48. Aaron

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No momento em que soltei aquelas palavras, consegui ver o quanto a chateei. Eu não deveria ter dito aquilo, ainda estava irritado com Ryan e foi um erro meu ter descontado nela. Ryan conseguia me deixar bem irritado às vezes, acho que parte de mim se sente assim porque sei que nosso pai estaria decepcionado. Na verdade, ele estaria decepcionado com todos nós, mas do que adianta? Ele está morto mesmo. Quando era pequeno, estava tão chateado, que quis odiá-lo. Odiá-lo por ter nos deixado tão cedo, odiá-lo por nos fazer passar por tudo isso, mas cresci, e todo esse ressentimento se esgotou, deixando apenas a tristeza. São as fases do luto, por fim a aceitação.

— Me desculpa eu...

— Está tudo bem — Marie me interrompe. Ela se senta na cama derrotada, e se deita, deixando as pernas para fora. Eu inclino a cabeça para observá-la, estava um pouco confuso. A verdade é, se eu tivesse falado isso para Katherine, ela surtaria, iria ficar sem falar comigo por pelo menos 5 horas, e então, eu sairia para comprar um presente para ela me desculpar, geralmente funcionava. Me deito ao seu lado e encaramos o teto em silêncio. — Vocês estão certos, não devo me intrometer na vida pessoal de vocês.

— Marie, não... — Mas a frase morre e paira no ar, sabia exatamente a intenção de suas palavras. Ela vira a cabeça para poder me olhar, e desliza a mão por cima da minha.

Por algum motivo, isso tudo era estranhamente reconfortante, eu já tinha até esquecido da discussão com Ryan, quer dizer, quase. Às vezes me culpava pelos acontecimentos, dizem que somos as pessoas com quem andamos e de certa forma, isso é verdade. Ryan costumava ser um bom irmão, mas as coisas foram esfriando, e viemos parar onde estamos. Apesar de não ser desculpa, suas intenções eram boas, não tínhamos tanto dinheiro quando chegamos. A princípio, sua ideia não era ficar nisso para sempre, ele havia dito diversas vezes que era a última vez, mas nunca era. Pelo menos era inteligente o suficiente para não usar as drogas.

Eu sentia falta da nossa vida de antigamente, as coisas pareciam tão mais fáceis...mas talvez era apenas porque eu era uma criança, e quando a gente cresce, a gente não vê as coisas mais com os mesmos olhos. Por outro lado, lá estava Marie, deitada do meu lado, me olhando com seus olhos intensos que eu poderia passar a vida inteira admirando. Sim, estava gostando dela cada dia mais, ainda mais depois de tudo que ela acabou presenciar. Já estávamos na chuva mesmo, nos molhar não ia fazer diferença nenhuma. Ela me fazia esquecer das coisas que me frustravam diariamente, e isso é mais do que eu poderia pedir.

— Vamos — digo me levantando e ela franze as sobrancelhas, confusa. Eu ofereço minha mão para ajudá-la a se levantar e ela o faz. — Se troca, vamos sair — anuncio. Saio do quarto para dar privacidade, e quando volto, ela já está pronta.

— Aonde vamos? — pergunta.

— No lugar onde prometi te levar novamente — respondo e ela parece se animar imediatamente. Ela também aparenta ter esquecido o que eu falei, ou ao menos sabe esconder muito bem, minha intenção jamais foi chateá-la, mas como sou irresponsável, decido culpar Ryan, é mais fácil assim.

Marie está vestindo um casaco vermelho, parece um sobretudo, que vai até pouco acima de suas coxas, abro um sorriso ao vê-la e ela segura minha mão quando descemos a escada. A casa ainda estava bagunçada devido a festa, e por mais que tenha prometido limpar tudo, decido deixar para depois, minha mãe provavelmente vai ficar mais furiosa do que já está, mas a essa altura, não estou me importando muito.

— Onde você vai? — escuto meu irmão perguntar assim que abro a porta da casa, reviro os olhos automaticamente, pronto para responder de uma maneira grosseira, mas ele diz antes: — você não vai limpar isso? Ela vai ficar mais irritada do que já está. — Muito fácil falar considerando que ele estava com a bunda no sofá, jogando videogame.

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