now i'm in exile, seeing you out

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Ela estava resiliente. Seu vestido era rosa bebê e combinava com as luvas brancas que iam da ponta dos dedos até o antebraço. Seus passos eram silenciados pelos aplausos, mas a visão de seu sorriso era bem nítida até mesmo para um rapaz que sentava no fundo da plateia. Como ela poderia estar tão bem?

– Obrigado pela sua ilustre presença, madame Harkness – O apresentador diz beijando a mão dela e recebe de volta um sorriso ilustre junto de uma jogada de cabelos da milionária.

– Eu quem agradeço, monsieur – Sua voz é nítida e captada pelo microfone. Ela falava muito bem francês, talvez fosse isso que ele ainda se lembrasse da época de escola – É uma honra estar aqui hoje, Paris! A Harkness Ballet, como muitos de vocês já sabem, está em sua reta final de turnês e que lugar melhor para encerrarmos uma era senão a cidade dos amantes?

James estava imóvel, era realmente ela, em carne e osso. Ela não o veria no meio da multidão, claro, ainda mais por ele estar afundado na poltrona tal como seus dedos estavam afundados no braço do acento. Mas tinha alguém ao seu lado que o via e sentia a verdade transparecer sob seus olhos, a verdade de alguém que recusou tanto o passado que agora não sabia lidar com ele diante de seus olhos.

– Quero que todos vocês saibam que foi uma experiência mágica trabalhar com cada um de vocês e conhecer suas histórias, suas lutas... Vocês são motivo de orgulho, não só para mim, mas para o mundo! – Ela diz e recebe centenas de aplausos da multidão, exceto de 2% dessa plateia.

– J-James...

A mulher chamava o homem que ainda estava em choque com a visão de Betty, ou melhor, Rebekah Harkness, mas ele não responde, ou demonstra outra emoção que pudesse ser captada sem parecer que ele ainda tinha memórias e ele se lembrava de tudo muito bem e isso doía nela como mil cortes.

– Todos os lucros dessa turnê serão direcionados para a nossa nova companhia, a Harkness Foundation. Visamos expandir os grupos de dança e descentralizar o monopólio da indústria, queremos financiar novos artistas e novas iniciativas por que sabemos como a arte deve ser importante para nós e para muitos de vocês – Ela dizia com um tom de empoderamento e determinação que James nunca antes havia visto, isso era fazer ele se sentir menor que um palito de dentes e tão frágil quanto um.

O discurso dela não é longo, após uma declaração de apoio as inciativas musicais e a expansão da diversidade na indústria, Rebekah dirige-se para fora do palco com sua equipe junto de um "merci beaucoup" para a plateia. As pessoas saem do Teatro comentando sobre suas vidas novamente e algumas sobre como adoraram o show, mas isso é tão breve quanto sair da sala de um cinema e esquecer-se da cena final. Era de fato um evento marcante e esplendoroso, mas não que marcaria a vida da plateia de forma significativa. Pelo menos, não de toda ela.

– Senhor? – O segurança do Teatro diz tocando no ombro de James e o acordando de certo transe em que ele estava, todo o local estava vazio e só tinham eles dois – O espetáculo acabou, precisa se retirar por favor.

James não questiona nada nem sequer tenta. Ele levanta devagar e franze o olhar, virando-se para o lado procurando por alguém ele percebe que ela já não estava mais lá. Não mais. O segurança reforça o pedido de saída dele e ele atende dessa vez, deixando o Teatro, mas não a memória que o mesmo o fez ter após anos.

Andando pela neve cruel e intensa, ele tenta refazer os passos para descobrir onde é sua casa, mas a única coisa que ecoa na sua mente eram as vozes. Todas elas gritavam, o chamavam de volta para um ciclo sem fim e que ele percebe que nunca saiu deste ciclo. As vozes iam além daquelas do passando, sendo agora as do presente, de pessoas que cochichavam no Teatro coisas como "soube que ela está no terceiro casamento, essa mulher é uma insana! Deve ter uma longa lista de exs que dizem isso" ou "provavelmente ela vai fazer topless no final desse discurso, ela é a mulher mais sem vergonha que já vi".

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