi naquela noite que eu soube que nenhuma outra estaria à sua altura.
Mas eu percebi que você não comeu quase nada, porque estava realmente ruim. Eu não podia fazer muito, mas comprei dois sanduíches para nós quando saímos de lá. Em compensação, foram os melhores sanduíches que comi na vida. No entanto, não havia mesa como no restaurante. Eu me lembro perfeitamente das suas palavras, Passion: "não me importo de sujar um pouco o vestido no concreto."
E você apontou para um pequena escada, na frente de um prédio de dois andares. Era tarde e a rua estava pouco movimentada, mas a sua risada abafava qualquer outro som. Eu não me cansava de olhar você, porque era a coisa mais perfeita que já vi sobre a Terra.
Não tínhamos muito naquela noite, mas tínhamos amor. Porque foi amor, Luna. Foi amor desde a primeira vez que te vi.
Então, enquanto eu comia o bolo de carne (muito melhor do que o que eu pude te oferecer naquela noite), ouvi a voz do casal na mesa ao lado começar a se alterar. Em pouco tempo, eles estavam gritando. Os dois, trocando xingamentos e condenações, enquanto o garotinho parou de comer e passava os olhos de um para o outro, quieto, parecendo acostumado com a situação. Os gritos continuaram e o homem se levantou. Nesse momento o restaurante inteiro já estava olhando para eles. Por fim, o homem proferiu palavras que prefiro não repetir e se retirou do restaurante, deixando a mulher e o filho sozinhos lá. O garotinho começou a passar os olhos pelo estabelecimento, assim como a mãe que tentava se recompor. O silêncio era constrangedor, e os olhinhos castanhos do garoto pararam na mãe. Ela olhou para ele, soltando um ruído fraco e passando a mão pela testa. Estava vermelha de raiva ou vergonha, ou os dois, e apenas sussurrou para o filho "coma, querido".
Os segundos seguintes foram de cochichos abafados e olhares disfarçados para a mulher e seu filho. Voltei para o meu prato, e o acontecimento foi esquecido conforme as pessoas que estavam no restaurante saíam e outras entravam. Mas eu fiquei pensando naquilo por um bom tempo ainda.
Eles tinham um ao outro, tinham um jantar completo e um filho.
Eles tinham tudo, mas não tinham amor. Então não fazia sentido. Eles não viam o quanto aquilo era precioso.
Hoje eu teria condições de te pagar um jantar completo, mas não tenho você. Então não faz sentido.
E foi então que eu pensei em como tudo o que há dentro de mim é amor, passion. Até a dor é por amor.
E em como eu tenho o amor e estou abrindo mão dele por medo e covardia.
Peguei meu carro e saí do restaurante o mais rápido que pude, ciente da minha epifania.
Se há amor, ainda há salvação.
E eu ainda te amo como na primeira vez em que saímos juntos, e ainda desejo ver aquele sorriso em seu rosto. Aquele mesmo sorriso que fez eu me apaixonar por você.
No caminho até a casa dos meus pais, pensei no que devia ter feito a anos atrás.
Posso estar sendo precipitado, sem medir as consequências depois de tanto tempo, mas meu coração palpita como um tambor todas as vezes em que penso nisso.
Eu cheguei em casa, corri atrás de papel e caneta e cá estou eu.
Então hoje, 2 anos após o fim, eu tomei a decisão tardia de ir atrás de você.
Embarco amanhã de volta para Chicago.
E eu não me importo se você estiver com outra pessoa neste exato momento, entregando o seu amor para quem merece. Eu vou me explicar, vou fazer você acreditar, como eu devia ter feito há 2 anos atrás. Não espero o seu perdão ou o seu amor de volta, mas não vou deixar isso inacabado. Eu vou fazer os culpados pagarem. Não posso apagar o tempo em que estive longe, mas irei fazer de tudo para provar que não a traí. Não vou deixar a única esperança de futuro que tenho ser estragada pela minha covardia.
Eu vou dar um sentido à vida que perdi à tempos. E se eu precisar lutar por isso, juro que estou disposto a lutar até meu último suspiro.

Eternamente seu,
Corazón

Lágrimas De Vidro - LIVRO 2 - Duologia Em Busca Da FelicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora