Pervertido de merda.
Foi assim que a garota, que eu continuo escutando chorar, me chamou aos gritos.
Não consegui escutar mais nada da conversa deles, mas depois disso também não precisei. Soube pelo "merda" que eu nunca tinha escutado sair da sua boca antes — nem mesmo quando pegou o noivo com outra — que eu tinha feito algo muito ruim. Mas, mesmo depois de vasculhar meu celular de ponta a ponta, eu ainda não sabia o que era. Continuei recebendo algumas mensagens que não gostaria de ler no lugar dela, mas não respondia nenhuma desde que fizemos aquele trato.
— Que diabo eu fiz? — Enterro o rosto nas mãos e continuo refletindo sobre essa pergunta pelo tempo que demora para Camila se acalmar.
Já se passaram mais de quarenta minutos quando a porta dela finalmente abre e meu irmão sai do quarto.
— O que deu nela? — Desencosto da parede e levanto do chão para esperá-lo de pé.
— Você quer saber o que deu nela? — Seu rosto fechado me dá um frio enorme na barriga. —Foi isso que deu nela. — rosna aos sussurros, empurrando algo contra meu peito com brutalidade suficiente para me fazer cambalear para trás.
O segundo golpe da noite também me pega desprevenido, mas estou distraído demais olhando para o tecido que desprende das suas mãos.
O apartamento está imerso no breu e gelado como meu sangue acabou de ficar. A única claridade que chega na sala vem da lua, que entra pelas portas da sacada que eu abri para conseguir respirar melhor, mas não demoro nem um misero segundo para reconhecer que a calcinha que estou segurando não é da Camila. E saberia até no completo escuro, não apenas porque sou eu quem lava suas roupas íntimas e saberia reconhecer todas de cor, mas também porque eu vislumbrei essa peça no corpo de outra pessoa madrugada passada.
Só não compreendo como...
— Ficou no bolso do meu jaleco. — não é uma pergunta.
— Não deveria. — Leo responde com um par de olhos furiosos e decepcionados. — Sou a última pessoa a poder te julgar por não ter aguentado, mas não deveria. — repete, me contornando para sair do apartamento a passos largos e tem razão.
Não deveria.
— Obrigado.
Tudo que eu escuto em resposta é um suspiro profundo e a porta do apartamento fechada.
Ele gosta mesmo dela. Impressionante, porque nenhum dos irmãos é do tipo que se apega em alguém e eu tampouco. Nossos passados não nos permitem essa regalia. Camila derrubou as defesas de todo mundo, menos as do Romeo.
Romeo.
Estou me sentindo tão chateado que queria muito meu irmão por perto agora, e nem sei por quê. Ele não anda nada contente comigo ultimamente.
Minha mão ainda está erguida, ainda estou olhando para aquela calcinha e sentindo o remorso abrir caminho para dentro do meu peito. Preciso me livrar dela. Troco de roupa e saio do prédio parando apenas para jogar aquela porra na lixeira em frente ao prédio antes de me alongar, de olho nas poucas estrelas que estampam o céu. Seleciono a playlist da minha banda preferida, coloco os fones de ouvido, aumento a música no último volume e disparo em uma corrida. Isso sempre ajudou a bloquear meus pensamentos, mas hoje não funciona. Sou uma máquina de pensamentos conflitantes.
Durante os poucos quilômetros que separam o hospital de casa, eu planejei entre um bocejo e outro, a noite que eu teria nos mínimos detalhes. Depois de, com muitos beijos, matar a saudade da garota que eu magoei, eu a libertaria do fardo de cozinhar e pediria alguma coisa para comermos. Gael já tinha me contado o que estava acontecendo quando liguei para perguntar se realmente correu tudo bem no jantar na casa do nosso pai. Se tinha algo que eu deveria saber ou, para ser mais preciso, se a boca do Romeo ficou fechada ou se eu teria que dar um sermão nele. Camila e eu conversaríamos durante o jantar como sempre fazemos. Eu escutaria atentamente tudo que quisesse me contar, e quando chegasse a minha vez de falar, esconderia a maior parte das coisas que aconteceram nesses últimos dias que passei no hospital, para que não se chateasse ainda mais. Garantiria que daríamos um jeito no problema do trabalho dela e enfiaria minha boca no meio das suas pernas até que se esquecesse de todos os seus problemas. Depois de um banho rápido, eu a levaria para a minha cama e me aninharia ao seu corpo pequeno e perfeito, para que pudéssemos assistir a algum desenho bobo que escolhesse até o sono chegar. Perfeito.