🌈O Estranho

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    🌈 Música do capítulo: Dust in the Wind - Kansas

Jungkook Pov

    Mal chegamos e o Hope já estava tumultuando. Nem preciso sair pro corredor pra saber que é ele que está sapateando alegremente. Na real eu preciso sim sair. Não tô com vontade de ficar no meio desses otários discutindo se é melhor pro nosso estômago comer bolinho de arroz antes ou depois dos ensaios, até porque obviamente é melhor antes. De onde eles acham que tiramos energia pra ensaiar?
    Abro minha mala, tiro minha camisa suja e pego uma novinha. Não é porque sou um garoto que não tenho higiene, tá ligado? Eu me cuido... Na maioria das vezes são os outros que cuidam de mim, mas isso não vem ao caso. Troco também as meias, colocando o meu último par de pretas que não pinga suor, e cato o cartão magnético do quarto.
    — Jungkook, aonde você vai? — Jimin me impede de colocar a mão na maçaneta apertando meu braço. — Pelo menos dá a sua opinião aqui. Eu tô certo, não tô? A gente fica SUPER enjoado se comer antes.
    — Não. O Taehyung tá certo — dou o ultimato.
    — O quê? — Jimin se afasta, sua cara de ódio inofensiva.
    — Obrigado, Jungkook — agradece Tae, batendo em seguida nos ombros do nanico. — Só você sente enjoo, Chimmy. Por que então não deixa o seu pra depois? A gente não precisa fazer tudo junto. Você pode comer após o treinamento, sem problemas.
    — Se eu deixar meu bolinho dando sopa, quem me garante que ninguém vai roubar?
    — Roubar é uma palavra muito forte, Jimin-shi! — Chamo-o da maneira que mais odeia só pra perturbar seu juízo. — O que é seu, é seu. Não tenho motivo pra pegar nada que te pertence. Até porque minhas coisas são bem melhores.
    — Como posso saber se posso confiar em você? — pergunta Jimin revirando os olhos periodicamente.
    — Não pode.
    E saio. Ouço Tae rir do meu jeitão sincero e Jimin ficar tagarelando sozinho como sempre faz. Adoro esses dois. Parece até que foram eles que debutaram com 16 anos.
    De vez em quando eu me pergunto o que seria de mim se não tivesse entrado no grupo. Será que eu continuaria estudando naquela mesma escola comum, indo de metrô pra tudo quanto é lado e saindo pra pubs à noite com meus antigos amigos? Eu iria gostar de ser um adolescente comum? Nunca vou saber, não há como alterar o que já vivi. Esse meu pensamento é recorrente... No final das contas eu amo minha vida. Amo as escolhas que fiz pra estar aqui hoje. Não tem nada que possa reclamar. É só um devaneio passageiro.
    Avisto J-Hope entrando no elevador e assinalo pra ele segurar pra mim. Dou uma corridinha, logo chegando do seu lado. Ele apertou o andar térreo e notei que estava meio angustiado. Olhei pra ele, primeiro de soslaio, depois de frente, e então o encarei. Hope riu e me empurrou levemente.
    — Tá bem, o que foi? — pergunto interessado.
    — A S/n pediu um cappuccino e eu não faço a mínima ideia de onde eu possa arrumar um — respondeu desanimado.
    — Fala sério, Hope. Esse desespero todo por conta de um cafézinho? É só a gente ir na recepção e... — A porta abriu e entraram algumas pessoas. Continuei baixinho: — E pedir pra eles, duh.
    — Que gênio! Por que eu não pensei nisso?
    — Tá sendo sarcástico?
    — É lógico que eu estou sendo sarcástico! — Ele acaba falando muito alto e a velhinha que invadiu nosso cubículo deu um baita olhar de reprovação. Hope limpou a garganta e chacoalhou os ombros. — A gente tá em Los Angeles, inteligentão. Eles não falam nossa língua.
    — Holy shit! — Acabei soltando sem pensar e aquele um olhar se quadruplicou. Todos os olhares massacraram a gente.
    Fui calado por Hoseok, o qual sorriu amarelo para todos até a porta se abrir novamente. Sozinhos, ri do vexame.
    — Aquilo eles entenderam — Hope disse entre risos.
    — Foi mal... Meu cérebro me enganou. Eu jurei que a gente ainda tava em Hong Kong.
    — Você está muito atrasado. Antes a gente estava em Tóquio! De onde surgiu Hong Kong?
    — Eu sei lá.
    — Você é estranho, Jungkook.
    Fiz uma careta proporcionando um clima divertido.
    Seguimos pro hall, parando um dos funcionários do hotel e tentando botar em prática nosso aprendizado. Hope fez um monte de gestos, tipo bebendo algo e queimando a língua. O moço fez uma cara de que estava diante de dois alienígenas e eu não o culpava. O Hope é mesmo um alienígena! Reuni toda a minha coragem pra usar aquilo que a pirralha me ensinou.
    — Do you have cappuccino? (Vocês têm capuccino?) — Minha pronúncia não foi lá essas coisas, porém foi o suficiente para que o funcionário entendesse.
    — Yes, Sir. Would you mind waiting a little? There are seats over there. (Sim, senhor. Importaria-se de esperar um pouco? Há bancos por ali.) — O funcionário apontou pras poltronas de espera e soube que teríamos de esperar.
    Agradeci, puxando Hoseok para o local sinalizado. Sentamos e ficamos lá um tempo. Hoseok fazia caras e bocas, impressionado com o que eu havia conseguido.
    Conversamos sobre coisas aleatórias: o vento, a terra, a água e o ar... Claro que não! Conversamos sobre aquela forçação de barra do Yoongi na limousine. Aquele atrevido queria mostrar o que com aquela atitude? Nossa, meu sangue ferveu de uma maneira que ele não tinha noção do perigo que estava correndo dentro daquele carro. Hoseok tentou e tentou explicar aquela babaquice, mas eu só negava com a cabeça. O que me impedia de compreender? Uma vozinha na minha mente sussurrando insistentemente, fazendo com que tudo que tivesse a ver com a S/n fosse longe de ser fútil.
    Tenho muita sorte de já ter encontrado nos meus 24 anos o amor da minha vida. Como tenho certeza? Eu... Eu tenho. Não sei ao certo. Eu só sei que fomos destinados a ficarmos juntos. Aquela pirralha de 18 anos me avassalou. Dúvidas invadiram minha mente desde que ela apareceu. Eu me tornei inseguro. Fico me olhando no espelho durante horas toda manhã, buscando no meu reflexo uma revelação que nunca ocorrerá. Eu sou o homem perfeito pra S/n? Espero que sim. Eu tenho que ser. Não sei o que farei se não for. — É tudo um jogo de conquista. Somos sete e um sairá vitorioso: eu.
    Há maneiras de se matar sem ser pelo suicídio. A minha consciência está me destruindo, por exemplo. Gostaria de entender a S/n. Digo, eu já a entendo, sei quem ela é, mas... Eu sei que todos ficamos confusos quando se trata de relacionamentos e comigo não seria diferente. Ela me ama, eu sinto. S/n se entregou pra mim, ela me escolheu, confiou em mim. Mas os meus amigos... Eles a enfeitiçaram. Bagunçaram com a cabeça dela. Vou consertar essa alienação. Vou fazer ela enxergar só a mim.
    Tive a melhor noite da minha vida e eu sei que também foi a sua, S/n, pode negar o quanto for. Vou fazer você lembrar de como propriamente deve ser tratada. O contato bruto das minhas palmas com sua pele macia, aqueles seus gemidos deleitosos provocando minha clemência. Nossa, como me dava uma peninha de te ver se contorcendo comigo dentro de você. Sabia que devia parar e só pentear seus cabelos cheirosos com meus dedos, aquietando seu corpinho miúdo. Mas aí você mordeu sua boca, machucando aquela parte delicada que tanto me fascina, e mesmo com todo aquele esforço descomunal para aguentar a dor, seus olhos brilhavam de tanta paixão. Então eu continuei: entrando, saindo, entrando, saindo. É, nós continuamos nossa demonstração de amor, uma nova e inesquecível experiência para ambos. Ainda consigo ouvir seus gritos finos, chamando meu nome e dizendo: "Jungkookie, eu te amo". Porra... Você me deixa louco, S/n.
    — Your order. (O seu pedido.) — O funcionário voltou e entregou o... O que era mesmo?
    — Thank you! — Agradeceu Hoseok, que saltitou pelo corredor. — O cappuccino saiu rápido, não acha?

ಌ사랑ಌ

    De volta ao elevador, trocamos mais algumas ideias sobre essa situação incomum que vivemos. Hoseok parece sempre ficar feliz se S/n estiver feliz, como se ele não tivesse vontade própria. Seu lema era "Esquecer quem sou e me tornar o que a S/n precisar". Para ele isso significa estar vivo. Achei muito nobre. Só que eu não sou assim. É radical demais. Óbvio que quero ver a pirralha feliz, mas eu também quero estar feliz. Acho que isso não é tão difícil de acontecer, certo?
    No nosso andar, cessei o papo ao ver um sujeito de boné tentando entrar num dos quartos. O homem estava em pé, concentrado quanto ao som que fazia de metal raspando na madeira. Estranhei demais aquilo. Não era pra ter nenhum hóspede no nosso andar, e, se tivesse, seriam nosso pessoal de maior confiança, mas aquele cara nem coreano era. Nunca havia o visto antes, na verdade. Hoseok, então me beliscou com força e sussurrou sem desviar o olhar daquela cena que: "Esse é o meu quarto". Apertei os dentes. S/n estava no mesmo quarto que o homem tentava arrombar.
    — Ei! — Assim que gritei, o sujeito saiu correndo na direção oposta, deixando uma de suas ferramentas cair. — Hoseok, fica com a S/n e chama todo mundo. Faz isso agora! — ordenei sentindo as veias dos meus olhos mancharem minha visão de vermelho. Eu nunca fiquei tão furioso quanto agora, sem contar com o surto de abstinência do Taehyung. Mas eu sentia algo a mais, algo mais profundo. Rangia os dentes de pavor.
    — Aonde você vai? Jungkook? Jungkook!
    Quando Hoseok terminou de falar eu já estava longe, correndo a toda velocidade atrás do cara de preto. Ele era ágil, virou com tudo pra esquerda, eu em sua cola. Acabei escorregando e batendo na parede, ainda o acompanhando com a vista. Meus instintos simplesmente me mandaram capturá-lo ou muito provavelmente algo horrível irá acontecer. Retomei a correria, chegando bem perto e aí... aí eu caí em cima do carrinho de limpeza que surgiu do nada de dentro de um dos quartos do hotel. Minha dor não era importante naquele momento, muito menos o faxineiro me xingando em uma língua estrangeira. Tratei de levantar, determinado a não o perder de vista.
    Manquei nas primeiras passadas. Felizmente o alvo ainda estava na mira. Virando outra esquina ele desapareceu. A porta de incêndio fez um estrondo. Corri e bati o ombro com tudo nela, escancarando-a e me deparando com escadas e escadas. Olhei pra cima, nada, olho pra baixo, nada. O que ganhei foi uma vertigem daquelas. Ele pode estar em qualquer lugar agora! Será que consigo chegar na recepção e impedi-lo de sair? O que eu faço? Argh! Mas que porra!

    Taehyung Pov

    É a voz de Hoseok? Eu e Jimin nos entreolhamos, ficando estáticos com a sucessão de sons que vêm do corredor. Uma perseguição? Deixamos as malas de lado, correndo pra direção do fuzuê.
    A porta na nossa frente estava aberta, a claridade cegava a mim e ao meu amigo. As cabeças de Yoongi hyung, Jin hyung e Namjoon hyung aparecem no quarto 757 que fica ao lado do nosso.
    — Ouviram? — Yoongi mantém a voz rígida, mesmo baixa, quase inaudível.
    — Uma briga? — sugiro, eles negam veementemente.
    — Foram vocês? — indaga meu colega de quarto.
    — Não, não... — Jin tinha seus olhos inquietos, que buscavam a fonte do que acabamos de ouvir em todas as direções.
    — Vocês estão bem? Cadê o resto? — nosso líder sempre se mostra preocupado conosco.
    — Pessoal, aconteceu algo que precisamos conversar — Hoseok sai de fininho do seu quarto, olhando pra um lado e pro outro, convidando-nos para entrar com as mãos trêmulas.
    Saímos dos nossos cantos, indo silenciosamente na direção de Hoseok. Sem dar muita bobeira no corredor, apressamos o passo, porém fiquei um pouco pra trás. Tinha um cartão jogado perto do rodapé. Peguei sem pensar duas vezes, colocando no bolso da calça. Por que aquilo estava ali? Tenho um mau pressentimento.
    Assim que entramos, Hoseok fechou a porta, encostando nela com a respiração evidentemente acelerada. Ele estava assustado, todos estávamos.
    — Olha, se for pegadinha, eu não tô achando graça — Jimin puxa minha gola da blusa, tentando me abraçar por estar apavorado.
    — O que foi, Hoseok? O que aconteceu? — pergunto impaciente. Ficaria extremamente nervoso se fosse uma brincadeira.
    — Shh! Faz silêncio, galera... Ela... ela tá dormindo.
    Nos viramos e lá estava ela. S/n dormia com os joelhos encolhidos, as próprias mãos lhe servindo de travesseiro e a trança tomando a forma de sua clavícula. A primeira coisa que pensei foi: como aqueles estrondos não a acordaram? Aproximei-me já preocupado, pois ela não fingiria estar dormindo só pra nos assustar. Não é de seu feitio. Coloquei a palma na frente do seu rosto e suspirei aliviado ao sentir um ventinho quente nos dedos.
    — Que merda você está fazendo? Sai daí, Tae! — exige arrogante Yoongi.
    — Qualquer um desse andar e dos dois conseguintes ouviria esses barulhos e levantaria da cama num baque só — assim que digo, uma faísca percorre o fundo dos meus olhos.
    — Por que, então, ela não acordou? — Namjoon completou meu raciocínio.

❝𝐂𝐨𝐥𝐨𝐫𝐬 ❼ ❞Onde histórias criam vida. Descubra agora