Emoções

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Tal como prometido Marian ligou por volta das nove e meia da manhã, apesar do seu fuso horário ser diferente. Peter já tinha informado Marian sobre a venda de garagem pelo que me espantou as perguntas todas que me fez. Ainda assim, e por incrível que parecesse, não me custou esclarecê-la mesmo quando referiu assuntos difíceis de digerir. Nada do que tivesse valor sentimental ligado à mãe necessitaria de ser vendido ainda que não fosse utilizado como peluches e livros infantis. Nada que pertencesse a Spencer e Corrine seria vendido, pois os seus donos não estariam presentes para o permitir. Nada que fosse do pai seria vendido sem a sua autorização e não seriam vendidos objetos partidos ou estragados, se não os quiséssemos iriam apenas para o lixo. Infelizmente imensos itens foram diretamente para o contentor, cortesia do assaltante que deixou a casa de pernas para o ar.

Marian estava bem disposta. Contou todas as suas experiências no set do filme enquanto eu separava as coisas que seriam para vender ou para ficar. Só ouvir a sua voz fazia-me bem, sendo impossível parar de sorrir. Tinha saudades da minha maninha mais nova que de criança já não tinha nada. Parecia uma mulher a falar. Perdida nos meus pensamentos imaginei que estivesse para chegar, o derradeiro momento que faz das meninas umas mulherzinhas. Duvidei que o pai já tivesse tido essa conversa com Marian, por isso, teria de ser eu. E quem melhor do que eu para a ajudar? Aquele não era definitivamente o momento certo para ter essa conversa. Deixei apenas um bilhete mental para não me esquecer de o fazer.

A forma como Marian falava das paisagens que tinha tido o prazer de visitar, fez-me querer viajar. Nunca tinha andado de avião, nem tão pouco saído do país. Quando a mãe ainda cá estava, as nossas férias eram sempre pela cidade ou cidades vizinhas e, se por acaso fossemos mais longe, não saíamos do nosso querido país. Não era fácil a logística com tantos filhos e o importante era o tempo em família e isso conseguíamos em qualquer lugar. Lembro-me perfeitamente das nossas viagens às montanhas, para ver a neve. A cabana de madeira, as paisagens branquinhas e os chocolates quentes com marshmellos.

Surpreendeu-me Marian não querer vender o seu cesto de guardar peluches quando sempre me disse que já não gostava dele. Não liguei, as pessoas mudam e os seus gostos também. Marian estava de facto mudada e bastante mais madura. Uma pequena dor fez-se sentir no meu peito, contraindo muito o meu coração e pulmões, sendo difícil de respirar. Inicialmente não sabia de onde vinha aquela aflição, mas depois percebi. Tudo em mim desejava que Marian não tivesse crescido fora do seu tempo biológico por causa das circunstâncias da vida, tal como tinha acontecido comigo. Queria ao máximo preservar a sua inocência e a sua pureza. Não queria que tivesse de maturar rapidamente assumindo papeis de adulta, de mãe ou de trabalhadora. Queria que aproveitasse a sua infância, que vivesse livre de preocupações e que fosse muito feliz. Não lhe desejava aquilo por que tinha passado. Quando a mãe morreu, toda a sua responsabilidade veio para mim. Peter também assumiu, mas Peter é homem e jamais seria capaz de tomar uma postura maternal. Foi um papel que adotei com todo o prazer e normalidade, porém era mais difícil do que inicialmente imaginei, o que só me fazia admirar ainda mais a heroína que tinha sido a minha mãe.

Marian foi rápida e pragmática nas suas decisões. Uma hora foi o suficiente par decidir tudo aquilo que queria manter e vender, apesar de a chamada ter durado quase duas horas e meia para podermos conversar. Depois disso Marian desligou, dizendo que estava atrasada para o almoço e a maquilhagem, pois tinha cenas para gravar a tarde toda. Questionei-me como seria capaz, mas logo percebi que uma menina com a energia dela e todo o talento que herdou da mãe, não teria dificuldades em gravar um filme internacional.

Na hora do almoço, Jack apareceu com take-away, por isso, não fomos à mansão almoçar. Em vez disso, Megan, Zoe e eu decidimos fazer um bolo para a sobremesa enquanto os rapazes viam um jogo de basebol.

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