Capítulo 76

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O táxi para na porta do bar, mais ou menos às três da tarde. Pago a motorista, saio meio desengonçada com a mala e, quando abro a porta do Irlandês, o mundo para de rodar. Chris e Luca olham para mim com surpresa e, enquanto olho de volta para Lucas, já não sei mais o que dizer. Merda. Passei doze horas treinando o que dizer e, agora, isso não vai servir de nada.

Em meio ao caos dos meus pensamentos, noto em Lucas um olho roxo que não existia quando fui viajar. Não sei se era prudente perguntar o que aconteceu assim, logo de cara. Ele e Chris ainda estão emudecidos, me encarando como se vissem um fantasma.

— Oi – é tudo o que consigo dizer.

— Oi – ele responde, um pouco assustado. — Pensei que... que você só chegaria... hum... na terça.

— Pois é.

Fico parada, sem saber o que dizer. Pensa, Alice, pensa. Quero se lembrar de tudo o que conversei com as meninas, com a vidente, com as ruas de Paris, mas todas as memórias fogem indiscriminadamente. Confusa, chego a pensar se realmente fui viajar, afinal. Será que sonhei isso tudo? Estou ficando louca? É então que me lembro do que quero dizer a ele: que ele estava em seus pensamentos por um bom tempo. Que queria ter ligado para ele imediatamente quando vi Rodrigo no celular de outra pessoa. Que ele é o primeiro nome da minha lista. Que o chamaria para sair exatamente no dia em que conheci o embuste. Minha mente processa as informações em tempo recorde. Conta, digo a mim mesma, só conta. Mas por onde começar?

— Preciso falar. Com você, no caso – sussurro, desajeitada, porque as coisas ainda não estão saindo como eu gostaria.

Lucas fica confuso, tão ou até mais apreensivo que eu. É compreensível. Não fazia parte de seus planos de sábado me ver entrar em seu bar dizendo que preciso trocar uma ideia, se poderia ter ligado ou mandado mensagem. Ele parece perceber que estou nervosa e perdida. Demora a me responder.

— Claro. Agora?

— Se você puder.

Chris sente a tensão no ar e, finalmente, consegue se mover. Grita meu nome, meio desengonçada, e vem a seu alcance. Me abraça com curiosidade e apreensão. Não entendo o que está acontecendo; por que todo mundo está apreensivo aqui? Parece que estão prestes a me dar uma má notícia.

— Aqui mesmo? – Lucas pergunta. Não respondo; apenas faço que "sim" com a cabeça.

— Me dá a sua mala – Chris se precipita, pegando a bagagem enquanto Lucas sai do balcão. Ele bate na porta do escritório de Girolamo para se certificar de que está vazio e me convida a entrar, perguntando se quero beber algo.

— Limonada rosa batizada com vodca? Ou melhor, só vodca. Vodca? – sugiro, estabanada.

Ele sorri.

Para de sorrir, Lucas, penso, você não vai gostar do que tenho a dizer sobre minha volta antecipada. Não vai mesmo.

— Eu não teria pensado em nada diferente, professora. Fique à vontade – ele diz, abrindo passagem enquanto busca uma garrafa e dois copos no balcão.

— Preciso falar com você. E preciso que ouça tudo – digo diz.

— Eu também preciso falar com você.

— Então começa.

— Não, você primeiro.

Estamos nervosos, de um jeito esquisito, como se não nos conhecêssemos e estivéssemos falando com completos estranhos. Eu preciso dizer coisas e ele parece querer fugir do que ele mesmo tem a dizer. Más notícias, penso. Nossa sorte é que não temos a mania de ficar empurrando um "não, fala você" em looping infinito. Assim que o silêncio começa a se mostrar insustentável, começo a falar.

Teoria do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora