Quando alguém te falar que o tempo é relativo, ainda que não saiba explicar exatamente como isso funciona, acredite nessa pessoa. Nossas maiores dores levam apenas segundos para acontecer, mas reverberam infinitamente, ou pelo menos o suficiente para se tornarem inesquecíveis. Foi assim comigo. Rodrigo migrou do status de príncipe para sapo em apenas seis minutos, um recorde mundial. Eu chequei. Meu Cara Certo tinha feito algo muito errado muito rápido.
Eram três da tarde quando li sua mensagem:
"O que você vai fazer agora à noite?"
De imediato, respondi:
"Corrigir provas de recuperação. Bagunça total, mas a maioria passa. Você?"
Ele não comentou nada sobre isso. Só perguntou se poderia passar aqui em casa e eu disse:
"Claro, mas que pergunta, a casa também é sua".
Cinco segundos depois, o pisca-alerta do meu cérebro estava ligado. Rodrigo nunca perguntava se podia vir; ele apenas vinha. Por que tanta cordialidade?
A resposta que minha mente em alerta encontrou foi: ele pode estar bravo com alguma coisa. É típico do Rodrigo. Quando está nervoso, antes de começar a gritar e esculhambar quem estiver na frente, ele fica gentil em excesso. Esse é seu próprio sistema de compensação, embora eu ache que a ordem está invertida. A maioria de nós é gentil depois de estourar, não antes. Isso me deixava admirada: mostrava que ele era único, diferente, até nisso. Rodrigo nunca foi como a maioria de nós.
Vasculhei o compartimento de motivos pelas quais eu poderia ser a causadora de seu desconforto e achei uma: exaltada com os preparativos do casamento nos últimos meses, acabei ficando um tanto... celibatária.
Era tanta afobação, tanta ânsia pela perfeição do evento, que não havia tempo para distrações. Assim, ninguém mais transava nessa casa. Bom, pelo menos eu não estava transando. Será que minha negligência sexual o afetou? Será que não percebi minha própria ausência nesse departamento? Tive certeza: era esse o motivo da conversa tão urgente. Fiquei aliviada por ter encontrado a solução para o problema antes que ele chegasse.
Era simples: eu não deixaria que ele falasse nada; quando abrisse a porta eu estaria vestindo apenas duas gotinhas de Chanel número 5. Li em uma revista que esse era o figurino preferido de Marilyn Monroe e achei que aquela seria uma boa hora para começar a seguir os padrões da moda, ainda que fossem os da moda dos anos 1950. Quando ele abriu a porta, eu estava no sofá, pelada e sorridente, ouvindo-o dizer as primeiras palavras do fim do nosso amor:
— Você pode se vestir, por favor?
Sou um poço de autocontrole, o que me leva à constante e doce ilusão de poder controlar as coisas fora de mim. A quem estou querendo enganar? Nem dentro de mim eu controlo. Tentei fazer uma piadinha, me aproximar, mas Rodrigo estava impassível. Só sobrou a alternativa de pegar um roupão, me sentar e ouvir que era muito tarde para usar a roupa nova do imperador. Dessa vez nem os inteligentes poderiam vê-la. Dessa vez eu não conseguiria controlar nada.
Nada.
Enquanto ele dizia o que dizia, me perdi na situação. Fui engolida pelo discurso do Cara Certo sem ter a menor chance de compreender a sucessão dos fatos. Não sei como começou, ou em qual parte caí em mim, mas lembro-me de algumas frases soltas fazendo meu ouvido zumbir:
não teria mais casamento
ele ficou "confuso"
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Teoria do Amor
RomanceLembra das aulas de física que te faziam pensar a razão pela qual era preciso saber o que aconteceria a um bloco de três quilos se você o empurrasse de uma altura de quinze metros a uma velocidade de seis quilômetros por hora - bem como a aplicação...