Capítulo 30| Mathilde

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'Sometimes I wake up by the door
That heart you caught must be waiting for you
Even now, when we're already over
I can't help myself from looking for you'

- Set Fire To The Rain, Adele

Segunda-feira, 27 de dezembro

O Natal passou e, infelizmente, tivemos de abandonar a costa do país para voltar à cidade universitária.

Os dias em que estivemos ausentes foram fundamentais para esvaziar a cabeça de todo o stress. Porém, não consegui tirar o moreno da mente, o que me preocupa imenso.

Não posso lidar com a nossa situação como um término, pois nós nunca tínhamos acordado que seríamos amantes, muito menos exclusivos. Mesmo assim, custa-me aceitar este ponto final tão repentino.

Decidi aceitar o convite de Valentina e estar presente na festa de fim de ano. Talvez tenha a oportunidade de conhecer pessoas novas e me divertir, como é comum entre jovens universitários.

Por muito que eu queira e tente, não consigo sentir interesse ou atração por alguém, porque, inconscientemente, comparo-os sempre com o moreno. O ruivo que me abordou na véspera de Natal enquanto eu escolhia os presentes para os meus primos, o atendente do salão de chá onde eu e a Francesca fomos lanchar com as nossas tias e o próprio John. Eles nunca serão o moreno e essa constatação aterroriza-me.

- Vou sair com o Ricci. - Francesca avisa e eu assinto com um sorriso.

- Diverte-te e lembra-te que eu não quero ser madrinha tão cedo. - brinco e ela manda-me o dedo do meio.

- Vê lá se me dás tu um afilhado. - ela responde.

- E eu vou engravidar sozinha? - interrogo.

- Sabes muito bem quem seria o pai. - indaga. - Não te afundes nesse sofá a tarde toda. Até logo.

Quarta-feira, 29 de dezembro

Chegamos ao armazém onde a festa se desenrola animadamente. Vejo o Porsche que me é tão familiar estacionado num lugar reservado, mas prefiro ignorar. Se ele não me vir no meio de toda a confusão, será melhor para mim. Aliás, será melhor para ambos.

Valentina e Thiago chamam-me e eu acompanho-os até ao interior do armazém, onde a música é ensurdecedora. Algumas colegas da ruiva vêm ao nosso encontro, enquanto o Th cumprimenta os seus companheiros de equipa. Uma bebida chega às minhas mãos, mas eu recuso-me a desfrutá-la, uma vez que não sei de onde veio.

Encontro Ian perto do palco e apercebo-me de que ele está acompanhado por uma jovem morena e bastante bonita, de estatura baixa e um corpo muito desenvolvido. Ela parece ser mais velha e constato que está interessada nele através das suas reações corporais. Todavia, Ian não mantinha contacto visual com ela e atentava-se no ambiente à sua volta.

O seu olhar encontra o meu e ele paralisa por breves segundos. Sinto um braço forte rodear a minha cintura e viro-me para identificar o indivíduo com tamanha audácia. Reconheço o John, que se encontra completamente bêbado e machucado, com o olho direito negro e um corte profundo no lábio.

- O que te aconteceu, John? - pergunto preocupada e obrigo-o a sentar-se na poltrona perto do corredor.

- Nada de especial. - diz sonolento.

- Quem te deixou assim? - insisto.

- O Leonardo. - afirma.

- É melhor ires para casa. - aconselho, sentido as minhas costas queimar.

Adivinho que Ian está a aproximar-se e, de facto, ele para atrás de mim. Um arrepio percorre a minha coluna quando sinto a sua respiração próxima ao meu ouvido. Afasto-me inconscientemente e caminho pelo corredor até chegar à varanda, usufruindo de um pouco de ar fresco.

- Morena... - sussurra, abraçando a minha cintura.

- Larga-me. - fico imóvel e ele suspira.

- Sabes que podes perfeitamente soltar-te por vontade própria. - comenta. - Não me peças para recuar, recua.

Permaneço quieta e ele afasta-se com um sorriso no rosto perfeito.

- Passaram imensos dias desde a nossa última conversa, linda. Está na hora de conversarmos como duas pessoas civilizadas que gostam uma da outra.

- Não tenho nada para conversar contigo. - declaro firmemente.

- Eu não vou te deixar escapar, morena. Duas semanas longe de ti foram o suficiente para perceber que não te posso deixar ir assim. Não por um motivo tão fútil. - cruza os braços.

- Pensasses nisso antes de cometeres o mesmo erro pela segunda vez. - reviro os olhos.

- Tive tantas saudades tuas, amor. - admite, ignorando a minha afirmação anterior. - Eu só te quero proteger de toda a merda do meu passado.

- Sendo assim, não é melhor mantermo-nos afastados? - arqueio a sobrancelha, não dando o braço a torcer.

- Eu quero mudar o que nós temos. - declara. - Sabes perfeitamente que não és mais uma.

- Gostava de saber quantas já caíram nesse teu discurso. - rio sarcasticamente.

- Não é uma mentira, caralho! Eu só consigo pensar em quando eras minha. - reflete em voz alta.

- Tu és responsável por todas as tuas ações, inclusive por me perder. - indago. - E eu nunca fui tua.

- Se não queres ser minha, olha no fundo dos meus olhos e verbaliza-o. Diz-me que não me queres, que preferes estar com outro e que não te importas de me ver com outra. Se isso for realmente verdade, eu deixo-te em paz e vou-me embora. Não estejas à espera que eu termine contigo. Fá-lo por ti mesma, se é o que tu sentes que deves fazer.

Eu não consigo responder, porque tenho noção de que isso é o que eu menos quero.

- Estou à espera. - reforça com indiferença, mas sei que está tão ansioso quanto eu.

- Não consigo, porra. Eu gostaria de conseguir dizer que posso encontrar em outro o que encontrei em ti, mas estaria a mentir. É isso que queres ouvir? - exalto-me frustrada comigo mesma. - Não consigo pensar em mais ninguém da mesma forma que penso em ti, nem sou capaz de sentir as mesmas sensações que sinto contigo com outro qualquer. Por isso, não fiquei com mais ninguém.

Suspiro, abaixando a cabeça para evitar que ele veja os meus olhos marejados. Sinto-me tão fraca por estar a chorar que o que eu mais desejo é fugir agora.

- Estou cansada de me sujeitar a isto, Ian. Chega. Vai viver a tua vida livremente, como já o tens feito com as dúzias de raparigas que desejam ocupar o meu lugar. - tento disfarçar o choro.

- Eu sou livre contigo, morena. Aliás, eu só consigo viver quando estou contigo. Estou cansado de me afundar no meu passado e de viver constantemente em modo sobrevivência. Tu trouxeste-me de volta à vida. Eu quero ser alguém melhor e, acima de tudo, quero que sejas minha. Exclusivamente minha. E eu serei exclusivamente teu. - aproxima-se novamente, unindo as nossas mãos.

- Como é suposto eu acreditar nisso? - questiono.

- Estou disposto a tornar as minhas palavras em ações e provar-te todos os dias que sempre serás tu. - admite.

O seu polegar escorrega pelo meu rosto húmido devido às lágrimas e eu fito os seus lábios carnudos e avermelhados. Não me contenho e beijo-o. A minha língua choca-se contra a sua e o meu corpo amolece nos seus braços, obrigando-o a sustentar o meu peso.

- Não te vais arrepender, amor. - promete.

Não me deixesOnde histórias criam vida. Descubra agora