1 - A BARRACA DO BEIJO

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Ok. Eu estava suando frio. Meus olhos estavam vendados, eu estava ansiosa, rindo igual boba (com certeza uma consequência do nervosismo) e estava começando a sentir um leve incômodo na minha mão. Provavelmente estava começando a machucá-la com a força que eu pressionava minhas unhas contra ela.

Entre os vários conselhos que uma mãe pode nos dar, como "vista um casaco", "não fale com estranhos" ou "não beba nada que não for do seu copo", a minha mãe definitivamente esqueceu de me falar também algo como "não aceite participar de uma Barraca do Beijo onde qualquer um pode te beijar". Analisando bem, eu com certeza tinha perdido a cabeça, mas, as vezes, a pressão de querer fazer parte da história, te força a tomar medidas drásticas ou absurdas, como no meu caso.

– Lucy, se prepara porque é a sua vez. – Vivian, minha melhor amiga, pegou em meu braço e me levou até onde eu deveria ficar – Fique tranquila, eu não vou te deixar beijar alguém que você com certeza negaria.

– E se por acaso eu quiser desistir?

– Desistir? Estamos entrando no último ano, o Ensino Médio é pra ser memorável. – disse Vivian, a garota mega inteligente, participante ativa dos conselhos estudantis e que provavelmente tem um futuro brilhante à sua espera. No meu caso, prefiro apagar os últimos anos.

– Ok, eu consigo. Eu estou bonita pelo menos? Sem sujeira nos dentes? – Sorri para onde eu achava que Vivian estava e ela riu com a minha atitude.

– Sim, você está perfeita, a morena mais bonita dessa região. Roupa perfeita, sorriso bonito e olhos cor de mel encantadores.

– Viv, ninguém está vendo meus olhos.

– Não será preciso, você é linda mesmo assim. Certo, tem uma bancada na sua frente. Boa sorte! – Vivian me parou e eu já ouvia vozes à minha volta, com risinhos ou comentários maldosos, típicos de adolescente.

– Viv? – falei, mas não ouvi sua voz perto de mim, então eu estava sozinha ali, esperando. - Certo.

Eu senti alguém se aproximar e minhas pernas começaram a tremer. Eu com certeza me arrependeria disso em algum momento da minha vida. Ou, provavelmente, contaria aos meus filhos a história louca do dia em que resolvi participar da Barraca do Beijo.

Foi bem rápido, senti a respiração da pessoa próxima de mim e então, um selinho. Todos começaram a gritar e logo ouvi a risada de Tuppen, o fortão da escola. Ele era tão engraçado, que eu comecei a rir junto e a tensão foi embora.

– Certo, o próximo! – ouvi Viv dizer em meio aos risos.

– Próximo? Ah, entendi.

Outra pessoa se aproximou e então, senti essa pessoa pegar em minha mão. Senti seu rosto se aproximando do meu e veio o selinho demorado. Mais gritos! Ouvi a risada tímida de Ollie e acompanhei meu amigo. Mais um beijo tranquilo. Não demorou para que Vivian trouxesse mais alguém até mim e dessa vez, o selinho foi rápido, não consegui identificar quem era, mas todos aplaudiam. A minha incrível participação estava acabando e eu já não suava como antes. Mais alguém se aproximou de mim, e dessa vez os comentários ficaram mais escandalosos, as risadinhas aumentaram. Esse alguém tocou a minha mão e eu voltei a ficar nervosa.

– Vocês querem um beijo de cinema e menos drama? – disse o meu próximo "pretendente" e eu reconheci a voz. Era Marco Valentin Peña, o garoto que tinha chego na escola nesse ano e que tirava suspiros de todo mundo, com razão, ele é realmente lindo. A pergunta fez todos gritarem. E eu não pude deixar de dar um sorriso irônico – Foram vocês que pediram então.

Ele não mentiu quando disse que seria um beijo de cinema: foi intenso, molhado e o que eu poderia dizer mais? O cara beija bem, apesar de ter entrado em bons conflitos desde que chegou à nossa escola.

Tirei a venda e ele me encarava sorridente. Não parecia nada abalado com o climão que tinha acontecido entre ele e Elle Evans, minutos antes de eu entrar para assumir meu lugar na Barraca do Beijo. Aparentemente, Marco estava apaixonado por ela, mas gostava de se humilhar, já que a garota basicamente o abandonou ali mesmo para ir atrás de seu verdadeiro amor (e namorado). Eu não posso dizer que não admirava a coragem dele, mesmo que faltasse noção. Por fim, a tortura acabou e Vivian pegou a minha venda. Desci da barraca e parei ao fundo da plateia, que agora aplaudia outro maluco, como eu, que assumia a posição com uma venda nos olhos. Vivian deixou a Barraca aos cuidados de outro aluno e veio até mim, junto com Marco.

– Proporcionamos um belo beijo para a plateia. – ele disse, ainda sorridente.

– Hm, posso dizer que foi um beijo nota oito.

– Oito? Sério?

– Lucy está brincando, com certeza. – Vivian me repreendeu com os olhos, mas eu não podia negar. Marco causava algum tipo de transe em todos, e ele era realmente muito bonito, com um estilo latino que o tornava ainda mais sexy, mas ultimamente era difícil eu reconhecer algo assim, depois de um namoro de três anos.

Eu vivi o sonho adolescente: começar o Ensino Médio, conhecer um rapaz incrível, popular e importante jogador do time de futebol da escola. Essa foi a minha vida, até o Natal do ano anterior, quando eu achei que ia ter o beijo sob o visco, mas ganhei uma mensagem pedindo para terminar. Joshua foi um verdadeiro sonho que me causou muitos traumas. Ele controlava minhas roupas e minha postura, afinal eu era a garota do grande atleta do time, e ainda fazia eu me sentir insuficiente. Seria o prato cheio para que eu fugisse desse relacionamento, mas no fim, foi ele quem precisou terminar para que eu pudesse seguir em frente. Lembra quando eu disse sobre apagar o ensino médio? Joshua foi o responsável por grande parte do meu desejo de sumir com os últimos três anos.

– Bom, eu estou cansada. Vou para casa. – falei de repente, esticando as costas e me espreguiçando para fugir do cansaço.

– Está liberada! O evento desse ano foi ótimo e mais uma vez a Barraca do Beijo conseguiu ser nossa maior fonte de renda – Vivian estava empolgada e falava dando pulinhos.

– É difícil competir com isso, quem não quer beijar pessoas vendadas, enquanto toda a escola te observa, não é mesmo? Mas é um preço válido para a caridade. – falei empolgada, era difícil negar a genialidade por trás da atração que Elle e Lee proporcionaram nos dois últimos anos. – Agora, eu preciso mesmo ir. Boa noite, gente.

– Posso te acompanhar para casa? Acho que o caminho pra minha casa é quase o mesmo – Marco me perguntou confiante. Nós não éramos amigos próximos, mas fizemos alguns trabalhos juntos desde que ele entrou na escola e, bem, não haveria problema em me acompanhar, se não fosse pelo pensamento repentino em Josh e o grande empecilho que sua existência ainda exercia em mim.

– Ah, não...– olhei para Vivian, e ela me olhava mais uma vez séria. Desde o término com Josh, ela se empolgava com qualquer interação minha com homens. Era chato, mas eu sei que era sua forma de cuidar de mim. – O caminho é seguro e eu estou acostumada, sabe? – olhei mais uma vez para Vivian e ela continuava me encarando séria, indo com os olhos para Marco e voltando para mim, como se implorasse para que eu aceitasse.

– Uma boa companhia não vai te fazer mal algum, Jones. – Marco falou, convencido.

– Eu acho que não precisa... – olhei para Vivian, e eu quase conseguia ver fumaça saindo de seu nariz, implorando para que eu aceitasse. – Ok, vamos juntos – Falei, levantando as mãos como se me rendesse ao pedido – Tchau, Viv. Próxima parada, FORMATURA! – gritei para ela empolgada e em meio aos risos, nos despedimos.

Olhei para Marco e ele esticou o braço me indicando o caminho. Pelo jeito, o caminho seria longo até em casa.

Messed Up SummerOnde histórias criam vida. Descubra agora