Capítulo 38| Francesca

29 3 0
                                    

'Got a feeling that I'm going under
But I know that I'll make it out alive
If I quit calling you my lover
Move on'

- Stitches, Shawn Mendes

Segunda-feira, 08 de janeiro

Voltámos à nossa rotina de universitários e, consequentemente, mudámo-nos para os dormitórios. Embora o nosso objetivo seja ficar na residência onde estivemos durante a passagem de ano, entendemos que não é o melhor cenário atualmente. Os dormitórios são relativamente perto da faculdade e isso facilita muito mais a nossa dinâmica em grupo.

Ian tem dormido com Mathilde desde sexta-feira, enquanto Ricciardo quase não aparece no nosso dormitório. Não estamos juntos há precisamente cinco dias e eu sinto imensa falta dele.

A nossa relação não está a atravessar a melhor fase e nós não chegamos a discutir, mas fica sempre um clima tenso, principalmente por causa de ciúmes.

Já perdi a conta de quantas vezes desabafei com Mathilde e, embora a minha prima seja compreensiva e esteja sempre disponível para me ouvir, sinto que tenho sido um grande peso para ela. Assim como o loiro têm sido para Ian.

Eles saíram hoje de manhã, sem dar qualquer indicação de para onde iam. Mathilde confia no moreno de olhos fechados, mas eu não posso negar que estou apreensiva.

- Tu precisas de relaxar. - pontua. - Estás num péssimo estado, Fran.

- Às vezes não preciso que sejas tão sincera. - indago e ela ri.

- Vai tomar um banho quente. - manda. - Hoje temos o espaço todo só para nós e vamos aproveitá-lo da melhor forma.

Eu assinto e levanto-me do sofá, indo em direção à casa de banho, enquanto ela fica na cozinha, provavelmente a preparar um lanche para nós.

Ligo o chuveiro e começo a despir-me. O espelho reflete a imagem de uma mulher desleixada e isso entristece-me. Preciso urgentemente de fazer algo em relação à minha aparência e sei que não é necessário um esforço grande para voltar a ser a Francesca do início do semestre.

Por um lado, quero declarar-me e assumir um relacionamento sólido com o loiro. Por outro lado, tenho receio do que isso significa e algumas inseguranças relativamente ao seu antigo relacionamento. Ricciardo parece ter superado a Pâmela, mas é pressionado constantemente por ela e pode ceder a qualquer momento. Além disso, o Flo tem tentado entrar em contacto comigo recentemente e isso faz-me ter ainda mais dúvidas. 

Acabo de tomar banho e visto o robe, enrolando uma toalha no meu cabelo molhado. Mathilde entra na casa de banho com um tabuleiro em mãos. 

- Ainda temos produtos de skincare? - questiona com um sorriso travesso. 

Animo-me logo com a sua pergunta e abro o armário, procurando todos os produtos que comprei antes de nos mudarmos para o dormitório. A morena coloca o tabuleiro em cima do cesto da roupa suja, que estava vazio, e senta-se na tampa da sanita com uma caneca. 

- O que é? - pergunto curiosa, despejando tudo que encontrei no armário dentro do lavatório. 

- Chocolate quente. - responde sorridente. - Vou querer começar pelo hidratante de aloe vera. 

Concordo com ela e pego no frasco, ficando à sua frente. A minha prima fecha os olhos e inclina ligeiramente o rosto para cima, com o objetivo de me facilitar a aplicação do produto. Quando acabo, passo-lhe o frasco e limpo a mão, antes de alcançar a caneca que restou no tabuleiro. Sento-me na sanita e deixo-a fazer exatamente o mesmo processo, sentindo o efeito refrescante atingir toda a extensão da minha pele facial. 

Continuamos a nossa rotina habitual de skincare, enquanto falávamos naturalmente dos nossos professores e das matérias aborrecidas que infelizmente temos de estudar. No geral, ambas estamos a adorar o curso, porém, existe sempre algo que estraga a experiência académica. 

Ficámos tão abstraídas do mundo exterior que perdemos a noção de tempo e só nos apercebemos que estava a anoitecer quando o telemóvel dela vibrou. 

- Eles estão a chegar com o jantar. - informa, enquanto digitava uma resposta. 

- Eu arrumo isto. - aponto para a confusão que tínhamos feito. 

- Eu vou levar o tabuleiro novamente para a cozinha e deixar tudo pronto para quando eles chegarem. - pontua. 

Em menos de meia hora, ouvi batidas na porta. Mathilde foi abrir e eu aproveitei para acabar de alisar o cabelo, antes de ir cumprimentá-los. 

Quando finalmente entro na sala, vejo o loiro sentado no pequeno sofá e o casal do ano na cozinha. Sento-me ao seu lado e ele exibe um sorriso. Gostaria de poder dizer que Ricciardo não me aquece o coração, nem me provoca um misto de emoções à flor da pele, mas estaria a mentir. O seu charme ganha-me em qualquer disputa.

Fico completamente vulnerável com ele por perto, derreto-me só de sentir o seu cheiro amadeirado nos lençóis, tenho saudades dele constantemente, embora não fique sem a sua companhia durante mais de um par de horas. Essa realidade assusta-me e irrita-me ao mesmo tempo. Eu preciso de falar com ele, urgentemente.

- Olá. - ele cumprimenta-me cordialmente. - Estás deslumbrante.

- Obrigada. - sinto as minhas bochechas queimarem. - Posso me sentar?

- Claro, Fran. - abre espaço para que eu me acomode ao seu lado.

Um silêncio constrangedor abraça-nos. Ouvimos alguns risinhos vindo da cozinha e não precisamos de olhar para saber que Ian e Mathilde estão a divertir-se imenso enquanto colocam o frango assado na travessa para ser servido.

- Acho que temos um assunto pendente. - arrisco-me a iniciar um diálogo.

- Não te sintas na obrigação de falar comigo. Sei que estás confusa e um pouco aborrecida. - suspira, fitando-me.

- Não podemos continuar a fingir que está tudo bem. - reforço.

- Eu sei que te faço bem e tu também me fazes bem, mas estamos rodeados de dúvidas. Não podemos ignorá-las. - indaga. - Tu sentiste alguma coisa diferente quando o beijaste, Francesca, não podes negar.

Incomoda-lhe proferir tais palavras e eu apego-me à esperança de o fazer ver que é um erro estarmos separados. O Ricci não pode simplesmente afastar-se de mim depois de tudo o que já passamos juntos.

- Eu reconheço as minhas inseguranças e gostaria de ultrapassá-las. - admito, um pouco mais baixo. - Mas quero fazê-lo ao teu lado, amore mio.

O loiro fita-me por alguns momentos, antes de passar o braço pelos meus ombros e puxar-me para si.

- Eu passei o dia todo com o Ian no campo de treinos. Estivemos a relaxar um pouco, fazer alguns cestos e a falar sobre a universidade e outras situações. - ele explica. - Tento provar-te todos os dias que posso ser melhor para que possamos ficar juntos, tento declarar-me, como, no fundo, estou a fazer agora. Respeitei-te sempre, em todos os momentos, dei-te o espaço e segurança que precisavas. Abri mão da minha antiga vida por ti, larguei a minha péssima reputação. Só há uma coisa que eu não posso fazer por ti.

- O quê? - interrogo curiosa.

- Esclarecer a tua confusão mental. Se existe, é porque não estás pronta para estar comigo. Cabe-te a ti decidir se o teu medo é maior do que o que sentes por mim. - responde tão calmo que eu não o reconheço.

Demoro um pouco para assimilar as suas palavras, mas ganho coragem para retribuir a declaração.

- Eu amo-te, Ricciardo. - finalmente verbalizo. - Estou disposta a enfrentar todos os obstáculos para transformar este sentimento em algo bonito e que deixe boas recordações.

O loiro não reage imediatamente e isso deixa-me ansiosa. Temo que tenha estragado tudo. Temo que tenha sido demasiado intensa. Contudo, Ricci beija-me com tanta vontade que quase não me dá tempo para raciocinar.

Não me deixesOnde histórias criam vida. Descubra agora