Insónias

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Era inútil pensar que teria um dia e uma noite consecutivos sem que nada acontecesse. Aquilo que as pessoas chamam de ter um "dia normal". Se nada de avassalador acontecesse durante o período em que o sol raiava, alguma forma de insónia ou pesadelo haveria de surgir para perturbar a noite. O pior era, sobretudo, quando ambos coexistiam testando a minha resiliência. Se já era difícil controlar as minhas emoções advindas de todas as constantes mudanças e acontecimentos na minha vida, tornava-se seriamente impraticável quando nem umas horas de sono conseguia ter. As insónias manifestavam-se de uma forma muito peculiar para mim. Inicialmente sentia um cansaço extremo, retardando os movimentos e todo o meu metabolismo, mas depois era invadida por uma estranha sensação de alerta, como se não pudesse ficar mais desperta. Toda a anterior sensação de fadiga era substituída por uma melancolia enérgica, onde o corpo parece adormecido, mas a mente se recusa a fazê-lo. As normais tentativas de adormecer eram absolutamente infrutíferos tal como a minha insistência em atentá-los. Era de esperar que após tantas noites de insucesso eu fosse capaz de aprender, no entanto, todos os indícios demonstrava que era casmurra. Isso, ou que adorava bater com a cabeça na parede. Em vez de insistentemente revirar-me na cama, pensar em cenários improváveis ou contar carneirinhos, eu fosse capaz de me pôr a pé, ligar a luz e fazer algo produtivo como ler um livro ou planear o dia seguinte, talvez as noites fossem menos massacrantes. Mas não, em vez disso as noites tornam-se grandes inimigas onde nada acontece, onde reina o silêncio, a escuridão e o sofrimento da alma desperta. Não havia ninguém com quem falar, nada que me fizesse adormecer e o tempo parecia passar tão devagar.

Pelos meus cálculos seriam aproximadamente quatro da manhã, o que significaria ser muito cedo para pôr a pé e muito tarde para ir dormir. O meu metabolismo iria, seguramente, acordar-me às seis da manhã, tal como era habitual, independentemente do número de horas dormidas durante a noite. Logo, restava-me tomar uma decisão, ou esperava ou aproveitava o tempo com alguma atividade produtiva e que possivelmente fizesse voltar o sono e o cansaço que eu sabia que tinha.

Vesti um lindo robe verde-esmeralda que Megan me havia emprestado e calcei os chinelos de quarto que tinha trazido de casa. O sol ainda não mostrava sinais de querer acordar pelo que não tentei abrir as cortinas. Em vez disso, sentei-me à secretária tal como tinha feito naquela noite em que planeava o casamento do pai com Jordyn, e comecei por escrevinhar algumas ideias para o planeamento final da venda de garagem. Faltavam fazer os cartazes de publicidade com cores fortes e chamativas, alguns cartazes temáticos para a divisão dos objetos ser coordenada e coerente, faltava acertar detalhes com as pessoas que iriam ajudar na venda de garagem, definir horários, registos de compras e do dinheiro feito e, ainda, organizar um conjunto de materiais que nos pudessem ser úteis como sacos plásticos, caixas de cartão e jornal para embrulhar itens frágeis. O meu cérebro parecia fatigado com este exercício mental, mas os meus olhos não mostravam intenções de fechar. Forçando-me a continuar, decidi fazer uma lista das coisas que queria fazer num futuro próximo.

· Ir com o pai a uma consulta

· Ligar a Megan para termos "a conversa"

· Ligar ao banco

· Preparar a festa de aniversário do pai

Cansada de escrever voltei a pegar no livro que estava pousado em cima da minha mesinha de cabeceira. Em pequena a mãe costumava ler para mim todas as noites em exceção. À medida que fui crescendo fui herdando o seu gosto pela leitura e daí em diante os livros eram os meus melhores amigos. Andava sempre com um livro atrás de mim, ainda que às vezes não pegasse nele para ler. Gostava do poder exploratório dos livros que me faziam saltar da realidade e enveredar por um mundo diferente, na pele de uma outra pessoa, sentindo e vivendo todas as suas emoções. Não gostaria que ninguém lesse o livro da minha vida, não desejava aqueles sentimentos a ninguém. No entanto achava curiosa a possibilidade de poder um dia ler tudo aquilo porque passei e que com tanto esforço tentava esquecer.

Em busca da felicidadeOnde histórias criam vida. Descubra agora