Essa com certeza é uma das noites mais frias do ano até agora, e aposto que, se ninguém tivesse arremessado uma granada no meu peito e mandado minha história de amor pelos ares, eu estaria aconchegada ao meu marido no sofá tomando um chá mais quente que um bom beijo ou poderíamos estar ocupados transando loucamente como dois animais selvagens no tapete felpudo em frente à sua lareira. Mas, em vez disso, estou quase me transformando em um picolé sabor desilusão, me segurando para não chorar e apertando o passo para me esquentar.
Literalmente agarrada na Charlote, não resisti em trazê-la para a frente do corpo só para ter a quem abraçar. Não me julgue. Char não me abandonou um dia sequer desde que eu a comprei com a minha primeira PLR como advogada, e o primordial, nunca foi flagrada em uma roda com outras bolsas de marca dizendo o quanto era divertido passear no ombro de outra garota. Como pude me enganar tanto com o Kai? Não acredito que se vangloriou daquela forma para os amigos, estou me sentindo tão envergonhada e humilhada.
Os faróis de um carro se aproximam pelas minhas costas e iluminam a noite escura, obrigando-me a interromper meus pensamentos e também meus passos. Paro um pouco antes de atravessar a rua para esperar o semáforo fechar, mas em vez de me ultrapassar, o motorista reduz a velocidade, e giro nos calcanhares sentindo meus batimentos dispararem. É um péssimo momento para me dar conta de que não tem mais ninguém na rua além de mim e desse carro preto chegando cada vez mais perto. Se eu morrer por culpa do...espere!
Bato os olhos na placa e confirmo que não é nenhum psicopata sanguinário, mas contra todas as expectativas, meu órgão cardíaco pouco inteligente e nada confiável se contradiz e bate ainda mais depressa. Ele veio atrás de mim? Não acredito que o cretino veio mesmo atrás de mim.
Minha felicidade por ser prioridade na sua vida só dura até que encoste o Jackson ao meu lado no meio-fio e desça o vidro do passageiro. Quando noto sua cara de poucos amigos, sinto a porcaria que mora dentro do meu peito explodir de vez. Diga-me quais as chances de fazê-lo perder uma trepada interessante, porque eu paguei de louca, pode terminar bem para o meu lado?
Ele arqueia as sobrancelhas, esperando que eu caminhe até o carro ou fale alguma coisa, e eu até queria colaborar, mas estou distraída demais pensando que raios vou dizer quando me perguntar por que eu saí correndo. Dor de barriga? É uma boa...
Quando percebe que não estou me mexendo, seu rosto endurece e Shawn tem a paciência de me chamar com um dedo.
Continuo fazendo cosplay de estátua.
— Entra nesse carro, Camila! — ordena em tom baixo.
E agora? Eu sempre posso correr!
Por que não pensei nisso antes?
— Se estiver pensando em sair correndo de mim de novo, é bom saber que não vai dar certo... Mesmo morrendo de dor nas pernas, ainda sou mais rápido que você. — informa paciente, parece que está falando com alguém que ainda está no maternal. — Tudo que você vai conseguir é me irritar mais.
Só isso? Tem certeza?
— O que está fazendo aqui? — pergunto com um resmungo.
— O que você acha?
— Pensei que a essa altura já estaria se divertindo horrores em algum pulgueiro de quinta no centro da cidade, arrancando gritos da Audrey. — comento amarga, parecendo mesmo alguém do maternal.
— Por que não para de ser cabeça-dura e entra aqui para conversarmos?
Nego e seu tom endurece:
— Jura que vou ser obrigado a sair para pegar você? Não acabei de dizer que minhas pernas estão doendo, Camila?
Reviro os olhos com descaso. Na mesma hora, o impaciente abre a porta do Jack.