Capítulo 32: Interrogatório

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Amberly

Não achei que esconder um corpo me causaria tanto impacto.

Já fazem dois dias desde que isso aconteceu e eu não estava nem um pouco tranquila. Sempre que fechava os olhos, lembrava de como eu o empalei silenciosamente. O ruído da espada atravessando seu peito, rasgando-o no meio, nunca sairia da minha cabeça. Eu não sabia nem o nome dele, eu nem tive a oportunidade de conhecê-lo, e agora nunca mais conheceria.

Janet tem sido rígida comigo e eu nem sei o motivo. Ela deu de tudo para encontrar qualquer outro homem escondido que, por sorte, trouxe um vivo para interrogatório. Antes de enterrarmos o corpo do homem morto, não me contive em ver seu rosto pela última vez antes que fosse enterrado. Ele não era feio, acho que o que salvava eram seus cachos pretos como o luar da noite em que morreu. Já era um homem de certa idade, deveria ter uma família, ou ela foi tirada por algum mutante. De algum jeito ele tinha raiva por nós, raiva de nossa espécie, e agora nunca mais vou saber o motivo. Queria ter conversado com ele, o convencido de que não somos pessoas ruins, somos apenas diferentes, nada mais. Mas agora ele não pode me ouvir e eu não consigo parar de pensar nele.

O homem que conseguimos vivo já era mais jovem. O loiro de olhos azuis estava amarrado em uma cadeira da qual não conseguiria sair. Ele estava indefeso e sozinho, duas coisas que tenho mais medo. Tinha dó por ele, queria liberta-lo, fazer o certo, mas Janet nunca me perdoaria se fizesse algo assim. Já foi difícil fazê-la conversar comigo de novo, agora eu não quero perder isso nunca mais. Mesmo tendo certa raiva dela também, não consegui me despedi do anel que me deu no telhado no dia em que voltamos. Era simplesmente encantador. Não poderia tirar mesmo que ela me desse outra bronca, eu ainda sentia algo por ela, apesar dela querer que eu a odiasse.

O braço mecânico de Janet tem dado mais trabalho do que eu. As vezes tinha espasmos, como se o braço tivesse vida própria. Ontem de manhã acordei com ela reclamando de levar socos frequentes do pedaço metálico preso ao seu corpo, como se fosse um parasita que odeia seu hospedeiro. Sinceramente, eu não sei como ajudar. Desde que eu não leve um soco de graça, não vou me meter nisso. Ela estava cansada disso e pela primeira vez vejo ela não saber o que fazer numa situação assim.

Hoje faríamos um interrogatório, Janet diz ser necessário. Ela quer extrair informações dos soldados com algum tipo de tortura se eles recusarem, por isso ficou tão brava quando matei o homem naquele dia. Ela usaria ele para extrair a verdade usando tortura. Acho que foi mais fácil sua morte. Estávamos na sala de comando, um lugar que poderíamos fazer qualquer coisa que ninguém veria ou ouviria, é um ótimo lugar para um interrogatório.

O loiro preso na cadeira já tinha tentado fugir de todas as formas, agora nós o impedíamos que se matasse antes do interrogatório. Na mesa a sua frente, eu ajudava Janet com algum tipo de droga reveladora de segredos. Já que seu braço não a deixava fazer muita coisa, eu tinha que fazer por ela. Era entediante por um lado, mas pelo menos mantinha minhas mãos ocupadas com algo.

─ Você ta fazendo errado, me deixe te ajudar ─ Janet insistia no meu erro enquanto passava seu braço esquerdo pelo meu, como um meio abraço, me causando arrepios. Aos poucos ela encostava nas minhas costas, se aproximando. Sua respiração batia em meu pescoço, ela estava quente. Você quer que eu te ame ou te odeie, idiota?

─ Eu sei o que estou fazendo ─ me mexia, afastando de sua proximidade. Tudo que eu não precisava agora com certeza seria dela se aproximando de mim. Ainda estava magoada pelo que me disse antes do meu primeiro assassinato, mas eu ainda teria que encontrar com ela no quarto. Nosso silêncio foi bom por um tempo, agora esse momento tinha sido invadido por uma pessoa: Rebecca.

─ Que merda vocês estão fazendo? ─ ela olhava indignada para o homem e para nós. Acho que parte dela não quer desapegar dos purificadores, algo ainda a prende, como uma âncora. ─ O que vão fazer com esse homem?

─ Apenas algumas perguntas, nada mais ─ a resposta de Janet não foi tão convincente, todas sabíamos o que iria acontecer depois das perguntas.

─ Eu não vou deixar ─ Rebecca rebatia. ─ Eu cresci com ele, não vou deixar que mate ele.

─ Não vamos matá-lo, Rebecca, eu já te disse ─ com a mão esquerda, ela fazia um sinal pra mim, apontando para uma das agulhas que estávamos mexendo sem deixar Rebecca ver. Ela vai usar em nela. Eu achava que Janet sempre conseguia resolver as coisas usando as palavras, mas isso prova que até ela usa a violência as vezes. Eu não tive escolha aquele dia, eu usei apenas a violência e agora ele está morto.

Quando passei a agulha para Janet, o loiro infeliz tentou gritar mesmo com uma fita em sua boca. Mesmo assim ele conseguiu a atenção de Rebecca, que conseguiu se preparar antes do ataque. Janet estava lenta por causa do novo braço, isso demoraria para se acostumar. Antes que ela pudesse pegar a ex-purificadora, Rebecca impediu seu ataque com uma joelhada na barriga. Não pensei duas vezes antes de ir para cima dela. Mesmo que não tivesse chance nenhuma de sucesso, consegui empurra-la brutalmente contra a parede, fazendo com que batesse a cabeça e desmaiando. Por alguns segundos não consegui respirar até ter certeza de que Rebecca ainda respirava que, para meu alívio, continuava viva. Depois de ter certeza que estava respirando, fui até Janet que já estava em pé, parecendo totalmente recuperada.

─ Vamos começar logo essa merda ─ nervosa, foi até o homem e arrancou a fita de sua boca brutalmente. Tenho certeza que um vermelhidão se formaria ao redor de sua boca. ─ Eu vou ser direta. Onde estão nossos amigos?

─ E se eu não souber? ─ o homem debatia, pedindo por um soco. Janet pareceu não ouvir, se virando até a mesa com os elementos em que mexíamos. Ela tinha certeza absoluta do que fazia. Pegou alguma coisa que não consegui ler e uma agulha.

─ Agora vai saber ─ injetava o líquido todo em sua veia. ─ Isso é fasciite necrosante, vai comer você vivo ─ dava para ver nos olhos dele que entrava em desespero. Tentava se mexer na cadeira, fugir dela, mas agora simplesmente não conseguia. Por um momento fiquei triste por ele, mas não pude evitar ficar satisfeita com seu sofrimento. ─ Tenho algo que pode te curar, mas vai ter que responder as minhas perguntas.

─ Ok, vou falar o que quiser, apenas não me mate ─ no fim das contas ele era um covarde.

─ Onde estão nossos amigos?

─ Atrás de uma porta na sala de cirurgia da fortaleza de Stryker, um lugar imundo de sangue. Eles estão em gaiolas, como passarinhos ─ fazia piada da situação mesmo com medo, acho que era o único jeito de não enlouquecer. ─ Aquele lugar é muito bem vigiado, tomem cuidado quando forem lá.

Eu e Janet entramos uma vez, seria fácil entrar de novo. Chegamos tão perto, podíamos ter trazido-os para casa a dias, mas agora temos outra operação para enfrentar, uma operação de resgate. Se esse cara estiver sendo verdadeiro, temos uma grande chance de vencer essa guerra. Uma parte de mim já estava aliviada com essa resposta, mas sei que não é aí que Janet para.

─ Como paramos o Kick? ─ encarava o homem como se a vida dele dependesse dessa resposta. Não sei se essa era a última pergunta, mas com certeza uma bem importante.

─ Naloxona, antagonistas de opioides devem bastar. Não precisa de muito para parar o Kick, é como uma droga qualquer ─ uma parte de Janet estava aliviada agora, como se um peso enorme de suas costas estivesse sumido. Suas expressões mesmo mudaram para algo mais calmo, porém sério. Algo na cabeça dela sabia o que acontecia em seguida.

─ Obrigada ─ agradecia enquanto passa a mão metálica pelo queixo dele. Agora poderíamos criar um plano onde salvamos todos da prisão de William.

Antes que eu pudesse continuar a imaginar, Janet usou o mesmo braço para quebrar o pescoço do homem com um mesmo soco, me pegando de surpresa. Acho que ela não é a pessoa que eu imaginava que era dias atrás. Uma Janet violenta tentava me ensinar lições desnecessárias. Não sei até onde vou aguentar isso, eu apenas queria que ela voltasse a ser como antes.

I Think We're Alone Now - Temporada 2 (CONCLUÍDA)Onde histórias criam vida. Descubra agora