Capítulo 72

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DIA 9

Os dias nesse país foram muito malucos, todos eles, mas consigo superar o último em muitos sentidos. É o dia mais maluco de todos.

Quando avisei que ia embora, Erica não se opôs; só disse que era uma pena eu ir embora sem visitar os Jardins de Luxemburgo, mas respondo que sei que terei outra oportunidade. Ao devolver as coisas de Meghan, agradecendo pelo empréstimo de sua bota e casaco, ela me diz que nunca se esquecerá da conversa que tivemos na pista de dança, depois do desfile.

— Desculpa – eu disse –, mas não faço ideia do que eu te falei.

— Não esquenta – a australiana responde, sorrindo. — Um dia te conto. Até lá, boa sorte com o homem no mar.

Quase não me lembrava dessa "previsão" de Meghan e foi estranho vê-la frisar a única coisa que não tem nada a ver com Lucas quando Emma já deve ter contado para ela que estou voltando por ele.

Pierre deixou que Erica ficasse em meu quarto pelos últimos dias e foi muito cortês na despedida. Sentirei falta desse cara, que sequer conheço, mas que todos os dias estava no hotel com um sorriso acolhedor. Acho que é porque sou brasileira. Não acho que outras pessoas, de outras nacionalidades, coloquem tanta saudade na bagagem quando vão embora dos lugares. Somos os únicos que se livram por um fio de pagar pelo excesso de peso.

Passei o dia andando pelo aeroporto que nem uma pata choca, tentando me equilibrar em cima do Louboutin que me trouxe até aqui. Sim, finalmente estou com ele nos pés. Chega a ser irônico o fato de que é ele quem está me levando de volta para casa, como em O Mágico de Oz. Mas, ao contrário de Dorothy, que bate um pé no outro três vezes e está de volta ao Kansas, só preciso me concentrar para não cair e quebrar a perna e, se tudo der certo, em algumas horas estarei em Minas Gerais.

Confesso que cair e me quebrar seria o menor dos meus problemas. Meu estômago está quase saindo pela boca – e não é de medo de voar, mas porque, para estar nessa fila de embarque, tive que criar coragem para dar desculpas muito, muito feias. Minha mãe me ensinou que mentira tem perna curta e só espero que a minha consiga se sustentar durante as próximas horas.

Senão, estou lascada.

— Olá, eu tenho uma passagem para a próxima terça, mas preciso embarcar para o Brasil ainda hoje. É urgente.

A atendente da companhia aérea olha o monitor e diz, sem muita simpatia ou atenção, que o voo está lotado. Peço que ela olhe novamente, certa de que em dois segundos algo ali pode ter mudado de forma mágica.

O que, claro, não acontece.

— Por favor, eu te imploro, moça. É muito urgente – digo.

— Senhora, infelizmente não há nada que possa...

Em um momento de desespero e excesso de confiança em mim mesma, uso a única carta que pode me ajudar no momento.

— Meu pai morreu.

As lágrimas começam a rolar pelo meu rosto com a tristeza que essa lembrança me causa. Essa é a primeira vez que falo isso em voz alta e a realidade da dor me atinge de novo, como uma flecha, depois de todos esses anos. Desesperada, começo a repetir que ele morreu, em um acidente, e que preciso voltar para casa.

Eu sei que isso é jogar sujo, mas não me olhe com essa cara. As três coisas são verdade. A moça da companhia aérea só não precisa saber que elas ocorreram no intervalo de alguns anos.

Aliás, ela ficou bem assustada. Arregalou os olhos e começou a falar em francês no radinho enquanto eu tentava controlar o choro. Pouco tempo depois, chega uma mulher elegante que promete me ajudar a resolver o problema, perguntando se eu preciso ser medicada para me acalmar. Digo que não; só preciso ir embora de Paris hoje, é só isso, fico repetindo, enquanto as moças falam rapidamente em francês, uma com a outra. Me sento na esteira de um guichê fechado. Tenho só a bolsa e uma mala.

De repente, mais uma pessoa chega, com o uniforme de outra companhia aérea. Começo a tremer quando elas me pedem o passaporte e começam uma reunião inteligível na minha frente. Minutos depois, a moça elegante me diz que infelizmente não há vaga para mim no voo da companhia, mas que vão me encaixar no de outra empresa, que sai à noite. Pergunto onde pago pela diferença de taxas e ela toca minha mão e pede para que eu não me preocupe com isso; afinal, é "uma emergência".

Uma quarta pessoa chega trazendo água com açúcar e pergunta se quero descansar na sala VIP da empresa até a hora do voo. A culpa cai do teto diretamente em cima da minha cabeça, mas dizer a verdade seria pior do que tentar me explicar, então o máximo que faço é não abusar da sorte. Agradeci a oferta pela sala de descanso e disse que ficarei bem na sala de embarque comum.

Sei que era mentira: não vou ficar bem. Ficarei apreensiva, olhando por cima do ombro como uma criminosa, certa de que a qualquer momento alguém vai vir me prender pela realidade deturpada que acabo de moldar só porque quero voltar para casa antes do que minha passagem diz ser o dia correto.

Nunca tinha sido espertinha antes, dado "jeitinho" para as coisas, mas a experiência me mostra que, enquanto viver, não quero dar nenhum jeitinho de novo. É muito cansativo mentir descaradamente.

Puxa vida! O pobre coitado do Rodrigo deve estar exausto...

Teoria do AmorOnde histórias criam vida. Descubra agora