Desperto, ainda de porre.
Olho ao redor, constatando que essa não é a minha cama, mas não tenho a menor ideia de como parei nela. Solto um gemido me sentindo magoado e nauseado, também queria estar arrependido das minhas escolhas, mas não estou. Empurro a mão pousada em meu peito para longe e me obrigo a parar de pensar, saindo debaixo do edredom para vestir as roupas que encontro espalhadas pelo chão.
Tento ser o mais silencioso possível, não que adiante. Aquela mão estava lá por uma razão. Tipo um despertador.
— Fugindo pela manhã? — pergunta uma voz absurdamente sonolenta.
— O que você esperava? Café da manhã na cama? — debocho subindo o zíper do jeans.
— Era o mínimo que eu merecia depois de ontem.
— Não acha que está exagerando? Nem foi tão bom assim — brinco.
— Como ousa dizer isso para o cara que sentou no chão frio e afagou suas costas enquanto você vomitava um litro de uísque na privada? — continua, resmungando sobre também ter sido obrigado a tomar um banho comigo caindo de bêbado enquanto tateia o criado-mudo atrás do celular. —Seria bom ser mimado, para variar, tigrão.
Reviro os olhos, sendo que já tomamos muitos banhos e dormimos sem roupas juntos na mesmo cama, com ou sem garotas no meio, mais vezes do que podemos contar, mas no fundo estou grato por ter cuidado de mim.
Será que o advogado também cuidou bem dela? Será que ela está bem?
— Posso saber onde você vai? — Rodrigo me arranca dos pensamentos em boa hora.
— Para casa.
— Tenho uma cesárea de gêmeas para fazerem. Quarenta minutos. — conta saindo da cama, ainda de olho na tela. — Quer uma carona?
Nego.
— Preciso me desligar.
Ele não discute, e por falar em desligar...
— Como parei aqui, Go?
— Fui te buscar no Jose's — conta, pegando uma camisa do armário. — Não se lembra de nada?
Quase nada.
— Tudo que aconteceu depois que enchi a cara na tentativa de esquecer que me transformei em quem mais abomino e abandonei uma garota no meio da rua gritando meu nome, é um completo borrão para mim, tirando por fazer outra garota chorar depois de cogitar a ideia de fodê-la no banheiro para me vingar da Camila. Senti tanto nojo de mim que... — Rodrigo me olha por cima do ombro como se tivesse visto o fantasma, e eu volto para a minha linha de raciocínio. — Não que eu esteja reclamando, foi bom poder esquecer o que eu fiz por um tempo e descontar as merdas que eu estava sentindo em alguém, pena que durou pouco.
Ela não é mais minha querida.
O apartamento agora voltou a ser só meu.
Todo mundo vai sofrer por causa disso junto comigo.
— Não pode encher a cara e magoar as pessoas para se sentir melhor para sempre! Também não pode mais sentir culpa por querer ficar com outras pessoas.— Repete de novo para ver se minha consciência entende. Ela ainda está ligada no modo "comprometido".— Fez sua escolha, agora siga sua vida, Shawn.
— Eu sei — suspiro. — Aos poucos, tudo vai voltar ao normal.
Inclusive eu.
Com o tempo, vou acabar aceitando que aquela cena dela no meio da rua vai me destruir lentamente para o resto dos meus dias, e arrumar uma maneira de conviver com o remorso de ter destruído alguém que não tem ninguém. Ou é o que eu espero. Se quer saber, nem foi a pior cena que eu já vi. Ter visto aquela cadela me dar suas costas doeu mais do que ter dado as minhas para Camila. Infinitamente mais. É nisso que tenho que pensar para seguir em frente, nessa dor. Sempre que eu me concentro nela, o resto para de doer. Nada, nunca, jamais, vai me machucar tanto quanto ter sido abandonado pela Vivian. Isso é um fato.