29 . DIGNIDADE ( RETA FINAL )

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— O que? — Sussurro em questionamento sem acreditar que estou ouvindo o que acho que estou.

— Cherry... — Blake se aproxima de mim e passa as mãos em torno da minha cintura.

Eu o abraço para evitar uma queda.

A minha visão está escurecida e sinto como se meus pulmões estivessem preenchidos por água sanitária ao invés de oxigênio. Tudo dentro de mim está em colapso e desespero. Acabo de perder a única parte do meu mundo que eu nunca imaginei que perderia.

É claro que eu estava ciente de que se Shane fosse sentenciado a prisão, a nossa relação de pai e filho ficaria complicada já que não teríamos mais aquela antiga liberdade.

No entanto, ao meu ponto de vista, uma cela da cadeia não iria mudar o sentimento de amor que sinto pelo meu pai.

Ele foi o único quem cuidou de mim por todos esses anos. Querendo ou não, errado ele estivesse com todo o jogo de estelionato que fez durante esses anos ou quer ele continuasse a ser apenas um corretor imobiliário pobre ou classe média, ainda assim, ele foi aquele quem não me abandonou.

Eu sequer me lembrava da minha mãe. E nunca soube ao certo o motivo da partida da minha mãe. Sempre me questionei se havia algo de errado comigo para que ele decidisse me abandonar aos quatro anos.

Eu só tinha meu pai... ele era o único quem me viu viver e crescer. Foi ele quem me criou e apoiou em todas as decisões que tomei até então. Eu o amava mais do que a minha própria vida.

Shane foi quem cuidou de mim por todo esse tempo, ele foi tanto pai quanto mãe para mim. Meu pai, queira eu goste ou não, era o meu porto seguro forte além de Charlie.

— Gatinho? Você ainda está aí? — Charlie pergunta com uma voz chorosa que parte meu coração.

Sei que ele está sofrendo tanto quanto eu já que estamos distantes e nada ele pode fazer nesse momento para amenizar minha dor.

Blake beija minha bochecha de forma vagarosa e dura. Ele tenta me fazer sentir-me bem durante a notícia que me abalou. Então é certo que ele já sabia sobre Shane.

Algumas pequenas lágrimas escorrem ainda mais do meu rosto e pingam no peito de Blake que me abraçar com mais força.

Ele se senta no chão comigo em seu colo e me põe em posição fetal dentro do casulo que seus braços formam ao meu redor.

— Por favor, fale comigo. Não me deixe ainda mais louco do que já estou meu amor. — Ele suplica ao telefone que permanece em minha mão.

Estou tão confuso e destruído que não consigo nem ao menos abrir a boca para responder meu noivo. É quase como se eu tivesse perdido totalmente os sentidos e ações do meu corpo. Como se o limbo tivesse me devorado de uma vez por todas.

A minha ficha ainda não caiu de que perdi meu pai, que ele cometeu suicídio e que me deixou sozinho para sempre a partir de agora.

Nada mais me resta. Sem dinheiro e sem família. Naomi talvez ainda não saiba da morte do irmão, ou esteja ciente e não consegue pensar em uma forma de me contar.

Sei que eu a tenho. Ela é minha tia afinal de contas.

Mas quando se tem dezoito anos e se presencia seu próprio pai ser preso diante dos seus olhos e depois recebe a notícia de que ele tirou a própria vida, é como se o mundo não fizesse mais sentido algum e não restasse outra alma viva em um universo de frio, gelo e espinhos escuros que ferem e te fazem sangrar.

Meu coração está totalmente dilacerado. Por fora, estou calado e sem expressão alguma, mas por dentro, estou aos gritos e aos prantos.

O que é que vou fazer agora? Serei forte o suficiente para retornar aos Estados Unidos depois disso? Bom, sei que preciso retornar a América agora que Shane se foi, mas como irei reagir quando pisar meus pés no gramado do cemitério em que meu pai está enterrado?

APPLE HARVESTOnde histórias criam vida. Descubra agora