🔸🔶Capítulo 21 - Ladeira abaixo🔶🔸

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Oh pai, me diga
Nós realmente recebemos o que merecemos?

Way Down We Go - Kaleo

É estranho pensar que há apenas algumas horas eu estava em um dos estados mais extasiantes existentes.
Agora, o medo se acumula, traiçoeiro, em meu interior.
Mário parece ter saído de um pesadelo pra entrar em outro apenas alguns minutos depois, mas sei disso por poder sentir sua tensão ao meu lado, não por qualquer sinal realmente visível em seu corpo. Ele não ultrapassa a velocidade máxima, tampouco a mínima. Não está apressado nem receoso. Na verdade, tenta não transparecer. Suas mãos estão firmes no volante, seus olhos, na estrada.
Toco sua perna e a acaricio com o polegar, mas minha mão está tão fria que, mesmo sobre sua calça jeans, duvido que meu toque possa ser muito reconfortante.
Tudo em mim está gelado e trêmulo. Não saber o que esperar é um tormento.
Mário não olha para mim. Continua dirigindo.

O telefone de Isabela estava desligado. Deixei um recado em sua caixa postal a alguns minutos, informando o que está acontecendo e, de antemão, pedindo para que fique calma. Conhecendo-a como conheço, apenas espero que não destrua a casa com sua ansiedade.

Quando chegamos à casa de Elijah, desço do carro e o espero na calçada. Mário demora pelo menos dois minutos para aparecer ao meu lado.
Ele toca minha mão.

— Não importa — murmura.

Sou obrigada a engolir em seco. Aperto sua mão com força.
Não importa o que acontecer... Temos um ao outro agora. Tenho Isabela. Tenho Beatrice. Tenho Nana e pessoas com quem posso contar. Temos em quem nos apoiar. E, independentemente de tudo, temos uma base.
Nem tudo é incerto.

Apertando a mão de Mário tão forte que duvido que não doa, dou o primeiro passo para a casa.
Elijah nos atende na primeira batida.
O lugar é exatamente como eu me lembrava. A sala é espaçosa, alta, mas os tons quentes nunca me pareceram tão frios como agora.
Ao contrário da primeira vez, não me mantenho alheia às palavras de Mário e Elijah.
Nos sentamos no mesmo sofá marsala, e Elijah, dessa vez, em uma espaçosa poltrona na mesma cor.

— Estamos... Tensos — Mário murmura, apertando nossas mãos que permanecem grudadas; Elijah olha de relance para nossos dedos entrelaçados, mas não se atém muito — Apenas... Despeje tudo de uma vez. Acho que dessa forma é mais fácil.

Aperto a mão de Mário ao mesmo tempo em que balanço a cabeça. Sinto como se nossos corações estivessem ligados; tudo o que sinto e preciso, ele também sente e precisa.
Elijah afirma, colocando seu tronco para frente ao mesmo tempo em que apoia os cotovelos nas duas pernas. Sua testa se enruga mais a cada segundo, e meu coração varia entre um batimento retardado e outro acelerado.

— O nome dela é Mariah Sputinik Ferrero. O pai tinha descendência russa — ele dá de ombros — Ela mora em Evanston. Fica a pouco mais de 1 hora daqui, como devem saber. Aqui está o endereço... — Elijah deposita um papel na mesa entre nós; é Mário quem estende a mão para pegá-lo — 39 anos. Conseguiu o diploma do ensino médio há apenas 9 anos. Teve 2 filhos, um morreu com apenas 6 anos por um acidente de carro há pouco mais de 2 anos e o outro tem 3 anos e vive com ela. Nenhum é registrado em nome do pai e ela nunca se casou. Trabalha como camareira em um dos hotéis da cidade por meio período. O menino tem câncer, — posso ouvir o baque do meu coração contra os ossos da caixa torácica — faz tratamento em um hospital pediátrico aqui em Chicago, especializado em leucemias do tipo dele, mas atualmente não está internado... Parece que descobriram a doença precocemente. E temos algumas fotos. A rotina dela não é muito agitada. Ela basicamente trabalha das 6 às 11 da manhã, período em que a criança fica em uma creche, e depois volta para casa. Fora desse horário, ela não saiu em nenhum momento durante os 2 dias em que ficamos a monitorando para termos certeza de que realmente se tratava da tal Katherine — Elijah estende agora uma pequena pilha de papéis, os quais seguro com minhas mãos trêmulas enquanto Mário ainda encara o endereço em sua mão.

Lágrimas De Vidro - LIVRO 2 - Duologia Em Busca Da FelicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora