1 - O pequeno milagre!

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Marina voltou exausta do seu plantão no hospital e encontrou Lucas e Kelly na cozinha, tomando o café da manhã. Marina acariciou os cabelos de Lucas, e lhe deu um beijo no rosto.
– Bom dia, meu amor! Ainda em casa? Pensei que saísse às seis e meia! Por que se atrasou tanto hoje?

Kelly que só observava tudo até aquele momento, interveio.

– Eu avisei que ele ia se atrasar, mas ele quis te esperar... foi mais um daqueles sonhos.

Marina olhou para o garoto franzino à sua frente e sentiu um aperto no peito. Cada vez que Lucas tinha um sonho, a vida deles mudava drasticamente.

– Quer falar sobre isso, querido?

–  Não mãe! – Lucas exclamou apressado, engolindo um pedaço de pão com o resto do leite da caneca – Tenho que sair correndo porque já estou muito atrasado.

– Quer faltar na escola hoje!? Assim você me conta o que andou sonhando...

Lucas sorriu em concordância, mas com o olhar, deixou bem claro que não ia falar nada por enquanto. Marina já sabia que seria muito difícil arrancar algo dele. Mas ao contrário das outras vezes, dessa vez parecia um sonho bom.

***

Seu pequeno milagre! Era assim que ela o chamava e a cada dia se convencia mais disso...

Tudo começou quando voltou do naufrágio e seu passado desabou sobre ela. Sua tia tentando abortar o que ela chamava de aberração, o suicídio do pai de seu filho, a fuga e as humilhações que sofreu... Marina saiu no mundo sem eira, nem beira, abandonada por todos, com um filho no ventre. Viajou de carona, tomando o máximo de distância da cidade onde sofreu tantas desilusões, e pra onde jurou nunca mais voltar.

Kelly, sua inseparável amiga, veio para a capital uns meses antes, para cuidar da avó, e nem soube tudo pelo que Marina passou depois do casamento de Fernando... estava chateada pelo sumiço  da amiga, achando que tinha sido esquecida, até que Marina a procurou, com todas aquelas novidades.

Kelly estava estupefata com a história de Marina, e com a surpreendente mudança da amiga.

Dona Carmelita, avó de Kelly, recebeu Marina como uma filha e se tomou de simpatia por ela à primeira vista.

Carmelita e Kelly moravam numa casinha minúscula de quarto e cozinha, e quando Marina viu a casa, lembrou-se que só seu quarto, na mansão de madame Esmeralda era maior que aquela casa, mas estava feliz, e achava que aquele era o melhor lugar do mundo, pois era o lugar onde seu bebê cresceria cercado de amor.

Marina sofreu um princípio de aborto, mas tudo se resolveu com alguns dias de repouso no hospital. Marina agarrava-se à vida de seu filho como a última lembrança de seu grande amor, mas o medo de gerar um bebê anormal, minava-lhe as forças.

O médico lhe garantiu que o bebê estava bem e saudável, mas ao saber do caso delicado de Marina, e da co-sanguinidade dos pais do bebê, o doutor pediu todos os exames necessários pra detectar uma possível mutação genética, e acompanhou passo a passo cada mês de gestação.

Os ultrassons deram resultados muito positivos, o bebê desenvolvia braços e pernas, não tinha hidrocefalia, nem microcefalia, seus batimentos cardíacos eram normais, e a única complicação era uma placenta prévia que obrigou Marina a manter repouso absoluto.

Só não se sabia se ele sofreria alguma mutação cromossômica, o que se resolveria com uma amniocentese, mas estava fora de cogitação, por causa da fragilidade da gestação. O exame era muito invasivo, e colocaria em risco a gravidez. O doutor sugeriu que Marina poderia recorrer ao aborto a qualquer momento, se assim desejasse, mas Marina foi irredutível.

caleidoscópio 2 - a outra face.Onde histórias criam vida. Descubra agora